domingo, 23 de março de 2014

TRIBUNA CLASSISTA Nº14 - 2° QUINZENA DE MARÇO DE 2014


Uma publicação de simpatizantes da CRQI (Coordenação pela Refundação da IV Internacional) no Brasil


UM GOVERNO SEM BASE, UMA ESQUERDA SEM RUMO

                                                                    


Que as relações entre as classes tenham mudado no Brasil depois das grandes mobilizações de junho e julho passados, os “rolezinhos” que o digam, em que jovens da periferia das grandes cidades invadem os shoppings centers dos bairros “exclusivos” para fazer barulho com música funk a todo volume. Há não mais de um ano, semelhante manifestação daria lugar a uma violenta repressão policial, hoje transformaram-se em parte do cotidiano urbano. São, em geral, manifestações despolitizadas. Mais politizado, mas minoritário, é o movimento Não Vai Ter Copa (mundial de futebol), que convoca manifestações de ruas, muito reprimidas pela polícia. Que agora conta com um novo instrumento legal, a “lei antiterrorista”, impulsionada pelo governo do PT no parlamento, e redigida de tal modo que qualquer manifestação pública poderá ser enquadrada como ato terrorista. Está sendo comparada por juristas aos piores instrumentos repressivos da ditadura militar.
¿Que tem que ver a esquerda com tudo isto? Com a exceção parcial do PSTU, praticamente nada. Os “coletivos” que pululam no Brasil com essas iniciativas são “independentes”, com alguma ideologia anarquista (contra a participação eleitoral por princípio, por exemplo). Simultaneamente acontecem importantes greves (petroleiros e garis do Rio, rodoviários de Porto Alegre, bancários) em setores com sindicatos pelegos (CUT o Força Sindical), ou quase sem organização (garis). As oposições sindicais (em que a esquerda joga um papel real) são as responsáveis por esses movimentos, que em geral permanecem isolados do resto da classe operária e os movimentos juvenis. Para as eleições gerais de outubro, o debate eleitoral da esquerda, por isso, está se desenvolvendo de modo artificial e desconectado das grandes lutas operárias e populares. O resultado é a dispersão eleitoral da esquerda, sob o manto de um discurso “unitário”. O PSOL, uma federação “anárquica” (no pior sentido) de tendências, além de sofrer uma hemorragia militante em favor de Marina Silva (candidata do eco/evangelismo) lançou a candidatura 100% capitalista do senador Randolfe Rodrigues, uma excrescência da política oligárquica do estado do Amapá. Com isso e apesar disso, e de muito mais, o PSTU lhe lançou (continua a fazê-lo) propostas unitárias com o único objetivo de conseguir uns votinhos mais para seu próprio candidato, o dirigente da Conlutas (central sindical de esquerda) Zé Maria. O PCB, por sua vez, lançou a candidatura de aparato e para marcar presença de um professor desconhecido. E todos, claro, falam da “unidade da esquerda”. Não faltam, por outro lado, alguns “esquerdistas” (e até alguma seita inominável) que qualificam aos jovens que se manifestam contra a Copa e seus gastos faraônicos de “instrumentos da direita” (sem falar da superexploração dos operários que constroem os estádios, já com sete mortos).
O divórcio da esquerda dos movimentos de luta, o maior desde o fim da ditadura militar, remonta às “jornadas de junho”, que a esquerda, inicialmente, ignorou. Quando, tardiamente, se somou à juventude em luta, não o fez com palavras de ordens antigovernamentais, mas… em defesa de si mesma (depois de haver sido recebida com pontapés e coros de “oportunistas”). Para piorar a coisa, se é possível, o fez organizando colunas em comum com o PT (ou seja, com o governo). Uma esquerda que apostou todas suas fichas no desgaste do governo do PT, sobretudo com a crise mundial, vê agora esse desgaste consumar-se sob seus narizes, enfrentando a perspectiva imediata de seu pior isolamento político e eleitoral. Nenhuma esquerda classista existirá no Brasil sem o balanço desse fracasso político, mas por ora o único que temos é uma integração maior à política burguesa (PSOL, e os ex PSOL que estão com Marina Silva) ou uma insistência na autoconstrução e autoproclamação sectária (PSTU, para nomear ao único que possui uma relação real com a vanguarda operária). O desgaste do governo continua. As perspectivas econômicas são sombrias, como para todos os “emergentes”: o grande capital financeiro está fugindo do país, pese a que o governo satisfaz todas suas exigências (lucros recorde para o setor financeiro). A perspectiva de uma bancarrota econômica está no horizonte. Uma parte da coalizão governamental já abandonou o barco (o PSB, que se uniu aos trânsfugas comandados por Marina Silva). A novidade, agora, é que o PMDB, dono do maior bloco parlamentar (e do maior número de governadores e municípios) está ameaçando sair da base política do governo (já reduziu de 16 para 5 suas alianças com o PT nos estados). Na primeira votação parlamentar depois do ultimato peemedebista, o governo perdeu. E não é mistério que a proposta do PMDB, para manter a aliança nacional com o PT, é conquistar a parte do leão do futuro governo de Dilma Rousseff (que, por ora, encabeça as pesquisas eleitorais), ou, como disse o presidente peemedebista da Câmara (Eduardo Cunha), “sair agora (do governo) para entrar melhor depois”. Um impasse econômico e uma crise política gigantesca frente a que, por ora, a esquerda joga um papel marginal, ou até de bombeiro. É necessário um balanço sem concessões desta situação.

EM DEFESA DO DIREITO DE MANIFESTAÇÃO

No dia 22 de fevereiro, cerca de 2 mil pessoas foram às ruas em São Paulo contra a Copa do Mundo (além de 2 mil policiais). A Polícia Militar agrediu manifestantes e deteve mais de 200 pessoas simplesmente por estarem na rua. Grupos de advogados estão se articulando para evitar abusos. No dia 13 de março, segundo dia de manifestação contra a Copa em São Paulo, representantes da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, do Centro Santo Dias, do Grupo Tortura Nunca Mais e do Vicariato do Povo de Rua foram à Secretaria de Segurança Pública para pedir ao secretário Fernando Grella que não fossem feitas prisões por averiguação e que a PM não bata nos manifestantes.
Os Advogados Ativistas ingressaram com um mandado de segurança preventivo com pedido de liminar para que, entre outras demandas: a) não sejam realizadas prisões para averiguação b) todos os cinegrafistas possam acompanhar os procedimentos de revistas e detenção c) que os telefones celulares só sejam apreendidos nas delegacias de polícias para que os detidos possam avisar seus parentes, entre outros aspectos. O principal objetivo desses grupos é questionar a legitimidade e a legalidade da ação da PM na manifestação passada, repleta de abusos. Na interpretação do comando da Segurança Pública, a ação preventiva da PM se justificou com base nas “fundadas suspeitas”. Ou seja, a partir da análise do comportamento dos que protestaram em manifestações anteriores, a detenção de pessoas que não praticaram crime em flagrante seria legal e legítima. As entidades democráticas alegam que essas práticas abusivas da polícia estão cerceando o direito à manifestação. A indignação é maior porque as medidas adotadas pelas autoridades se assemelham às usadas durante a ditadura militar, quando as prisões por averiguação faziam parte do procedimento policial cotidiano.
Não é à toa que as entidades que foram conversar com o secretário fossem justamente algumas das mais atuantes durante o regime militar na defesa dos presos políticos.

MANIFESTO DOS PROFESSORES DE UNIVERSIDADES PÚBLICAS PAULISTAS

As jornadas de junho marcaram um avanço importante nas lutas democráticas no Brasil. Para as classes dominantes e os governantes de plantão um sinal de alerta acendeu. Querem retomar o controle das ruas e garantir a ordem social conservadora. A reação se prepara para os inevitáveis enfrentamentos futuros. À medida que a Copa do Mundo se aproxima, cresce a sanha repressiva dos governos estadual e federal. A intensa repressão à manifestação de 22 de fevereiro em São Paulo foi só o primeiro passo. Mais de 200 ativistas foram presos, inclusive um professor da USP, jornalistas impedidos de trabalhar e advogados retidos nas delegacias. O Senado discute agora projeto promovido pelo PMDB e pelo PT, que permitiria enquadrar os movimentos sociais e todos protestos como “terrorismo”. Daí a grotesca manobra de utilizar a morte de um jornalista no Rio de Janeiro para atacar os partidos de esquerda e os movimentos sociais. Um novo ato contra a Copa e pela melhoria do transporte público foi convocado para as 18 horas do dia 13 de março no Largo da Batata, em São Paulo. Ameaças começam novamente a circular contra os manifestantes. Defendemos o direito de manifestação e nos opomos firmemente à criminalização dos ativistas e movimentos sociais. Intelectuais democratas e socialistas, protestamos contra a repressão das manifestações e o enquadramento jurídico reacionário que procura tipificar ativistas políticos e sociais como terroristas e criminosos. Dia 13 de março estaremos do lado dos manifestantes contra o aumento das tarifas.

NOTA PÚBLICA DO BLOCO DE LUTAS (RS)

Por meio desta nota queremos explicitar à população porto-alegrense que o Bloco de Lutas vem lutando pela ampliação de direitos sociais que beneficiam a classe trabalhadora e os oprimidos. Há anos existem mobilizações em Porto Alegre pela redução da tarifa de ônibus e pelo debate por outro modelo de transporte que seja realmente público. Em 2013 realizamos diversas mobilizações de rua, panfletagens e ocupamos a Câmara de Vereadores. Nesta ocasião, elaboramos dois Projetos de Lei propondo o Passe Livre municipal (para estudantes, desempregados, indígenas e quilombolas) e pelo modelo de transporte 100% Público. Pela força das ruas e da organização popular conseguimos a redução da tarifa, pela primeira vez na história de Porto Alegre. Também destacamos a importante aliança que pudemos estabelecer com a categoria dos Rodoviários, que durante este ano de 2014 protagonizou uma importante greve, organizada desde a base fazendo oposição à direção pelega do sindicato. Pela pressão das ruas e por ordem do Tribunal de Contas do Estado (TCE) o Governo Municipal foi intimado a licitar o serviço de transporte publico na cidade de Porto Alegre, o que não acontecia a mais de 30 anos. Segundo o TCE hoje o serviço de Transporte Publico em Porto Alegre é explorado ilegalmente. O processo da Audiência Publica do dia 10 no Ginásio Tesourinha, foi uma farsa montada pelo Governo Municipal e os empresários para dar legalidade a um modelo de transporte elitista e que só beneficia os empresários do transporte. Esta Audiência de fachada convocada pela Prefeitura não contou com ampla participação popular. Participaram desta audiência cerca de 600 pessoas onde a maior parte dos presentes eram manifestantes organizados no Bloco de Lutas, a outra parte era formada por funcionários da prefeitura, cargos de confiança e pessoas ligadas à Gestão Fortunati e ao empresariado. Nós, enquanto Bloco de Lutas, éramos os representantes legítimos dos interesses da população oprimida. Explicamos e defendemos nossa postura de boicote à farsa da Audiência Pública. Sabendo que essa Audiência se tratava de uma falcatrua para iludir a população e continuar engordando os lucros dos empresários, logo a única postura política direta e honesta era não dar legitimidade ao processo. Antidemocráticos e autoritários são o Poder Municipal e os empresários, que depois de décadas explorando a população com um serviço de transporte ruim e caro, promovem um golpe contra a população ao deixar de lado a discussão de reais alternativas de mudança para o Transporte Público. A gestão municipal não tem legitimidade para falar de Transporte Público, pois sua campanha eleitoral foi financiada justamente pelos empresários do Transporte. Além disso, o diretor da EPTC, Vanderlei Capellari, deveria – segundo o Tribunal de Contas do Estado – ser punido através de multa por ingerência na função pública que exerce. Denunciamos o absurdo aparato policial montado para intimidar os manifestantes. A Guarda Municipal estava posicionada por todos os lados para garantir a realização da farsa e usou de força desmedida contra os manifestantes desarmados. Além de inúmeras bordoadas de cassetete, desta vez a Guarda utilizou a perigosa pistola de choque deixando manifestantes seriamente machucados. Somente num regime violento e autoritário se pode imaginar uma Audiência PÚBLICA sitiada por um enorme efetivo de Policiais Militares e agentes da Guarda Municipal. Neste contexto, repudiamos a cobertura tendenciosa e mentirosa da grande mídia (RBS, Zero Hora, Record), verdadeira inimiga dos interesses da população, pois é financiada diretamente pelos empresários e políticos corruptos, que apenas buscam aumentar seus lucros. Sabemos também que a população está consciente desta vinculação corrupta entre os meios de comunicação burgueses e os interesses da Máfia do Transporte e do Governo Municipal. Por isso, também queremos saudar a população que não se deixa manipular e acredita que mudanças são possíveis e necessárias. Por fim, com esta nota queremos propor uma ASSEMBLÉIA POPULAR no dia 07 de Abril no Largo Glênio Peres às 18h para que a população possa de fato discutir o Transporte Público e suas alternativas. Enquanto Fortunati e Capellari pretendem legalizar a máfia do transporte, nós queremos um debate real e propositivo que considere as demandas da população, como o Passe Livre para estudantes e desempregados financiado com impostos sobre as fortunas dos ricos. Queremos que se cumpra a função social do transporte público, possibilitando à população não somente o transporte de ida e volta do trabalho, mas que de fato garanta o direito de ir e vir, e ter acesso ao lazer, cultura, trabalho, estudo.
NÃO NOS INTIMIDAREMOS COM A REPRESSÃO!
TOTAL SOLIDARIEDADE AOS QUE LUTAM POR JUSTIÇA SOCIAL!
POR UM TRANSPORTE 100% PÚBLICO!

Porto Alegre, 12 de Março de 2014

GARIS DO RIO DE JANEIRO CONSEGUEM 37% DE REAJUSTE

Os garis da cidade do Rio de Janeiro conquistaram, no sábado 8 de março, um piso salarial de R$ 1.100, após greve de oito dias para cobrar melhorias nas condições de trabalho. A audiência no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) se arrastou durante toda a tarde de sábado e chegou ao fim com a aceitação da administração Eduardo Paes (PMDB) da última proposta feita pelos representantes da categoria. O novo piso fica abaixo dos R$ 1.200 pleiteados por um segmento da categoria, mas é R$ 225,21 maior que o previsto no acordo fechado previamente entre a prefeitura e o Sindicato de Empregados de Empresas de Asseio e Conservação e representa um reajuste de 37%. Um grupo dos profissionais não gostou da proposta obtida previamente e passou a desconhecer a mediação sindical, o que levou a administração Paes a promover críticas e a não reconhecer a manutenção da greve iniciada em meio ao carnaval. A prefeitura do Rio de Janeiro, além de criminalizar e judicializar o movimento, utilizou a polícia militar e a guarda civil para coagir os trabalhadores e fazendo escolta daqueles que se vieram forçados a trabalhar sob a ameaça de demissão. O secretário-chefe da Casa Civil, Pedro Paulo, admitiu que a greve foi um aprendizado para a prefeitura, que entendeu sobre a necessidade de negociar de maneira mais ampla com os trabalhadores. A reunião no TRT estava marcada para terça-feira, após o fracasso da véspera, mas foi antecipada devido aos problemas causados pela suspensão da coleta de lixo em várias regiões da cidade. O presidente do tribunal, Carlos Alberto Araújo Drummond, chegou a propor um intervalo de vinte dias na greve, manifestando preocupação com a previsão de chuva para os próximos dias.
A prefeitura chegou a apresentar proposta de R$ 1.050, mas os garis, que recusaram a intermediação do sindicato, decidiram fazer uma contraproposta no valor de R$ 1.100, qual acabou aceita. Além do novo piso, os trabalhadores terão R$ 20 de tíquete-refeição diariamente, R$ 4 a mais que o valor que havia sido fechado pelos representantes sindicais. O aumento acertado foi resultado da contraproposta da categoria. Um dos representantes da comissão de greve, Angelo Ricardo Freitas, disse que os garis ficaram satisfeitos. Em carta à população distribuída na quinta-feira 6, o comando de greve dos garis denunciou que “a culpa da greve é do prefeito Eduardo Paes, do presidente da COMLURB e do presidente do Sindicato que não vem representando a nossa categoria. Sofremos há muito tempo com péssimas condições de trabalho, banheiros insalubres, não temos equipamentos de segurança adequados, e baixos salários. A situação é tão absurda que no café servido pela COMLURB já encontramos baratas no pão e leite estragado. Há ainda assedio moral contra os trabalhadores. Estamos sendo coagidos a realizar um trabalho.” O documento aponta ainda que “a direção do sindicato abandonou a pauta de reivindicação da categoria quando aceitou as imposições do Prefeito Eduardo Paes sem o consentimento dos trabalhadores trazendo indignação dentro de toda a categoria aonde se iniciou o processo da greve”. Confira a Carta à População. O movimento grevista recebeu apoio de diversas categorias e também mensagens de solidariedade internacionais.

GREVE: A VITÓRIA FOI DOS GARIS!

Camila Valle (Advogada)

Na greve dos garis, de Rio, a força da base impôs a sua vitória, mas os oportunistas não param de tentar tirar proveito. Advogados que apareceram só depois do carnaval, que sequer confiavam na força da base e que tentaram entregar a greve agora tentam se passar de apoiadores do movimento. Aliás, advogados que, apegados com as formalidades do processo, continuaram afirmando a necessidade desse sindicato para fazer a negociação. Desde sábado, dia 01/03, quando o sindicato renegou a greve e veio a decisão do TRT afirmando que a greve era ilegal, conversei com os garis, na rua, dizendo a eles que os trabalhadores não precisavam nem dessa decisão do TRT nem desse sindicato ou da burocracia sindical para fazer greve. Afirmei que a força do movimento deles seria o suficiente para superar essas ameaças. A decisão judicial não enfraqueceu nem fragilizou o movimento. O movimento estava forte, coeso e unido. Uma decisão judicial não tem o poder de abalar uma força real vinda da classe trabalhadora. Aliás, os trabalhadores passaram por cima dessa decisão judicial, ao mostrar que continuariam em greve mesmo com essa declaração de ilegalidade. E a atuação do sindicato não enfraqueceu a luta. Na verdade, a luta foi fortalecida porque a base viu em si a força que tem. Percebeu que não precisava desse sindicato para lutar, mas que era necessário se organizar. Diante de um sindicato que não lhe representa, a base criou sua comissão, organizou sua pauta. Aprovou em assembleia. Fugiu das burocracias tradicionais que servem às direções pelegas. Na negociação vimos todas as tentativas de manipulação por parte da polícia, do sindicato e depois da Comlurb. A polícia impediu a realização da assembleia e “escolheu” a comissão (boa parte logo saiu da greve). Um dos membros da comissão conseguiu entrar agarrado comigo e empurrado pela categoria. Para conseguir ter um advogado na mesa, um dos garis me carregou no colo. E afirmaram que só entrariam se eu entrasse. Mas todas as manobras e o vergonhoso acordo coletivo proposto pela Comlurb e pelo sindicato foram rechaçados pela base, que permaneceu em luta. Na quarta feira seguinte, outra tentativa de manipulação, somada às ameaças de demissão. Uma negociação que não obtinha nenhuma vitória e que foi aceita por setores da comissão foi apresentada para a base. Um dos membros da comissão afirmou que a categoria não poderia fazer greve sem o sindicato. Mas isso é mentira. A base tem sim legitimidade para estar em greve. Os trabalhadores rechaçaram a negociação e mantiveram a greve. Na sexta, após um ato, houve uma reunião com o Ministério Público do Trabalho. A intervenção do Ministério Público do Trabalho e dos membros do Tribunal Regional do Trabalho foi, desde o começo, paraconvencer os trabalhadores que deveriam sair de greve. Eles não ajudaram em nada, como era de se esperar. Comprometidos com o poder, como são, usaram diferentes argumentos para convencer que a greve precisava acabar. Chegaram a ameaçar que a greve seria declarada abusiva. Continuaram com as ameaças. A Prefeitura permaneceu afirmando que não podia pagar mais. Foi a postura da comissão em retornar à base e a pressão da base que impuseram a vitória. A vitória foi da classe trabalhadora, da luta na rua, da paralisação e da ação direta. Chega de oportunismo! Que caiam os outros sindicatos pelegos!

EM ASSEMBLEIA COM 20 MIL, OPERÁRIOS DO COMPERJ MANTÊM GREVE

Os trabalhadores do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) completaram 33 dias de greve na segunda-feira 10 de março, quando a categoria realizou uma assembleia com cerca de 20 mil trabalhadores e, por unanimidade, manteve a paralisação. O sindicato (Sinticon de Itaboraí – filiado à CUT), que no início não apoiou o movimento, apresentou proposta sugerindo aos trabalhadores o fim da greve. Mas, a unidade dos operários e determinação em continuar a luta por seus direitos fez com que a categoria contrariasse a direção do Sindicato e votasse pela manutenção da paralisação.
As empresas, além de não apresentar novas propostas, mantêm os 7% de reajuste, não pagaram a Participação nos Lucros (PL) e nem o adiantamento de salário dos operários. A Petrobrás e o governo Dilma Rousseff assistem a tudo sem fazer nada; as empreiteiras conseguiram uma liminar, desde a semana passada, considerando a greve abusiva.
Os trabalhadores exigem 15% de reajuste nos salários, aumento do valor do ticket alimentação, dos atuais R$ 300 para R$ 500, o pagamento diário de duas horas in tinere (tempo gasto no trajeto casa-trabalho-casa, nos ônibus contratados pelas construtoras), a classificação dos ajudantes que exercem serviço de profissionais no canteiro há mais de seis meses (o que é desvio de função), equiparação dos salários para profissionais de mesma função (há empresas que pagam salários diferenciados), a “folga de campo” (período para visitar as famílias em outras regiões) a cada 90 dias trabalhados, bem como o pagamento pelas empreiteiras das despesas com a viagem, pagamento de adicional 150% no valor das horas extras, entre outras demandas. A postura do sindicato é escandalosa. Contrariando a disposição e garra da categoria, o sindicato mente e diz para imprensa que o reajuste que os operários pedem é de 11, 5%; também divulga que a greve só começou dia 11 de fevereiro, e ainda rebaixa para R$ 460 o pedido de aumento do vale alimentação, Na assembleia, o sindicato, juntamente com a Conticom-CUT (confederação nacional da categoria), tentou resgatar uma velha proposta do Ministério Público do Trabalho (MPT), de 9% de reajuste, e dividir os dias parados entre desconto e compensação. A proposta foi vaiada e rechaçada pela categoria.


ASSEMBLEIA DEFLAGRA GREVE POR TEMPO INDETERMINADO NA UENF

                                                         

A categoria docente exige 86,7% de reposição de perdas salariais e o pagamento de 65% para remuneração do regime de Dedicação Exclusiva. Em assembleia histórica, que contou com a presença de mais de 120 docentes, foi aprovada por unanimidade a deflagração de greve por tempo indeterminado na Universidade Estadual do Norte Fluminense, a partir da quinta-feira 13 de março. Os professores ratificaram a pauta de reivindicações de 2013, que já foi encaminhada ao governo do Rio de Janeiro, que destaca dois pontos: reposição de 86,7% das perdas salariais relativas ao período entre 1999 e 2013; e pagamento de 65% pelo regime de Dedicação Exclusiva. A decisão unânime pela deflagração da greve foi resultado de grande indignação dos docentes da Uenf em relação ao tratamento desrespeitoso do governo Sérgio Cabral em relação às demandas da categoria. Nos últimos três anos, o movimento dos professores da Uenf tentou por diversas vezes negociar com o governo estadual, sem que houvesse qualquer avanço. A assembleia decidiu ainda adotar a cor laranja para simbolizar o movimento de greve em referência à luta dos garis da Comlurb, que recentemente conquistaram uma importante vitória contra a prefeitura do Rio de Janeiro, também comandada pelo PMDB do governador Sérgio Cabral.

EM 2013, EMPRESAS BRASILEIRAS DEIXARAM DE PAGAR O EQUIVALENTE A 17 ANOS DE BOLSA FAMÍLIA

A sonegação de impostos no Brasil superou R$ 415 bilhões em 2013. O valor corresponde aproximadamente a 10% de toda a riqueza gerada no país durante o período e é maior que os orçamentos federais de 2014 para as pastas de educação, desenvolvimento social e saúde, somados. Neste ano, o total de impostos e tributos não recolhidos já se aproxima dos R$ 68 bilhões. Os dados são do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), que organiza o painel Sonegômetro. O serviço calcula, a partir de estudos daquela entidade, o total de impostos e tributos que deveriam, mas não são pagos, por obra das chamadas pessoas jurídicas, isto é, empresas em geral, de todos os ramos e tamanhos. Para comparação, o programa social do governo federal Bolsa Família tem R$ 24 bilhões ao ano para atender 14 milhões de famílias. Portanto, o que foi sonegado no ano passado equivale a 17 anos do programa. Ainda segundo o Sinprofaz, a soma dos tributos devidos pelos brasileiros, constantes na Dívida Ativa da União, ultrapassa R$ 1,3 trilhão, quase um terço do Produto Interno Bruto (PIB) de 2013 que foi de R$ 4,84 trilhões. O estudo do sindicato baseia-se em dados da Receita Federal e em outras análises específicas sobre cada tributo, o que permitiu chegar a uma média ponderada. Os tributos não pagos são relativos a impostos diretos – aqueles que não estão embutidos em produtos – como Imposto Sobre Serviços (ISS), Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), por exemplo. E escancaram a diferença com que o sistema tributário brasileiro atua sobre ricos e pobres. “Eles são sonegados pelos muitos ricos e por pessoas jurídicas (empresas, indústrias), com mecanismos sofisticados de lavagem de dinheiro e de caixa dois”, afirmou o presidente do Sinprofaz,. A sonegação gigantesca impõe a necessidade de tributar pesadamente o consumo, onde não é possível sonegar. “É injusto que todo paguem uma carga em tributos indiretos. E o povo paga muito. Mesmo que você seja isento do Imposto de Renda, vai gastar cerca de 49% do salário em tributos, mas quase tudo no supermercado, na farmácia”. Outra injustiça está na forma como incide o Imposto de Renda. Quanto mais o contribuinte tem a declarar, maiores são as possibilidades de abater valores. “Os mais ricos podem abater certos gastos no Imposto de Renda. Em saúde, por exemplo, se você tem um plano privado um pouco melhor, você pode declará-lo e vai ter um abatimento (no cálculo final do imposto). Esta é uma característica injusta do nosso sistema. Os mais pobres não conseguem ter esse favor. No entanto, quem tem salários a partir de R$ 2.400 é tributado automaticamente pelo Imposto de Renda Retido na Fonte e muitas vezes não tem como reaver parte deste valor. Os valores registrados pelo impostômetro (R$ 313 bilhões este ano) são superiores aos do sonegômetro (R$ 68 bilhões), caso contrário nem sequer haveria dinheiro para manter o funcionamento da maquina pública. Se o governo efetivasse a cobrança do valor sonegado, já seria possível desonerar a classe média e os mais pobres. Se todos pagassem o que devem, nós poderíamos corrigir a tabela do Imposto de Renda (que incide sobre os salários) e reduzir alíquotas sobre alimentos e produtos de primeira necessidade, que todo mundo usa. Detalhando-se a carga tributária brasileira pelas principais fontes, percebe-se que os tributos sobre bens e serviços, que afetam sobretudo os mais pobres, respondem por quase metade do total (49,22%). Em seguida vêm os tributos sobre a folha de salários (25,76%) e sobre a renda (19,02%). Somados, eles respondem por 94% da carga tributária total. Para o procurador, existe uma “escolha política” em não atuar na cobrança dos mais ricos e manter a situação como está. Uma demanda urgente, é uma reforma tributária, que incida sobre o capital e deixe de onerar os trabalhadores. “É preciso um avanço maior da tributação sobre a riqueza. Veja os lucros astronômicos dos bancos, por exemplo. Por que o Banco do Brasil precisa lucrar R$ 12 bilhões e não pode ser tributado sobre metade disso? Essa é uma escolha política da sociedade. Imagine bilhões de cada um dos grandes bancos, o quanto você poderia desonerar os produtos de primeira necessidade?”, questiona. A sonegação é maior por conta da precariedade estrutural em que a própria Procuradoria da Fazenda Nacional, responsável pela fiscalização sobre os tributos, se encontra. Existem 300 vagas de procurador abertas há pelo menos seis anos esperando serem preenchidas. Há menos de um servidor de apoio para cada procurador. Os juízes, por exemplo, têm de 15 a 20 servidores de apoio. (As citações entre aspas correspondem ao estudo do Sinprofaz).

BRASIL GASTOU MAIS DE R$ 1 TRI EM CINCO ANOS COM JUROS DA DÍVIDA PÚBLICA

A sangria financeira do país ficou clara a partir de dados do Banco Central divulgados recentemente. No total, o setor público brasileiro teve uma despesa de R$ 249 bilhões em 2013 com juros. É o maior valor anual desde pelo menos 2002, quando o BC iniciou o registro desses dados pela metodologia atual. Se atualizarmos pela inflação, no entanto, o maior valor da série é o de 2011 (R$ 265 bilhões). De 2009 a 2013, os gastos com juros somaram R$ 1,065 trilhão. Corrigido pela inflação, esse valor equivale hoje a R$ 1,190 trilhão. Em média, cada um dos 94 milhões de brasileiros com ocupação remunerada gastou, indiretamente, R$ 11 mil no período para pagar os credores do governo, o que dá mais de R$ 2 mil por ano por pessoa. Parte do dinheiro usado para pagar juros vem da arrecadação dos governos federal, estaduais e municipais com impostos e itens extraordinários (como receita de privatizações e concessões).
Outra parte é obtida por meio da rolagem da dívida – processo em que o governo toma dinheiro emprestado para pagar juros.
No ano passado, União, Estados e municípios destinaram R$ 91 bilhões do seu orçamento para a dívida. Esse esforço fiscal é chamado de superávit primário. Como os juros somaram R$ 249 bilhões em 2013, ficaram faltando R$ 158 bilhões para pagar os credores. Este último valor, chamado de déficit nominal, ou necessidade de financiamento nominal, corresponde ao que o governo precisou tomar emprestado para honrar seus compromissos. A maior parte dos juros tem sido paga por meio da rolagem, ou seja, por meio da criação de novas dívidas. O governo toma dinheiro emprestado de uns para pagar outros. De 2009 a 2013, os juros somaram R$ 1,1 trilhão, como foi dito, mas apenas R$ 491 bilhões foram pagos com dinheiro arrecadado com impostos e outras fontes. Os demais R$ 574 bilhões vieram de novas dívidas. R$ 491 bilhões não são uma quantia desprezível. Há quem argumente que o governo deveria usar parte desse valor para investimentos, programas sociais ou corte de impostos.
O problema é que. se o setor público aumenta a dependência de rolagem da dívida – e isso tem ocorrido nos últimos anos –, o risco de emprestar dinheiro ao governo também sobe. Consequentemente, a taxa de juros que os investidores cobram tende a aumentar também, criando um ciclo vicioso.
Dito de outra forma, a tendência é de que, quanto menos dinheiro de impostos o governo gastar hoje com dívida, mais terá que gastar no futuro. Além disso, existem as consequências de curto prazo. Se os investidores notam que o controle da dívida (e outras responsabilidades do governo) não está sendo levado a sério, eles investem menos no setor produtivo, o que contribui para frear o PIB (produto interno bruto). A dívida líquida do governo tem diminuído como proporção do PIB, o que é verdade. Mas o problema, neste momento, não é a dívida líquida, e sim a bruta. A dívida líquida se refere a tudo o que o governo está devendo menos tudo o que estão devendo ao governo. A bruta é só o que o governo deve. A dívida bruta tem aumentado porque o governo toma dinheiro emprestado, a juros de mercado, e empresta para empresas, a juros mais baixos, por meio do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Quando faz essa operação, a dívida líquida não aumenta, pois o mesmo montante que o governo toma emprestado é registrado como uma quantia que o BNDES (ou seja, o próprio governo) tem a receber.
Já a dívida bruta aumenta. A dívida que o governo contrai precisa ser paga em um prazo menor do que aquela que as empresas contraíram junto ao BNDES. Além disso, os juros que o governo paga são maiores do que os que ele recebe.

MANIFESTO CONTRA O TRABALHO “VOLUNTÁRIO” NA COPA

Ao tentar convencer a sociedade brasileira e o mundo acerca da pertinência da realização da Copa de 2014 no Brasil, o governo brasileiro, aliado à FIFA, assumiu o compromisso público, constante expressamente no art. 29 na Lei Geral da Copa, de que:
Art. 29. O poder público poderá adotar providências visando à celebração de acordos com a FIFA, com vistas à: I - divulgação, nos Eventos: (....) b) de campanha pelo trabalho decente. Ocorre que, em concreto, resolveram fazer letra morta do compromisso e das normas constitucionais inseridas na órbita dos direitos fundamentais de proteção ao trabalhador ao vislumbrarem a utilização da lei do trabalho voluntário para a execução de serviços durante a Copa às entidades ligadas à FIFA e mesmo aos governos federal e locais, institucionalizando, assim, a figura execrável da precarização do trabalho, que se aproveita da necessidade do trabalhador em benefício desmedido do poder econômico, reproduzindo e alimentando, por torpes razões, a lógica do trabalho em condições análogas à de escravo. Lembre-se que o trabalho decente é um conceito difundido pela Organização Internacional do Trabalho exatamente para impedir a execução de trabalho sem as garantias trabalhistas. Verdade que a legislação nacional (Lei n. 9.608/98), de discutível constitucionalidade, permite o trabalho voluntário, sem a garantia dos direitos trabalhistas, mas esse serviço, que pode ser prestado “a entidade pública de qualquer natureza, ou a instituição privada de fins não lucrativos”, deve possuir objetivos “cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade”. Ora, a FIFA está longe de ser uma entidade sem fins lucrativos e os serviços necessários à prática do futebol durante a Copa do Mundo, evento que é, como se sabe, um dos mais lucrativos do mundo, senão o maior, tendo sido este, aliás, o fundamento utilizado pelo próprio governo para a realização da Copa no Brasil, estão, portanto, muito distantes de se inserirem em algum dos permissivos legais acima destacados, sem falar, é claro, das normas de proteção ao trabalho inseridas na ordem constitucional como preceitos fundamentais. A agressão à nação brasileira, considerada na perspectiva de um Estado de Direito, organizado sob as bases da essencial preservação da dignidade humana, é tão afrontosa que a FIFA não tem o menor pudor em expressá-la em seu “site” oficial :
12 - O que eu vou receber por trabalhar na Copa do Mundo da FIFA e nos seus eventos auxiliares?
• O trabalho voluntário é por natureza um trabalho sem remuneração. Por conta disso, não haverá pagamento de nenhum tipo de salário ou ajuda de custo para hospedagem. Porém, visando não gerar ônus, o COL e a FIFA irão fornecer os uniformes, um auxílio para o deslocamento até o local de trabalho (dentro da sede) e alimentação durante o período em que estiver atuando como voluntário. (grifou-se)
13 - Qual a duração do turno diário de trabalho voluntário?
• O turno diário de trabalho voluntário durará até 10 horas.
14 - Por quanto tempo preciso estar disponível para o evento?
• É necessário ter disponibilidade de pelo menos 20 dias corridos na época dos eventos.
15 - Existe alguma diferença entre os tipos de voluntários?
• Existem algumas funções que possuem requisitos muito específicos e, por isso, necessitam de conhecimentos e habilidades específicas. Isso leva à criação de uma organização baseada em Especialistas e Generalistas:
• Os especialistas atendem a áreas como imprensa, departamento médico, serviços de idioma, etc.;
• Os generalistas atendem a todas as outras áreas de trabalho e têm foco no atendimento ao público em geral.
16 - Eu não moro em nenhuma das sedes da Copa do Mundo da FIFA. Vou poder participar?
• A inscrição online pode ser feita de qualquer local, mas é importante que as pessoas saibam que terão de estar disponíveis para o trabalho no período determinado e na cidade na qual forem alocados/escolherem, sabendo que o COL não proverá nenhum tipo de auxílio para a hospedagem. 18 - Os voluntários poderão assistir aos jogos? Não serão disponibilizados assentos para os voluntários. Alguns poderão estar trabalhando nas arquibancadas ou em áreas com visibilidade para o campo, mas é importante lembrar que estarão trabalhando e, por isso, não deverão ter tempo para assistir aos jogos. Nos intervalos do seu horário de trabalho, no entanto, poderão ir ao Centro de Voluntários, onde poderão assistir por alguns momentos a alguma partida que esteja sendo transmitida. Ou seja, por um trabalho obrigatoriamente prestado por 10 (dez) horas diárias e em pé, já que “não serão disponibilizados assentos para os voluntários”, realizado de forma tão intensa ao ponto de não sobrar tempo para que os “voluntários” possam ver os jogos, mesmo que estejam em área com visibilidade para os jogos, desenvolvido durante “pelo menos 20 (vinte) dias corridos”, ou seja, sem qualquer interrupção, a FIFA, “para não se onerar”, oferece, em contrapartida, “uniformes, um auxílio para o deslocamento até o local de trabalho (dentro da sede) e alimentação durante o período em que estiver atuando como voluntário”, de modo a transparecer que os cidadãos brasileiros (ou estrangeiros) devem ser gratos pela esmola concedida, até porque se der, segundo a visão da FIFA, “nos intervalos do seu horário de trabalho” esses “voluntários” poderão ir ao Centro de Voluntários, “onde poderão assistir por alguns momentos a alguma partida que esteja sendo transmitida”, ou seja, com sorte, conseguirão assistir um pouco da partida pela televisão, o que todos os demais cidadãos do mundo terão acesso gratuitamente, sem sair de casa.
O pior é que o governo brasileiro se aliou a essa ofensa à ordem constitucional e vislumbra, ele próprio, conforme já declarou publicamente, utilizar o trabalho de até 18 mil “voluntários”. Assim, considerando que a previsão dos “voluntários” para a FIFA é de 15 mil, é possível vislumbrar que um dos legados certos da Copa seria o histórico de que durante a Copa ter-se-ia evidenciado um estado de exceção constitucional quanto aos direitos fundamentais trabalhistas, negando-se a condição de cidadania a pelo menos 33 mil pessoas (brasileiras ou não, cabendo não olvidar que na perspectiva dos direitos trabalhistas a Constituição não faz nenhuma diferença entre brasileiros e estrangeiros). O problema real para o governo brasileiro, para a FIFA e para os interesses econômicos em jogo é que parte da comunidade jurídica e acadêmica ligada às questões das relações de trabalho no Brasil não está disposta a aceitar que essa agressão à ordem constitucional seja consumada, ao menos não sem tensão e sem a fixação histórica dos responsáveis pela prática em questão, para um julgamento posterior. Devemos, pois, usar todos os instrumentos jurídicos e políticos que tivermos à disposição para impedir esse atentado à ordem constitucional, até porque, sem objeção, o que pode restar como legado da Copa é uma séria acomodação diante de posterior utilização e ampliação desta ou de outra fórmula jurídica de precarização do trabalho. Não pretendemos adentrar a discussão entre os que dizem “não vai ter Copa” e os que afirmam “vai ter Copa”. O que queremos deixar consignado em alto e bom tom é: Não vai ter trabalho “voluntário” na Copa!

UCRÂNIA: COMO IMPOR UMA SAÍDA CONTRARREVOLUCIONÁRIA

Depois de três meses de ocupação da praça Maidan, a principal de Kiev, os manifestantes ganharam a queda de braço com o governo de Victor Yanukovich. A queda de Yakunovich foi precedida pelo fracasso de uma tentativa de desalojar o espaço ‘manu militari’: o exército se negou a intervir e os serviços de segurança se retiraram. Enquanto se desenvolvia este quadro insurrecional, A União Européia (UE) e a Rússia realizavam um acordo sobre a formação de um governo de união nacional e o chamado a eleições para o final do ano. “É isto – havia chantageado aos manifestantes o chanceler polaco que integrava a delegação da UE – ou a lei marcial”. Não houver oportunidade. A ocupação da praça, que havia começado em novembro passado, acabou desnudando seu caráter fundamentalmente insurrecional.
Nessas circunstâncias, a oligarquia econômica que controla a Ucrânia mudou a toda velocidade de lado e colocou a nu uma divisão que havia se tornado aguda nos últimos anos. A designação do novo primeiro ministro, até as eleições que deveriam ter lugar agora, no dia 25 de maio, disputada entre um magnata do chocolate e um ex-funcionário do FMI, ligado a Julia Timoshenko, ex primeira ministra liberada depois de haver passado mais de dois anos na prisão. A importância deste cargo fugaz reside em que deverá ocupar-se do plano econômico de urgência para que a União Européia desembolse as quotas de um empréstimo internacional para deter a bancarrota da Ucrânia. A Ucrânia tem uma dívida externa que supera os 100 bilhões de dólares, quando se somam as garantias estatais e as dívidas privadas. Suas reservas internacionais são inferiores aos 20 bilhões de dólares, virtualmente comprometidos nos pagamentos que deverão ser feitos este ano. A derrubada de Yanukovich colocou na sala de espera um crédito de 15 bilhões de dólares oferecidos por Putin, ao qual foram desembolsados 10 por cento. Os funcionários da EU e do FMI dizem temer que o dinheiro que coloquem na Ucrânia vá para os bolsos dos oligarcas. Exigem, antes de abrir a carteira, que a Ucrânia elimine os subsídios de energia, que equivalem a 40 milhões de dólares, o que simplesmente converteria o que ocorre agora em uma brincadeira de crianças.
Como conclusão de conjunto, está claro que a extraordinária crise que atravessa a Ucrânia é outro episódio da restauração capitalista vinculada com a dissolução da União Soviética. O regime oligárquico restauracionista, que estabeleceu seu capital mediante o saque do velho regime burocrático, não é mais que uma fase de transição. O destino final de todo este processo é a captura do velho espaço soviético pelo capital internacional e inclusive a dissolução da Rússia.
A nova fase da crise da Ucrânia desencadeou-se quando Yanukovich descumpriu sua promessa de aderir a um tratado de livre comércio com a UE, como o fariam a Moldávia e a Geórgia nesse momento. O tratado não oferecia nenhum resgate para a bancarrota ucraniana e impunha um acordo catastrófico. A Rússia interveio então para oferecer um pacote de 15 bilhões de dólares de empréstimo e tarifas de gás subsidiadas. O oferecimento dividiu a oligarquia ucraniana, e inclusive a camarilha de Yanukovich, conhecida como “A Família”, uma parte da qual já havia aceitado em princípio uma saída da bancarrota por via de uma aliança com a UE. Ainda que o tratado com a UE foi apresentado como um
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passo para a integração da Ucrânia com a UE, a verdade é exatamente a oposta: a UE ratificou sua oposição a integrar a Ucrânia e insistiu na necessidade de que o país abrisse seu mercado às mercadorias e capitais da UE. Inclusive agora, depois da derrubada de Yanukovich, a chefa da diplomacia da UE, Catherine Ashton, ratificou que uma ajuda financeira a Ucrânia estava condicionada à execução das conhecidas ‘reformas econômicas’. Os acontecimentos brutais que atravessam a Ucrânia, novamente, são a expressão de uma implacável dinâmica da restauração capitalista, que aponta mais além da Ucrânia, para o completo domínio dos ex Estados burocráticos por parte do capital financeiro internacional.
Os manifestantes ocuparam a praça durante um inverno com temperaturas que chegavam a 40 graus abaixo de zero, sob a pressão da quebra econômica, do roubo e da arbitrariedade do aparelho estatal. Junto a isto opera a ilusão, na pequena burguesia e nos estratos superiores da classe operária, não somente da Ucrânia, de que a UE é a única saída a esse impasse mortal. Esta ilusão tem levado, no caso dos países bálticos, a pagar com taxas de desemprego de 35% o preço da integração a UE e ao euro. Na Bósnia, a ilusão tem se transformado em decepção e provocado um gigantesco levantamento popular a partir do esvaziamento das empresas que foram privatizadas pela restauração capitalista.
A queda de Yanukovich teve lugar depois de que fracassaram os acordos que tentaram orquestrar o governo e a oposição, ou seja a UE e a Rússia, com o objetivo primordial de desalojar a praça Maidan e dar vez aos acordos de bastidores. Os sucessivos compromissos naufragaram em lapso de horas. Em declarações à BBC, os manifestantes afirmaram: “nos aferramos à praça até que todas nossas demandas sejam alcançadas” Neste contexto, o chefe do Estado Maior, Vladimir Samánov, se negou a que o exército substituísse a polícia na repressão: temia provocar a desintegração das forças armadas e inclusive a do país. Samánov acaba de ser eleito ministro da Defesa. Nos últimos dias desta crise, havia-se começado a ventilar propostas para se converter a Ucrânia em uma federação, com zonas de influência para a Rússia e para a União Europeia. Inclusive no momento mais agudo da crise, quando a sobrevivência do governo pró-russo já era coisa do passado, Merkel pela Alemanha e Putin pelo governo russo, não deixaram de negociar alternativas comuns: agora Merkel pretende que Putin participe do resgate financeiro da Ucrânia com a UE. É claro que se assiste ao derrubada de um regime contrarrevolucionário por forças sociais e políticas, como o imperialismo mundial, que são os baluartes da contrarrevolução. Isto, no entanto, procede a través de uma comoção social gigantesca, que promete, talvez não novos episódios imediatos, mas sim guinadas brutais, apenas se vislumbre para as grandes massas o alcance das medidas econômicas que se preparam contra elas.
Nas negociações malogradas com o presidente deposto, o FMI exigiu um aumento de 40% do preço do gás, o congelamento de salários e a demissão de funcionários públicos. A chamada abertura comercial tem por objetivo, desse modo, aplainar o caminho para a penetração industrial e econômica do ocidente. Uma fração da oligarquia já decidiu que não tem outra alternativa do que converter-se em sócia secundaria do capital internacional. A Ucrânia necessita de uma assistência financeira, até mesmo para realizar as próximas eleições, segundo o presidente da comissão eleitoral. Assistimos a um processo que, longe de estar concluído, se transformou em um fator de agravamento da crise capitalista mundial; a União Europeia já não pode colonizar a Ucrânia incorporando-a à zona do euro, mas tratando-a como colônia na periferia. A compreensão do processo político em curso pelas massas de trabalhadores ucranianos, determinará, em médio prazo, se os protestos em Maidan poderão voltar-se contra seus manipuladores políticos.
 (De Prensa Obrera, do Partido Obrero da Argentina)