domingo, 23 de março de 2014

TRIBUNA CLASSISTA Nº14 - 2° QUINZENA DE MARÇO DE 2014


Uma publicação de simpatizantes da CRQI (Coordenação pela Refundação da IV Internacional) no Brasil


UM GOVERNO SEM BASE, UMA ESQUERDA SEM RUMO

                                                                    


Que as relações entre as classes tenham mudado no Brasil depois das grandes mobilizações de junho e julho passados, os “rolezinhos” que o digam, em que jovens da periferia das grandes cidades invadem os shoppings centers dos bairros “exclusivos” para fazer barulho com música funk a todo volume. Há não mais de um ano, semelhante manifestação daria lugar a uma violenta repressão policial, hoje transformaram-se em parte do cotidiano urbano. São, em geral, manifestações despolitizadas. Mais politizado, mas minoritário, é o movimento Não Vai Ter Copa (mundial de futebol), que convoca manifestações de ruas, muito reprimidas pela polícia. Que agora conta com um novo instrumento legal, a “lei antiterrorista”, impulsionada pelo governo do PT no parlamento, e redigida de tal modo que qualquer manifestação pública poderá ser enquadrada como ato terrorista. Está sendo comparada por juristas aos piores instrumentos repressivos da ditadura militar.
¿Que tem que ver a esquerda com tudo isto? Com a exceção parcial do PSTU, praticamente nada. Os “coletivos” que pululam no Brasil com essas iniciativas são “independentes”, com alguma ideologia anarquista (contra a participação eleitoral por princípio, por exemplo). Simultaneamente acontecem importantes greves (petroleiros e garis do Rio, rodoviários de Porto Alegre, bancários) em setores com sindicatos pelegos (CUT o Força Sindical), ou quase sem organização (garis). As oposições sindicais (em que a esquerda joga um papel real) são as responsáveis por esses movimentos, que em geral permanecem isolados do resto da classe operária e os movimentos juvenis. Para as eleições gerais de outubro, o debate eleitoral da esquerda, por isso, está se desenvolvendo de modo artificial e desconectado das grandes lutas operárias e populares. O resultado é a dispersão eleitoral da esquerda, sob o manto de um discurso “unitário”. O PSOL, uma federação “anárquica” (no pior sentido) de tendências, além de sofrer uma hemorragia militante em favor de Marina Silva (candidata do eco/evangelismo) lançou a candidatura 100% capitalista do senador Randolfe Rodrigues, uma excrescência da política oligárquica do estado do Amapá. Com isso e apesar disso, e de muito mais, o PSTU lhe lançou (continua a fazê-lo) propostas unitárias com o único objetivo de conseguir uns votinhos mais para seu próprio candidato, o dirigente da Conlutas (central sindical de esquerda) Zé Maria. O PCB, por sua vez, lançou a candidatura de aparato e para marcar presença de um professor desconhecido. E todos, claro, falam da “unidade da esquerda”. Não faltam, por outro lado, alguns “esquerdistas” (e até alguma seita inominável) que qualificam aos jovens que se manifestam contra a Copa e seus gastos faraônicos de “instrumentos da direita” (sem falar da superexploração dos operários que constroem os estádios, já com sete mortos).
O divórcio da esquerda dos movimentos de luta, o maior desde o fim da ditadura militar, remonta às “jornadas de junho”, que a esquerda, inicialmente, ignorou. Quando, tardiamente, se somou à juventude em luta, não o fez com palavras de ordens antigovernamentais, mas… em defesa de si mesma (depois de haver sido recebida com pontapés e coros de “oportunistas”). Para piorar a coisa, se é possível, o fez organizando colunas em comum com o PT (ou seja, com o governo). Uma esquerda que apostou todas suas fichas no desgaste do governo do PT, sobretudo com a crise mundial, vê agora esse desgaste consumar-se sob seus narizes, enfrentando a perspectiva imediata de seu pior isolamento político e eleitoral. Nenhuma esquerda classista existirá no Brasil sem o balanço desse fracasso político, mas por ora o único que temos é uma integração maior à política burguesa (PSOL, e os ex PSOL que estão com Marina Silva) ou uma insistência na autoconstrução e autoproclamação sectária (PSTU, para nomear ao único que possui uma relação real com a vanguarda operária). O desgaste do governo continua. As perspectivas econômicas são sombrias, como para todos os “emergentes”: o grande capital financeiro está fugindo do país, pese a que o governo satisfaz todas suas exigências (lucros recorde para o setor financeiro). A perspectiva de uma bancarrota econômica está no horizonte. Uma parte da coalizão governamental já abandonou o barco (o PSB, que se uniu aos trânsfugas comandados por Marina Silva). A novidade, agora, é que o PMDB, dono do maior bloco parlamentar (e do maior número de governadores e municípios) está ameaçando sair da base política do governo (já reduziu de 16 para 5 suas alianças com o PT nos estados). Na primeira votação parlamentar depois do ultimato peemedebista, o governo perdeu. E não é mistério que a proposta do PMDB, para manter a aliança nacional com o PT, é conquistar a parte do leão do futuro governo de Dilma Rousseff (que, por ora, encabeça as pesquisas eleitorais), ou, como disse o presidente peemedebista da Câmara (Eduardo Cunha), “sair agora (do governo) para entrar melhor depois”. Um impasse econômico e uma crise política gigantesca frente a que, por ora, a esquerda joga um papel marginal, ou até de bombeiro. É necessário um balanço sem concessões desta situação.

EM DEFESA DO DIREITO DE MANIFESTAÇÃO

No dia 22 de fevereiro, cerca de 2 mil pessoas foram às ruas em São Paulo contra a Copa do Mundo (além de 2 mil policiais). A Polícia Militar agrediu manifestantes e deteve mais de 200 pessoas simplesmente por estarem na rua. Grupos de advogados estão se articulando para evitar abusos. No dia 13 de março, segundo dia de manifestação contra a Copa em São Paulo, representantes da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, do Centro Santo Dias, do Grupo Tortura Nunca Mais e do Vicariato do Povo de Rua foram à Secretaria de Segurança Pública para pedir ao secretário Fernando Grella que não fossem feitas prisões por averiguação e que a PM não bata nos manifestantes.
Os Advogados Ativistas ingressaram com um mandado de segurança preventivo com pedido de liminar para que, entre outras demandas: a) não sejam realizadas prisões para averiguação b) todos os cinegrafistas possam acompanhar os procedimentos de revistas e detenção c) que os telefones celulares só sejam apreendidos nas delegacias de polícias para que os detidos possam avisar seus parentes, entre outros aspectos. O principal objetivo desses grupos é questionar a legitimidade e a legalidade da ação da PM na manifestação passada, repleta de abusos. Na interpretação do comando da Segurança Pública, a ação preventiva da PM se justificou com base nas “fundadas suspeitas”. Ou seja, a partir da análise do comportamento dos que protestaram em manifestações anteriores, a detenção de pessoas que não praticaram crime em flagrante seria legal e legítima. As entidades democráticas alegam que essas práticas abusivas da polícia estão cerceando o direito à manifestação. A indignação é maior porque as medidas adotadas pelas autoridades se assemelham às usadas durante a ditadura militar, quando as prisões por averiguação faziam parte do procedimento policial cotidiano.
Não é à toa que as entidades que foram conversar com o secretário fossem justamente algumas das mais atuantes durante o regime militar na defesa dos presos políticos.

MANIFESTO DOS PROFESSORES DE UNIVERSIDADES PÚBLICAS PAULISTAS

As jornadas de junho marcaram um avanço importante nas lutas democráticas no Brasil. Para as classes dominantes e os governantes de plantão um sinal de alerta acendeu. Querem retomar o controle das ruas e garantir a ordem social conservadora. A reação se prepara para os inevitáveis enfrentamentos futuros. À medida que a Copa do Mundo se aproxima, cresce a sanha repressiva dos governos estadual e federal. A intensa repressão à manifestação de 22 de fevereiro em São Paulo foi só o primeiro passo. Mais de 200 ativistas foram presos, inclusive um professor da USP, jornalistas impedidos de trabalhar e advogados retidos nas delegacias. O Senado discute agora projeto promovido pelo PMDB e pelo PT, que permitiria enquadrar os movimentos sociais e todos protestos como “terrorismo”. Daí a grotesca manobra de utilizar a morte de um jornalista no Rio de Janeiro para atacar os partidos de esquerda e os movimentos sociais. Um novo ato contra a Copa e pela melhoria do transporte público foi convocado para as 18 horas do dia 13 de março no Largo da Batata, em São Paulo. Ameaças começam novamente a circular contra os manifestantes. Defendemos o direito de manifestação e nos opomos firmemente à criminalização dos ativistas e movimentos sociais. Intelectuais democratas e socialistas, protestamos contra a repressão das manifestações e o enquadramento jurídico reacionário que procura tipificar ativistas políticos e sociais como terroristas e criminosos. Dia 13 de março estaremos do lado dos manifestantes contra o aumento das tarifas.

NOTA PÚBLICA DO BLOCO DE LUTAS (RS)

Por meio desta nota queremos explicitar à população porto-alegrense que o Bloco de Lutas vem lutando pela ampliação de direitos sociais que beneficiam a classe trabalhadora e os oprimidos. Há anos existem mobilizações em Porto Alegre pela redução da tarifa de ônibus e pelo debate por outro modelo de transporte que seja realmente público. Em 2013 realizamos diversas mobilizações de rua, panfletagens e ocupamos a Câmara de Vereadores. Nesta ocasião, elaboramos dois Projetos de Lei propondo o Passe Livre municipal (para estudantes, desempregados, indígenas e quilombolas) e pelo modelo de transporte 100% Público. Pela força das ruas e da organização popular conseguimos a redução da tarifa, pela primeira vez na história de Porto Alegre. Também destacamos a importante aliança que pudemos estabelecer com a categoria dos Rodoviários, que durante este ano de 2014 protagonizou uma importante greve, organizada desde a base fazendo oposição à direção pelega do sindicato. Pela pressão das ruas e por ordem do Tribunal de Contas do Estado (TCE) o Governo Municipal foi intimado a licitar o serviço de transporte publico na cidade de Porto Alegre, o que não acontecia a mais de 30 anos. Segundo o TCE hoje o serviço de Transporte Publico em Porto Alegre é explorado ilegalmente. O processo da Audiência Publica do dia 10 no Ginásio Tesourinha, foi uma farsa montada pelo Governo Municipal e os empresários para dar legalidade a um modelo de transporte elitista e que só beneficia os empresários do transporte. Esta Audiência de fachada convocada pela Prefeitura não contou com ampla participação popular. Participaram desta audiência cerca de 600 pessoas onde a maior parte dos presentes eram manifestantes organizados no Bloco de Lutas, a outra parte era formada por funcionários da prefeitura, cargos de confiança e pessoas ligadas à Gestão Fortunati e ao empresariado. Nós, enquanto Bloco de Lutas, éramos os representantes legítimos dos interesses da população oprimida. Explicamos e defendemos nossa postura de boicote à farsa da Audiência Pública. Sabendo que essa Audiência se tratava de uma falcatrua para iludir a população e continuar engordando os lucros dos empresários, logo a única postura política direta e honesta era não dar legitimidade ao processo. Antidemocráticos e autoritários são o Poder Municipal e os empresários, que depois de décadas explorando a população com um serviço de transporte ruim e caro, promovem um golpe contra a população ao deixar de lado a discussão de reais alternativas de mudança para o Transporte Público. A gestão municipal não tem legitimidade para falar de Transporte Público, pois sua campanha eleitoral foi financiada justamente pelos empresários do Transporte. Além disso, o diretor da EPTC, Vanderlei Capellari, deveria – segundo o Tribunal de Contas do Estado – ser punido através de multa por ingerência na função pública que exerce. Denunciamos o absurdo aparato policial montado para intimidar os manifestantes. A Guarda Municipal estava posicionada por todos os lados para garantir a realização da farsa e usou de força desmedida contra os manifestantes desarmados. Além de inúmeras bordoadas de cassetete, desta vez a Guarda utilizou a perigosa pistola de choque deixando manifestantes seriamente machucados. Somente num regime violento e autoritário se pode imaginar uma Audiência PÚBLICA sitiada por um enorme efetivo de Policiais Militares e agentes da Guarda Municipal. Neste contexto, repudiamos a cobertura tendenciosa e mentirosa da grande mídia (RBS, Zero Hora, Record), verdadeira inimiga dos interesses da população, pois é financiada diretamente pelos empresários e políticos corruptos, que apenas buscam aumentar seus lucros. Sabemos também que a população está consciente desta vinculação corrupta entre os meios de comunicação burgueses e os interesses da Máfia do Transporte e do Governo Municipal. Por isso, também queremos saudar a população que não se deixa manipular e acredita que mudanças são possíveis e necessárias. Por fim, com esta nota queremos propor uma ASSEMBLÉIA POPULAR no dia 07 de Abril no Largo Glênio Peres às 18h para que a população possa de fato discutir o Transporte Público e suas alternativas. Enquanto Fortunati e Capellari pretendem legalizar a máfia do transporte, nós queremos um debate real e propositivo que considere as demandas da população, como o Passe Livre para estudantes e desempregados financiado com impostos sobre as fortunas dos ricos. Queremos que se cumpra a função social do transporte público, possibilitando à população não somente o transporte de ida e volta do trabalho, mas que de fato garanta o direito de ir e vir, e ter acesso ao lazer, cultura, trabalho, estudo.
NÃO NOS INTIMIDAREMOS COM A REPRESSÃO!
TOTAL SOLIDARIEDADE AOS QUE LUTAM POR JUSTIÇA SOCIAL!
POR UM TRANSPORTE 100% PÚBLICO!

Porto Alegre, 12 de Março de 2014

GARIS DO RIO DE JANEIRO CONSEGUEM 37% DE REAJUSTE

Os garis da cidade do Rio de Janeiro conquistaram, no sábado 8 de março, um piso salarial de R$ 1.100, após greve de oito dias para cobrar melhorias nas condições de trabalho. A audiência no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) se arrastou durante toda a tarde de sábado e chegou ao fim com a aceitação da administração Eduardo Paes (PMDB) da última proposta feita pelos representantes da categoria. O novo piso fica abaixo dos R$ 1.200 pleiteados por um segmento da categoria, mas é R$ 225,21 maior que o previsto no acordo fechado previamente entre a prefeitura e o Sindicato de Empregados de Empresas de Asseio e Conservação e representa um reajuste de 37%. Um grupo dos profissionais não gostou da proposta obtida previamente e passou a desconhecer a mediação sindical, o que levou a administração Paes a promover críticas e a não reconhecer a manutenção da greve iniciada em meio ao carnaval. A prefeitura do Rio de Janeiro, além de criminalizar e judicializar o movimento, utilizou a polícia militar e a guarda civil para coagir os trabalhadores e fazendo escolta daqueles que se vieram forçados a trabalhar sob a ameaça de demissão. O secretário-chefe da Casa Civil, Pedro Paulo, admitiu que a greve foi um aprendizado para a prefeitura, que entendeu sobre a necessidade de negociar de maneira mais ampla com os trabalhadores. A reunião no TRT estava marcada para terça-feira, após o fracasso da véspera, mas foi antecipada devido aos problemas causados pela suspensão da coleta de lixo em várias regiões da cidade. O presidente do tribunal, Carlos Alberto Araújo Drummond, chegou a propor um intervalo de vinte dias na greve, manifestando preocupação com a previsão de chuva para os próximos dias.
A prefeitura chegou a apresentar proposta de R$ 1.050, mas os garis, que recusaram a intermediação do sindicato, decidiram fazer uma contraproposta no valor de R$ 1.100, qual acabou aceita. Além do novo piso, os trabalhadores terão R$ 20 de tíquete-refeição diariamente, R$ 4 a mais que o valor que havia sido fechado pelos representantes sindicais. O aumento acertado foi resultado da contraproposta da categoria. Um dos representantes da comissão de greve, Angelo Ricardo Freitas, disse que os garis ficaram satisfeitos. Em carta à população distribuída na quinta-feira 6, o comando de greve dos garis denunciou que “a culpa da greve é do prefeito Eduardo Paes, do presidente da COMLURB e do presidente do Sindicato que não vem representando a nossa categoria. Sofremos há muito tempo com péssimas condições de trabalho, banheiros insalubres, não temos equipamentos de segurança adequados, e baixos salários. A situação é tão absurda que no café servido pela COMLURB já encontramos baratas no pão e leite estragado. Há ainda assedio moral contra os trabalhadores. Estamos sendo coagidos a realizar um trabalho.” O documento aponta ainda que “a direção do sindicato abandonou a pauta de reivindicação da categoria quando aceitou as imposições do Prefeito Eduardo Paes sem o consentimento dos trabalhadores trazendo indignação dentro de toda a categoria aonde se iniciou o processo da greve”. Confira a Carta à População. O movimento grevista recebeu apoio de diversas categorias e também mensagens de solidariedade internacionais.

GREVE: A VITÓRIA FOI DOS GARIS!

Camila Valle (Advogada)

Na greve dos garis, de Rio, a força da base impôs a sua vitória, mas os oportunistas não param de tentar tirar proveito. Advogados que apareceram só depois do carnaval, que sequer confiavam na força da base e que tentaram entregar a greve agora tentam se passar de apoiadores do movimento. Aliás, advogados que, apegados com as formalidades do processo, continuaram afirmando a necessidade desse sindicato para fazer a negociação. Desde sábado, dia 01/03, quando o sindicato renegou a greve e veio a decisão do TRT afirmando que a greve era ilegal, conversei com os garis, na rua, dizendo a eles que os trabalhadores não precisavam nem dessa decisão do TRT nem desse sindicato ou da burocracia sindical para fazer greve. Afirmei que a força do movimento deles seria o suficiente para superar essas ameaças. A decisão judicial não enfraqueceu nem fragilizou o movimento. O movimento estava forte, coeso e unido. Uma decisão judicial não tem o poder de abalar uma força real vinda da classe trabalhadora. Aliás, os trabalhadores passaram por cima dessa decisão judicial, ao mostrar que continuariam em greve mesmo com essa declaração de ilegalidade. E a atuação do sindicato não enfraqueceu a luta. Na verdade, a luta foi fortalecida porque a base viu em si a força que tem. Percebeu que não precisava desse sindicato para lutar, mas que era necessário se organizar. Diante de um sindicato que não lhe representa, a base criou sua comissão, organizou sua pauta. Aprovou em assembleia. Fugiu das burocracias tradicionais que servem às direções pelegas. Na negociação vimos todas as tentativas de manipulação por parte da polícia, do sindicato e depois da Comlurb. A polícia impediu a realização da assembleia e “escolheu” a comissão (boa parte logo saiu da greve). Um dos membros da comissão conseguiu entrar agarrado comigo e empurrado pela categoria. Para conseguir ter um advogado na mesa, um dos garis me carregou no colo. E afirmaram que só entrariam se eu entrasse. Mas todas as manobras e o vergonhoso acordo coletivo proposto pela Comlurb e pelo sindicato foram rechaçados pela base, que permaneceu em luta. Na quarta feira seguinte, outra tentativa de manipulação, somada às ameaças de demissão. Uma negociação que não obtinha nenhuma vitória e que foi aceita por setores da comissão foi apresentada para a base. Um dos membros da comissão afirmou que a categoria não poderia fazer greve sem o sindicato. Mas isso é mentira. A base tem sim legitimidade para estar em greve. Os trabalhadores rechaçaram a negociação e mantiveram a greve. Na sexta, após um ato, houve uma reunião com o Ministério Público do Trabalho. A intervenção do Ministério Público do Trabalho e dos membros do Tribunal Regional do Trabalho foi, desde o começo, paraconvencer os trabalhadores que deveriam sair de greve. Eles não ajudaram em nada, como era de se esperar. Comprometidos com o poder, como são, usaram diferentes argumentos para convencer que a greve precisava acabar. Chegaram a ameaçar que a greve seria declarada abusiva. Continuaram com as ameaças. A Prefeitura permaneceu afirmando que não podia pagar mais. Foi a postura da comissão em retornar à base e a pressão da base que impuseram a vitória. A vitória foi da classe trabalhadora, da luta na rua, da paralisação e da ação direta. Chega de oportunismo! Que caiam os outros sindicatos pelegos!

EM ASSEMBLEIA COM 20 MIL, OPERÁRIOS DO COMPERJ MANTÊM GREVE

Os trabalhadores do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) completaram 33 dias de greve na segunda-feira 10 de março, quando a categoria realizou uma assembleia com cerca de 20 mil trabalhadores e, por unanimidade, manteve a paralisação. O sindicato (Sinticon de Itaboraí – filiado à CUT), que no início não apoiou o movimento, apresentou proposta sugerindo aos trabalhadores o fim da greve. Mas, a unidade dos operários e determinação em continuar a luta por seus direitos fez com que a categoria contrariasse a direção do Sindicato e votasse pela manutenção da paralisação.
As empresas, além de não apresentar novas propostas, mantêm os 7% de reajuste, não pagaram a Participação nos Lucros (PL) e nem o adiantamento de salário dos operários. A Petrobrás e o governo Dilma Rousseff assistem a tudo sem fazer nada; as empreiteiras conseguiram uma liminar, desde a semana passada, considerando a greve abusiva.
Os trabalhadores exigem 15% de reajuste nos salários, aumento do valor do ticket alimentação, dos atuais R$ 300 para R$ 500, o pagamento diário de duas horas in tinere (tempo gasto no trajeto casa-trabalho-casa, nos ônibus contratados pelas construtoras), a classificação dos ajudantes que exercem serviço de profissionais no canteiro há mais de seis meses (o que é desvio de função), equiparação dos salários para profissionais de mesma função (há empresas que pagam salários diferenciados), a “folga de campo” (período para visitar as famílias em outras regiões) a cada 90 dias trabalhados, bem como o pagamento pelas empreiteiras das despesas com a viagem, pagamento de adicional 150% no valor das horas extras, entre outras demandas. A postura do sindicato é escandalosa. Contrariando a disposição e garra da categoria, o sindicato mente e diz para imprensa que o reajuste que os operários pedem é de 11, 5%; também divulga que a greve só começou dia 11 de fevereiro, e ainda rebaixa para R$ 460 o pedido de aumento do vale alimentação, Na assembleia, o sindicato, juntamente com a Conticom-CUT (confederação nacional da categoria), tentou resgatar uma velha proposta do Ministério Público do Trabalho (MPT), de 9% de reajuste, e dividir os dias parados entre desconto e compensação. A proposta foi vaiada e rechaçada pela categoria.


ASSEMBLEIA DEFLAGRA GREVE POR TEMPO INDETERMINADO NA UENF

                                                         

A categoria docente exige 86,7% de reposição de perdas salariais e o pagamento de 65% para remuneração do regime de Dedicação Exclusiva. Em assembleia histórica, que contou com a presença de mais de 120 docentes, foi aprovada por unanimidade a deflagração de greve por tempo indeterminado na Universidade Estadual do Norte Fluminense, a partir da quinta-feira 13 de março. Os professores ratificaram a pauta de reivindicações de 2013, que já foi encaminhada ao governo do Rio de Janeiro, que destaca dois pontos: reposição de 86,7% das perdas salariais relativas ao período entre 1999 e 2013; e pagamento de 65% pelo regime de Dedicação Exclusiva. A decisão unânime pela deflagração da greve foi resultado de grande indignação dos docentes da Uenf em relação ao tratamento desrespeitoso do governo Sérgio Cabral em relação às demandas da categoria. Nos últimos três anos, o movimento dos professores da Uenf tentou por diversas vezes negociar com o governo estadual, sem que houvesse qualquer avanço. A assembleia decidiu ainda adotar a cor laranja para simbolizar o movimento de greve em referência à luta dos garis da Comlurb, que recentemente conquistaram uma importante vitória contra a prefeitura do Rio de Janeiro, também comandada pelo PMDB do governador Sérgio Cabral.

EM 2013, EMPRESAS BRASILEIRAS DEIXARAM DE PAGAR O EQUIVALENTE A 17 ANOS DE BOLSA FAMÍLIA

A sonegação de impostos no Brasil superou R$ 415 bilhões em 2013. O valor corresponde aproximadamente a 10% de toda a riqueza gerada no país durante o período e é maior que os orçamentos federais de 2014 para as pastas de educação, desenvolvimento social e saúde, somados. Neste ano, o total de impostos e tributos não recolhidos já se aproxima dos R$ 68 bilhões. Os dados são do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), que organiza o painel Sonegômetro. O serviço calcula, a partir de estudos daquela entidade, o total de impostos e tributos que deveriam, mas não são pagos, por obra das chamadas pessoas jurídicas, isto é, empresas em geral, de todos os ramos e tamanhos. Para comparação, o programa social do governo federal Bolsa Família tem R$ 24 bilhões ao ano para atender 14 milhões de famílias. Portanto, o que foi sonegado no ano passado equivale a 17 anos do programa. Ainda segundo o Sinprofaz, a soma dos tributos devidos pelos brasileiros, constantes na Dívida Ativa da União, ultrapassa R$ 1,3 trilhão, quase um terço do Produto Interno Bruto (PIB) de 2013 que foi de R$ 4,84 trilhões. O estudo do sindicato baseia-se em dados da Receita Federal e em outras análises específicas sobre cada tributo, o que permitiu chegar a uma média ponderada. Os tributos não pagos são relativos a impostos diretos – aqueles que não estão embutidos em produtos – como Imposto Sobre Serviços (ISS), Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), por exemplo. E escancaram a diferença com que o sistema tributário brasileiro atua sobre ricos e pobres. “Eles são sonegados pelos muitos ricos e por pessoas jurídicas (empresas, indústrias), com mecanismos sofisticados de lavagem de dinheiro e de caixa dois”, afirmou o presidente do Sinprofaz,. A sonegação gigantesca impõe a necessidade de tributar pesadamente o consumo, onde não é possível sonegar. “É injusto que todo paguem uma carga em tributos indiretos. E o povo paga muito. Mesmo que você seja isento do Imposto de Renda, vai gastar cerca de 49% do salário em tributos, mas quase tudo no supermercado, na farmácia”. Outra injustiça está na forma como incide o Imposto de Renda. Quanto mais o contribuinte tem a declarar, maiores são as possibilidades de abater valores. “Os mais ricos podem abater certos gastos no Imposto de Renda. Em saúde, por exemplo, se você tem um plano privado um pouco melhor, você pode declará-lo e vai ter um abatimento (no cálculo final do imposto). Esta é uma característica injusta do nosso sistema. Os mais pobres não conseguem ter esse favor. No entanto, quem tem salários a partir de R$ 2.400 é tributado automaticamente pelo Imposto de Renda Retido na Fonte e muitas vezes não tem como reaver parte deste valor. Os valores registrados pelo impostômetro (R$ 313 bilhões este ano) são superiores aos do sonegômetro (R$ 68 bilhões), caso contrário nem sequer haveria dinheiro para manter o funcionamento da maquina pública. Se o governo efetivasse a cobrança do valor sonegado, já seria possível desonerar a classe média e os mais pobres. Se todos pagassem o que devem, nós poderíamos corrigir a tabela do Imposto de Renda (que incide sobre os salários) e reduzir alíquotas sobre alimentos e produtos de primeira necessidade, que todo mundo usa. Detalhando-se a carga tributária brasileira pelas principais fontes, percebe-se que os tributos sobre bens e serviços, que afetam sobretudo os mais pobres, respondem por quase metade do total (49,22%). Em seguida vêm os tributos sobre a folha de salários (25,76%) e sobre a renda (19,02%). Somados, eles respondem por 94% da carga tributária total. Para o procurador, existe uma “escolha política” em não atuar na cobrança dos mais ricos e manter a situação como está. Uma demanda urgente, é uma reforma tributária, que incida sobre o capital e deixe de onerar os trabalhadores. “É preciso um avanço maior da tributação sobre a riqueza. Veja os lucros astronômicos dos bancos, por exemplo. Por que o Banco do Brasil precisa lucrar R$ 12 bilhões e não pode ser tributado sobre metade disso? Essa é uma escolha política da sociedade. Imagine bilhões de cada um dos grandes bancos, o quanto você poderia desonerar os produtos de primeira necessidade?”, questiona. A sonegação é maior por conta da precariedade estrutural em que a própria Procuradoria da Fazenda Nacional, responsável pela fiscalização sobre os tributos, se encontra. Existem 300 vagas de procurador abertas há pelo menos seis anos esperando serem preenchidas. Há menos de um servidor de apoio para cada procurador. Os juízes, por exemplo, têm de 15 a 20 servidores de apoio. (As citações entre aspas correspondem ao estudo do Sinprofaz).

BRASIL GASTOU MAIS DE R$ 1 TRI EM CINCO ANOS COM JUROS DA DÍVIDA PÚBLICA

A sangria financeira do país ficou clara a partir de dados do Banco Central divulgados recentemente. No total, o setor público brasileiro teve uma despesa de R$ 249 bilhões em 2013 com juros. É o maior valor anual desde pelo menos 2002, quando o BC iniciou o registro desses dados pela metodologia atual. Se atualizarmos pela inflação, no entanto, o maior valor da série é o de 2011 (R$ 265 bilhões). De 2009 a 2013, os gastos com juros somaram R$ 1,065 trilhão. Corrigido pela inflação, esse valor equivale hoje a R$ 1,190 trilhão. Em média, cada um dos 94 milhões de brasileiros com ocupação remunerada gastou, indiretamente, R$ 11 mil no período para pagar os credores do governo, o que dá mais de R$ 2 mil por ano por pessoa. Parte do dinheiro usado para pagar juros vem da arrecadação dos governos federal, estaduais e municipais com impostos e itens extraordinários (como receita de privatizações e concessões).
Outra parte é obtida por meio da rolagem da dívida – processo em que o governo toma dinheiro emprestado para pagar juros.
No ano passado, União, Estados e municípios destinaram R$ 91 bilhões do seu orçamento para a dívida. Esse esforço fiscal é chamado de superávit primário. Como os juros somaram R$ 249 bilhões em 2013, ficaram faltando R$ 158 bilhões para pagar os credores. Este último valor, chamado de déficit nominal, ou necessidade de financiamento nominal, corresponde ao que o governo precisou tomar emprestado para honrar seus compromissos. A maior parte dos juros tem sido paga por meio da rolagem, ou seja, por meio da criação de novas dívidas. O governo toma dinheiro emprestado de uns para pagar outros. De 2009 a 2013, os juros somaram R$ 1,1 trilhão, como foi dito, mas apenas R$ 491 bilhões foram pagos com dinheiro arrecadado com impostos e outras fontes. Os demais R$ 574 bilhões vieram de novas dívidas. R$ 491 bilhões não são uma quantia desprezível. Há quem argumente que o governo deveria usar parte desse valor para investimentos, programas sociais ou corte de impostos.
O problema é que. se o setor público aumenta a dependência de rolagem da dívida – e isso tem ocorrido nos últimos anos –, o risco de emprestar dinheiro ao governo também sobe. Consequentemente, a taxa de juros que os investidores cobram tende a aumentar também, criando um ciclo vicioso.
Dito de outra forma, a tendência é de que, quanto menos dinheiro de impostos o governo gastar hoje com dívida, mais terá que gastar no futuro. Além disso, existem as consequências de curto prazo. Se os investidores notam que o controle da dívida (e outras responsabilidades do governo) não está sendo levado a sério, eles investem menos no setor produtivo, o que contribui para frear o PIB (produto interno bruto). A dívida líquida do governo tem diminuído como proporção do PIB, o que é verdade. Mas o problema, neste momento, não é a dívida líquida, e sim a bruta. A dívida líquida se refere a tudo o que o governo está devendo menos tudo o que estão devendo ao governo. A bruta é só o que o governo deve. A dívida bruta tem aumentado porque o governo toma dinheiro emprestado, a juros de mercado, e empresta para empresas, a juros mais baixos, por meio do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Quando faz essa operação, a dívida líquida não aumenta, pois o mesmo montante que o governo toma emprestado é registrado como uma quantia que o BNDES (ou seja, o próprio governo) tem a receber.
Já a dívida bruta aumenta. A dívida que o governo contrai precisa ser paga em um prazo menor do que aquela que as empresas contraíram junto ao BNDES. Além disso, os juros que o governo paga são maiores do que os que ele recebe.

MANIFESTO CONTRA O TRABALHO “VOLUNTÁRIO” NA COPA

Ao tentar convencer a sociedade brasileira e o mundo acerca da pertinência da realização da Copa de 2014 no Brasil, o governo brasileiro, aliado à FIFA, assumiu o compromisso público, constante expressamente no art. 29 na Lei Geral da Copa, de que:
Art. 29. O poder público poderá adotar providências visando à celebração de acordos com a FIFA, com vistas à: I - divulgação, nos Eventos: (....) b) de campanha pelo trabalho decente. Ocorre que, em concreto, resolveram fazer letra morta do compromisso e das normas constitucionais inseridas na órbita dos direitos fundamentais de proteção ao trabalhador ao vislumbrarem a utilização da lei do trabalho voluntário para a execução de serviços durante a Copa às entidades ligadas à FIFA e mesmo aos governos federal e locais, institucionalizando, assim, a figura execrável da precarização do trabalho, que se aproveita da necessidade do trabalhador em benefício desmedido do poder econômico, reproduzindo e alimentando, por torpes razões, a lógica do trabalho em condições análogas à de escravo. Lembre-se que o trabalho decente é um conceito difundido pela Organização Internacional do Trabalho exatamente para impedir a execução de trabalho sem as garantias trabalhistas. Verdade que a legislação nacional (Lei n. 9.608/98), de discutível constitucionalidade, permite o trabalho voluntário, sem a garantia dos direitos trabalhistas, mas esse serviço, que pode ser prestado “a entidade pública de qualquer natureza, ou a instituição privada de fins não lucrativos”, deve possuir objetivos “cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade”. Ora, a FIFA está longe de ser uma entidade sem fins lucrativos e os serviços necessários à prática do futebol durante a Copa do Mundo, evento que é, como se sabe, um dos mais lucrativos do mundo, senão o maior, tendo sido este, aliás, o fundamento utilizado pelo próprio governo para a realização da Copa no Brasil, estão, portanto, muito distantes de se inserirem em algum dos permissivos legais acima destacados, sem falar, é claro, das normas de proteção ao trabalho inseridas na ordem constitucional como preceitos fundamentais. A agressão à nação brasileira, considerada na perspectiva de um Estado de Direito, organizado sob as bases da essencial preservação da dignidade humana, é tão afrontosa que a FIFA não tem o menor pudor em expressá-la em seu “site” oficial :
12 - O que eu vou receber por trabalhar na Copa do Mundo da FIFA e nos seus eventos auxiliares?
• O trabalho voluntário é por natureza um trabalho sem remuneração. Por conta disso, não haverá pagamento de nenhum tipo de salário ou ajuda de custo para hospedagem. Porém, visando não gerar ônus, o COL e a FIFA irão fornecer os uniformes, um auxílio para o deslocamento até o local de trabalho (dentro da sede) e alimentação durante o período em que estiver atuando como voluntário. (grifou-se)
13 - Qual a duração do turno diário de trabalho voluntário?
• O turno diário de trabalho voluntário durará até 10 horas.
14 - Por quanto tempo preciso estar disponível para o evento?
• É necessário ter disponibilidade de pelo menos 20 dias corridos na época dos eventos.
15 - Existe alguma diferença entre os tipos de voluntários?
• Existem algumas funções que possuem requisitos muito específicos e, por isso, necessitam de conhecimentos e habilidades específicas. Isso leva à criação de uma organização baseada em Especialistas e Generalistas:
• Os especialistas atendem a áreas como imprensa, departamento médico, serviços de idioma, etc.;
• Os generalistas atendem a todas as outras áreas de trabalho e têm foco no atendimento ao público em geral.
16 - Eu não moro em nenhuma das sedes da Copa do Mundo da FIFA. Vou poder participar?
• A inscrição online pode ser feita de qualquer local, mas é importante que as pessoas saibam que terão de estar disponíveis para o trabalho no período determinado e na cidade na qual forem alocados/escolherem, sabendo que o COL não proverá nenhum tipo de auxílio para a hospedagem. 18 - Os voluntários poderão assistir aos jogos? Não serão disponibilizados assentos para os voluntários. Alguns poderão estar trabalhando nas arquibancadas ou em áreas com visibilidade para o campo, mas é importante lembrar que estarão trabalhando e, por isso, não deverão ter tempo para assistir aos jogos. Nos intervalos do seu horário de trabalho, no entanto, poderão ir ao Centro de Voluntários, onde poderão assistir por alguns momentos a alguma partida que esteja sendo transmitida. Ou seja, por um trabalho obrigatoriamente prestado por 10 (dez) horas diárias e em pé, já que “não serão disponibilizados assentos para os voluntários”, realizado de forma tão intensa ao ponto de não sobrar tempo para que os “voluntários” possam ver os jogos, mesmo que estejam em área com visibilidade para os jogos, desenvolvido durante “pelo menos 20 (vinte) dias corridos”, ou seja, sem qualquer interrupção, a FIFA, “para não se onerar”, oferece, em contrapartida, “uniformes, um auxílio para o deslocamento até o local de trabalho (dentro da sede) e alimentação durante o período em que estiver atuando como voluntário”, de modo a transparecer que os cidadãos brasileiros (ou estrangeiros) devem ser gratos pela esmola concedida, até porque se der, segundo a visão da FIFA, “nos intervalos do seu horário de trabalho” esses “voluntários” poderão ir ao Centro de Voluntários, “onde poderão assistir por alguns momentos a alguma partida que esteja sendo transmitida”, ou seja, com sorte, conseguirão assistir um pouco da partida pela televisão, o que todos os demais cidadãos do mundo terão acesso gratuitamente, sem sair de casa.
O pior é que o governo brasileiro se aliou a essa ofensa à ordem constitucional e vislumbra, ele próprio, conforme já declarou publicamente, utilizar o trabalho de até 18 mil “voluntários”. Assim, considerando que a previsão dos “voluntários” para a FIFA é de 15 mil, é possível vislumbrar que um dos legados certos da Copa seria o histórico de que durante a Copa ter-se-ia evidenciado um estado de exceção constitucional quanto aos direitos fundamentais trabalhistas, negando-se a condição de cidadania a pelo menos 33 mil pessoas (brasileiras ou não, cabendo não olvidar que na perspectiva dos direitos trabalhistas a Constituição não faz nenhuma diferença entre brasileiros e estrangeiros). O problema real para o governo brasileiro, para a FIFA e para os interesses econômicos em jogo é que parte da comunidade jurídica e acadêmica ligada às questões das relações de trabalho no Brasil não está disposta a aceitar que essa agressão à ordem constitucional seja consumada, ao menos não sem tensão e sem a fixação histórica dos responsáveis pela prática em questão, para um julgamento posterior. Devemos, pois, usar todos os instrumentos jurídicos e políticos que tivermos à disposição para impedir esse atentado à ordem constitucional, até porque, sem objeção, o que pode restar como legado da Copa é uma séria acomodação diante de posterior utilização e ampliação desta ou de outra fórmula jurídica de precarização do trabalho. Não pretendemos adentrar a discussão entre os que dizem “não vai ter Copa” e os que afirmam “vai ter Copa”. O que queremos deixar consignado em alto e bom tom é: Não vai ter trabalho “voluntário” na Copa!

UCRÂNIA: COMO IMPOR UMA SAÍDA CONTRARREVOLUCIONÁRIA

Depois de três meses de ocupação da praça Maidan, a principal de Kiev, os manifestantes ganharam a queda de braço com o governo de Victor Yanukovich. A queda de Yakunovich foi precedida pelo fracasso de uma tentativa de desalojar o espaço ‘manu militari’: o exército se negou a intervir e os serviços de segurança se retiraram. Enquanto se desenvolvia este quadro insurrecional, A União Européia (UE) e a Rússia realizavam um acordo sobre a formação de um governo de união nacional e o chamado a eleições para o final do ano. “É isto – havia chantageado aos manifestantes o chanceler polaco que integrava a delegação da UE – ou a lei marcial”. Não houver oportunidade. A ocupação da praça, que havia começado em novembro passado, acabou desnudando seu caráter fundamentalmente insurrecional.
Nessas circunstâncias, a oligarquia econômica que controla a Ucrânia mudou a toda velocidade de lado e colocou a nu uma divisão que havia se tornado aguda nos últimos anos. A designação do novo primeiro ministro, até as eleições que deveriam ter lugar agora, no dia 25 de maio, disputada entre um magnata do chocolate e um ex-funcionário do FMI, ligado a Julia Timoshenko, ex primeira ministra liberada depois de haver passado mais de dois anos na prisão. A importância deste cargo fugaz reside em que deverá ocupar-se do plano econômico de urgência para que a União Européia desembolse as quotas de um empréstimo internacional para deter a bancarrota da Ucrânia. A Ucrânia tem uma dívida externa que supera os 100 bilhões de dólares, quando se somam as garantias estatais e as dívidas privadas. Suas reservas internacionais são inferiores aos 20 bilhões de dólares, virtualmente comprometidos nos pagamentos que deverão ser feitos este ano. A derrubada de Yanukovich colocou na sala de espera um crédito de 15 bilhões de dólares oferecidos por Putin, ao qual foram desembolsados 10 por cento. Os funcionários da EU e do FMI dizem temer que o dinheiro que coloquem na Ucrânia vá para os bolsos dos oligarcas. Exigem, antes de abrir a carteira, que a Ucrânia elimine os subsídios de energia, que equivalem a 40 milhões de dólares, o que simplesmente converteria o que ocorre agora em uma brincadeira de crianças.
Como conclusão de conjunto, está claro que a extraordinária crise que atravessa a Ucrânia é outro episódio da restauração capitalista vinculada com a dissolução da União Soviética. O regime oligárquico restauracionista, que estabeleceu seu capital mediante o saque do velho regime burocrático, não é mais que uma fase de transição. O destino final de todo este processo é a captura do velho espaço soviético pelo capital internacional e inclusive a dissolução da Rússia.
A nova fase da crise da Ucrânia desencadeou-se quando Yanukovich descumpriu sua promessa de aderir a um tratado de livre comércio com a UE, como o fariam a Moldávia e a Geórgia nesse momento. O tratado não oferecia nenhum resgate para a bancarrota ucraniana e impunha um acordo catastrófico. A Rússia interveio então para oferecer um pacote de 15 bilhões de dólares de empréstimo e tarifas de gás subsidiadas. O oferecimento dividiu a oligarquia ucraniana, e inclusive a camarilha de Yanukovich, conhecida como “A Família”, uma parte da qual já havia aceitado em princípio uma saída da bancarrota por via de uma aliança com a UE. Ainda que o tratado com a UE foi apresentado como um
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passo para a integração da Ucrânia com a UE, a verdade é exatamente a oposta: a UE ratificou sua oposição a integrar a Ucrânia e insistiu na necessidade de que o país abrisse seu mercado às mercadorias e capitais da UE. Inclusive agora, depois da derrubada de Yanukovich, a chefa da diplomacia da UE, Catherine Ashton, ratificou que uma ajuda financeira a Ucrânia estava condicionada à execução das conhecidas ‘reformas econômicas’. Os acontecimentos brutais que atravessam a Ucrânia, novamente, são a expressão de uma implacável dinâmica da restauração capitalista, que aponta mais além da Ucrânia, para o completo domínio dos ex Estados burocráticos por parte do capital financeiro internacional.
Os manifestantes ocuparam a praça durante um inverno com temperaturas que chegavam a 40 graus abaixo de zero, sob a pressão da quebra econômica, do roubo e da arbitrariedade do aparelho estatal. Junto a isto opera a ilusão, na pequena burguesia e nos estratos superiores da classe operária, não somente da Ucrânia, de que a UE é a única saída a esse impasse mortal. Esta ilusão tem levado, no caso dos países bálticos, a pagar com taxas de desemprego de 35% o preço da integração a UE e ao euro. Na Bósnia, a ilusão tem se transformado em decepção e provocado um gigantesco levantamento popular a partir do esvaziamento das empresas que foram privatizadas pela restauração capitalista.
A queda de Yanukovich teve lugar depois de que fracassaram os acordos que tentaram orquestrar o governo e a oposição, ou seja a UE e a Rússia, com o objetivo primordial de desalojar a praça Maidan e dar vez aos acordos de bastidores. Os sucessivos compromissos naufragaram em lapso de horas. Em declarações à BBC, os manifestantes afirmaram: “nos aferramos à praça até que todas nossas demandas sejam alcançadas” Neste contexto, o chefe do Estado Maior, Vladimir Samánov, se negou a que o exército substituísse a polícia na repressão: temia provocar a desintegração das forças armadas e inclusive a do país. Samánov acaba de ser eleito ministro da Defesa. Nos últimos dias desta crise, havia-se começado a ventilar propostas para se converter a Ucrânia em uma federação, com zonas de influência para a Rússia e para a União Europeia. Inclusive no momento mais agudo da crise, quando a sobrevivência do governo pró-russo já era coisa do passado, Merkel pela Alemanha e Putin pelo governo russo, não deixaram de negociar alternativas comuns: agora Merkel pretende que Putin participe do resgate financeiro da Ucrânia com a UE. É claro que se assiste ao derrubada de um regime contrarrevolucionário por forças sociais e políticas, como o imperialismo mundial, que são os baluartes da contrarrevolução. Isto, no entanto, procede a través de uma comoção social gigantesca, que promete, talvez não novos episódios imediatos, mas sim guinadas brutais, apenas se vislumbre para as grandes massas o alcance das medidas econômicas que se preparam contra elas.
Nas negociações malogradas com o presidente deposto, o FMI exigiu um aumento de 40% do preço do gás, o congelamento de salários e a demissão de funcionários públicos. A chamada abertura comercial tem por objetivo, desse modo, aplainar o caminho para a penetração industrial e econômica do ocidente. Uma fração da oligarquia já decidiu que não tem outra alternativa do que converter-se em sócia secundaria do capital internacional. A Ucrânia necessita de uma assistência financeira, até mesmo para realizar as próximas eleições, segundo o presidente da comissão eleitoral. Assistimos a um processo que, longe de estar concluído, se transformou em um fator de agravamento da crise capitalista mundial; a União Europeia já não pode colonizar a Ucrânia incorporando-a à zona do euro, mas tratando-a como colônia na periferia. A compreensão do processo político em curso pelas massas de trabalhadores ucranianos, determinará, em médio prazo, se os protestos em Maidan poderão voltar-se contra seus manipuladores políticos.
 (De Prensa Obrera, do Partido Obrero da Argentina)

sábado, 22 de março de 2014

BRASIL: UM GOVERNO SEM BASE, UMA ESQUERDA SEM RUMO


                                                                                                   

                                                  
Osvaldo Coggiola

Que as relações entre as classes tenham mudado no Brasil depois das grandes mobilizações de junho e julho passados, os “rolezinhos” que o digam, em que jovens da periferia das grandes cidades invadem os shoppings centers dos bairros “exclusivos” para fazer barulho com música funk a todo volume. Há não mais de um ano, semelhante manifestação daria lugar a uma violenta repressão policial, hoje transformaram-se em parte do cotidiano urbano. São, em geral, manifestações despolitizadas. Mais politizado, mas minoritário, é o movimento Não Vai Ter Copa (mundial de futebol), que convoca manifestações de ruas, muito reprimidas pela polícia. Que agora conta com um novo instrumento legal, a “lei antiterrorista”, impulsionada pelo governo do PT no parlamento, e redigida de tal modo que qualquer manifestação pública poderá ser enquadrada como ato terrorista. Está sendo comparada por juristas aos piores instrumentos repressivos da ditadura militar.
¿Que tem que ver a esquerda com tudo isto? Com a exceção parcial do PSTU, praticamente nada. Os “coletivos” que pululam no Brasil com essas iniciativas são “independentes”, com alguma ideologia anarquista (contra a participação eleitoral por princípio, por exemplo). Simultaneamente acontecem importantes greves (petroleiros e garis do Rio, rodoviários de Porto Alegre, bancários) em setores com sindicatos pelegos (CUT o Força Sindical), ou quase sem organização (garis). As oposições sindicais (em que a esquerda joga um papel real) são as responsáveis por esses movimentos, que em geral permanecem isolados do resto da classe operária e dos movimentos juvenis.
Frente às eleições gerais de outubro, o debate eleitoral da esquerda, por isso, está se desenvolvendo de modo artificial e desconectado das grandes lutas operárias e populares. O resultado é a dispersão eleitoral da esquerda, sob o manto de um discurso “unitário”. O PSOL, uma federação “anárquica” (no pior sentido) de tendências, além de sofrer uma hemorragia militante em favor de Marina Silva (ex ministra e candidata do eco/evangelismo) lançou a candidatura 100% capitalista do senador Randolfe Rodrigues, uma excrescência da política oligárquica do estado do Amapá. Com isso e apesar disso, e de muito mais, o PSTU lançou (continua a fazê-lo) propostas unitárias com o único objetivo de conseguir uns votinhos a mais para seu próprio candidato, o dirigente da Conlutas (mini central sindical de esquerda) Zé Maria. O PCB, por sua vez, lançou a candidatura de aparato e para marcar presença de um professor desconhecido. E todos, claro, falam da “unidade da esquerda”. Não faltam, por outro lado, os esquerdosos (e até alguma seita inominável) que qualificam aos jovens que se manifestam contra a Copa e seus gastos faraônicos de “instrumentos da direita” (sem falar da superexploração dos operários que constroem os estádios, já com sete mortos).
O divórcio da esquerda dos movimentos de luta, o maior desde o fim da ditadura militar, remonta às “jornadas de junho”, que a esquerda, inicialmente, desertou. Quando, tardiamente, se somou à juventude em luta, não o fez com palavras de ordens antigovernamentais, mas sim… em defesa de si mesma (depois de haver sido recebida com pontapés e coros de “oportunistas”). Para piorar a coisa, se é possível, o fez organizando colunas em comum com o PT (ou seja, com o governo).
Uma esquerda que apostou todas suas fichas no desgaste do governo do PT, sobretudo com a crise mundial, vê agora esse desgaste consumar-se sob seus narizes, enfrentando a perspectiva imediata de seu pior isolamento político e eleitoral. Nenhuma esquerda classista existirá no Brasil sem o balanço desse fracasso político, mas por ora o único que temos é uma integração maior à política burguesa (PSOL, e os ex PSOL que estão com Marina Silva) ou uma insistência na autoconstrução e autoproclamação sectária (PSTU, para nomear ao único que possui uma relação real com a vanguarda operária).

Mas, o desgaste do governo continua. As perspectivas econômicas são sombrias, como para todos os “emergentes”: o grande capital financeiro “vota com os pés” (se racha cada vez mais) pese a que o governo satisfaça todas suas exigências (lucros recorde para o setor financeiro). A perspectiva de uma bancarrota econômica está no horizonte. Uma parte da coalizão governamental já abandonou o barco (o PSB, que se uniu aos trânsfugas comandados por Marina Silva). A novidade, agora, é que o PMDB, dono do maior bloco parlamentar (e do maior número de governadores e municípios) está ameaçando sair da base política do governo (já reduziu de 16 para 5 suas alianças com o PT nos estados). E não é mistério que a proposta do PMDB, para manter a aliança nacional com o PT, é adonar-se de parte do leão do futuro governo de Dilma Roussef (que, por ora, encabeça as pesquisas eleitorais). Um impasse econômico e uma crise política gigantesca frente a que, por ora, a esquerda joga um papel marginal, ou até de bombeiro. A reconstrução de uma esquerda política classista passa por um balanço sem concessões de sua política presente.  

domingo, 9 de março de 2014

TRIBUNA CLASSISTA Nº13




Uma publicação de simpatizantes da CRQI (Coordenação pela Refundação da IV Internacional) no Brasil

Nº 13 – MARÇO DE 2014




2014 – GREVES E LUTAS DE RUA ASSOMBRAM O CONJUNTO DO REGIME POLÍTICO


A situação política e econômica do país continua dominada pela crise mundial do capitalismo, que agora golpeia fortemente os chamados “mercados emergentes”. Depois do retrocesso no quinquênio posterior a 2008, os índices de atividade econômica de 2007 estão muito longe de serem alcançados. O crescimento do PIB no Brasil, assim como nos EUA, situa-se na casa dos 2%, e na Europa, em pífios 0,8%.O saldo da balança comercial brasileira despencou quase que 90% em relação a 2012, e é o pior resultado desde 2000, ano marcado por um déficit (exportação inferior à importação) de US$ 731 milhões. O ínfimo saldo positivo atingido em 2013 de apenas US$ 2,561 bilhões é graças a uma manobra contábil chamada de “exportação ficta”, porque se deve à venda de plataformas de petróleo para a própria Petrobrás. Mesmo com o corte brutal de gastos nas áreas essenciais para a vida dos trabalhadores como na saúde e educação, o superávit primário para abater a dívida pública foi o pior dos últimos 15 anos, 1,9% do PIB, quando em 1998 teve 0,33%, às vésperas do colapso do Plano Real.
O terceiro principal destino das exportações brasileiras, a Argentina, acaba de promover uma maxi desvalorização do peso em uma política de ajuste contra os trabalhadores exigida pelo imperialismo, o FMI e o Clube de Paris, interessados com que as reservas sigam caindo para assegurar o pagamento da dívida externa usurária e parasitária. Nestes marcos, as mobilizações da juventude e dos trabalhadores contra o aumento das tarifas de transportes e contra a Copa começam gradativamente a ocupar o cenário político nacional, palco das gigantescas manifestações que ocorreram em junho/julho de 2013, que iniciaram pelos mesmos motivos. Mal iniciou o ano de 2014 e as greves de categorias como dos rodoviários e dos servidores municipais da saúde de Porto Alegre, a greve da Comperj no Rio de Janeiro, e a dos correios nacionais, ocuparam as manchetes midiáticas e obrigaram os governos a acenderem o sinal de alerta, enfrentando ameaças como a da intervenção da Força de Segurança Nacional, a substituição dos motoristas pelo aparato da Brigada Militar, imposição de multas diárias ao sindicato com a greve considerada abusiva pela justiça, etc. medidas que só não foram levadas adiante, porque o temor do governo Dilma, que monitora a greve, era de lançar um bumerangue com o mesmo efeito da repressão promovida em São Paulo pelos governos do PT e PSDB, Haddad e Alckmin, no ano passado, ou seja, de uma nova explosão das massas.
Oito mil operários no porto de Rio Grande cruzaram os braços e exigem melhores condições de trabalho, negando-se a se exporem às altas temperaturas insuportáveis dos últimos dias. Os servidores públicos federais, que promoveram as maiores greves, nos últimos 10 anos, já desencadearam a sua campanha salarial, com um indicativo de greve a partir do mês de abril apontado no calendário de lutas. A incapacidade histórica da burguesia nacional manifesta-se em dois setores estratégicos e vitais para a população que são a água e a energia elétrica, com desabastecimento e contínuos apagões que se espalham por todo o país.
A temperatura começa a subir mais depressa do que os governos e os patrões imaginavam, porque os trabalhadores e a juventude revigorados depois de um período breve de calmaria, já dão demonstrações que não estão dispostos a permitir que enquanto a farra das empreiteiras, dos banqueiros, dos latifundiários, dos monopólios privados dos transportes coletivos, dos grandes industriais intensifica-se com o dinheiro público, através principalmente do BNDES, os salários sejam aviltados pelo avanço da inflação, as demissões passem a rondar de maneira mais intensa os postos de trabalho, como no caso da GM no final do ano passado, e os serviços públicos, como na área de saúde e educação sejam completamente sucateados para beneficiar os privatizadores. A luta de classes promete ganhar novamente as ruas em 2014, nos marcos de uma bancarrota capitalista que assola tanto os mais remotos rincões como os pontos centrais do planeta.


A GREVE DOS RODOVIÁRIOS DE PORTO ALEGRE
Guilherme Giordano

Ao ser anunciada a greve da categoria rodoviária de Porto Alegre, que iniciou efetivamente no dia 28/01, a Brigada Militar e os patrões dos transportes coletivos reuniram-se com a Empresa Pública de Transporte e Circulação - EPTC dois dias antes para o enfrentamento. O Ministério Público do Trabalho determinou que 30% da frota teria que operar, o que significava que dos 1.453 ônibus, que circulam normalmente, 436 teriam que estar obrigatoriamente nas ruas, a partir do início da greve, índice considerado insuficiente pela EPTC, a qual estimulou a população com mais de 1,1 milhão de usuários a buscar os chamados transportes alternativos. O presidente do Sindicato dos Rodoviários, Júlio Pires, ligado à Força Sindical, prometeu respeitar a lei. Os trabalhadores reivindicavam reajuste salarial de 14%, aumento de R$ 4,00 no vale-refeição, manutenção do plano de saúde sem custos adicionais e fim do banco de horas.
Os patrões  responderam com uma proposta de 5,56%, com o argumento de que a tarifa teria ficado congelada em 2013, quando as manifestações de junho e julho que se estenderam por todo o país obrigaram o recuo no reajuste praticamente em todos os municípios. Em Porto Alegre, este recuo foi reforçado por um parecer do Tribunal de Contas do Estado. O prefeito do PDT, José Fortunati, e seus porta-vozes passaram a fazer uma campanha contra a greve, afirmando que se os salários estavam atrelados ao reajuste das tarifas, a greve era patronal e não de trabalhadores. A Associação dos Transportadores de Passageiros – ATP e o SEOPA propuseram no MPT a obrigatoriedade de funcionamento de 100% frota. As lotações foram autorizadas a transportarem passageiros em pé. A BM anunciou que iria colocar seu efetivo para garantir a saída dos ônibus das garagens. O presidente do Sindicato dos Rodoviários afirmava que estava chateado em prejudicar as pessoas. Cerca de 5 mil motoristas e cobradores desencadearam finalmente a greve, que no primeiro dia cumpriram os 30% estabelecidos pelo MPT. Através da imprensa pró-patronal e pró-governo, em especial, da RBS, sucursal da Rede Globo, foi semeada uma tentativa de confundir a denominada opinião pública e atacar a luta dos trabalhadores. Já no primeiro dia, espalhava-se a seguinte indagação: “foi greve ou uma cordial articulação para forçar o aumento das passagens, apoiada pelas empresas?” Estaríamos diante de uma situação em que a imprensa mais reacionária, mais patronal, a porta-voz dos grandes interesses capitalistas no sul do país, cinicamente e supostamente, da noite para o dia, teria se voltado contra o lucro empresarial. 
O prefeito Fortunati invocando seu passado de ex dirigente da CUT lançava farpas contra a greve, insinuando que estava em curso um locaute patronal para impor o reajuste tarifário. Os mesmos patrões que financiaram sua candidatura nas eleições estariam agora se voltando contra a prefeitura. Acuado, passou a temer o desencadeamento de novas manifestações massivas organizadas pelo Bloco de Lutas. O poder de arbítrio do executivo municipal dissipou-se no primeiro dia da greve. A luta dos trabalhadores paralisou politicamente o prefeito, que expunha publicamente sua total impotência e o seu temor de que as manifestações contra o reajuste tarifário ganhassem as ruas da capital. O prefeito Fortunati, do democrático PDT, enquanto afirmava que não aceitaria greve de patrões, primeiro ameaçou requisitar veículos da Região Metropolitana, e depois foi para a justiça exigir o funcionamento de 50% da frota, no horário normal, e 70% no horário de pico. A imprensa burguesa estranhava que no primeiro dia da greve não teria acontecido “confusão”, como segundo ela, deveria ser uma verdadeira greve de trabalhadores. Aos trabalhadores caberia aprender esta lição com os porta-vozes dos patrões, que pretendiam disciplinar e impor um limite à sua luta, antes mesmo da greve ter sido desencadeada. Os grandes comerciantes da capital começaram a se queixar, tanto da diminuição brusca e significativa do faturamento, como da ausência de seus funcionários ao trabalho.
Estava formado o impasse: os trabalhadores rodoviários saíram à luta em busca de melhores salários, os empresários pressionavam por aumentos das tarifas e os governos estavam acuados diante das manifestações de rua que exigiam redução do preço das passagens, passe livre e uma melhor qualidade nos serviços prestados aos usuários. O IPEA, um órgão do próprio governo, dois anos antes das manifestações de junho e julho passados, advertia que numa amostragem mais da metade das pessoas considerava os transportes coletivos ruins ou péssimos. Diante da decisão do Tribunal Regional do Trabalho – TRT de determinar que 70% da frota fosse colocada em circulação nos horários de pico e que caso houvesse descumprimento, seria imposta uma multa diária de R$ 50 mil, a categoria respondeu decidindo paralisar 100% das atividades, demonstrando que não se intimidaria. A greve começava a desmascarar o verdadeiro conluio entre a prefeitura e a ATP. O locaute arguido pelo prefeito Fortunati foi negado pelo MPT com o argumento de que era uma tentativa de frustrar as reivindicações dos trabalhadores. Por outro lado, no terceiro dia, a greve foi julgada ilegal pelo judiciário, com aumento para R$ 100 mil de multa diária, e autorização de descontos dos dias parados. A Câmara de Dirigentes Lojistas – CDL calculava as perdas no comércio de rua em 50% e em 30% nos shoppings, e divulgava que 10% dos comerciários não conseguiam chegar nos locais de trabalho. Os bancos começaram a ser atingidos pela drástica diminuição da procura nas agências.
A medida de autorizar os ônibus da Região Metropolitana a embarcar e desembarcar passageiros na capital foi suspensa pelo receio de que a greve contagiasse e passasse a ter a adesão dos rodoviários dos municípios vizinhos. Enquanto os setores de oposição, CUT PODE MAIS, MES/PSOL e PSTU/CONLUTAS, agrupados no Bloco de Lutas pelo Transporte Público e no Movimento Independente Rodoviário - MIR, sustentavam e mantinham a paralisação de 100%, tomavam o controle das garagens garantindo os piquetes, aumentando assim a sua presença e importância no Comando de Greve e na comissão de dissídio coletivo, a direção do sindicato dos rodoviários, filiada à Força Sindical, e ligado ao Solidariedade, recentemente criado, através principalmente do seu presidente, Júlio “Bala”, e do vereador Cláudio Janta, faziam campanhas nas garagens para que a categoria retomasse os 30% de circulação da frota decididos pela justiça, mas não cumpridos pela categoria. Alguns setores da oposição chegaram a propor nas assembleias como resposta a essa manobra da FS para enfraquecer a greve, que voltasse a circular 100% da frota com liberação das catracas, proposta esta que expressava uma posição vacilante e ao mesmo tempo aventureira diante da pressão do governo Fortunati, dos patrões e da imprensa burguesa.
A greve demonstrou uma poderosa retomada da luta de uma categoria operária, tendo sido a maior de todas nos últimos tempos, e colocou em xeque o próprio regime político, abrindo uma divisão no interior da burguesia e dos seus governos. Diante do apelo desesperado do democrático prefeito Fortunati em cadeia de rádio e televisão regional para que o governador Tarso intervisse na greve com a forte repressão da assassina BM, inclusive com a utilização de brigadianos para substituir os motoristas e cobradores, o que se constituiria de fato numa militarização da greve, ou que o governo federal, que monitorou a greve desde que a mesma foi decretada pelos rodoviários em assembleia, através do Ministério da Justiça intervisse com a famigerada e não menos assassina Força de Segurança Nacional, ficou exposta em primeiro lugar a força da luta dos trabalhadores, que obrigou os representantes das três instâncias executivas do Estado a se chocarem entre si, num estado de prostração, passando os mesmos a apostarem tão somente na judicialização do conflito, através do TRT.
A Força Sindical, por mais de uma vez, através dos seus dirigentes, anunciaram o fim da greve, passaram abertamente a boicotar a luta da categoria e agir como correia de transmissão dos interesses patronais, chegando ao ridículo do seu presidente, Júlio “Bala”, ter ido para a imprensa declarar que a categoria tinha que ter mais flexibilidade, expondo o enorme fosso que existe entre os interesses dos trabalhadores e essa burocracia vendida e pelega. O Judiciário também foi obrigado a agir com enorme cautela, tanto pela força da greve, como pelo temor de que as manifestações promovidas pelo Bloco de Lutas contra o aumento das tarifas ganhassem novamente as ruas e contagiassem novamente todo o país, um “fantasma” que passou a assombrar a burguesia e seus governos desde junho/julho do ano passado. Enquanto o TCE preparava um relatório denunciando que o cálculo da tarifa foi historicamente baseado no total da frota (ônibus circulantes + ônibus reservas parados nas garagens), uma majoração escancarada e extorsiva da população, o Tribunal de Justiça através de liminar determinava que a prefeitura lançasse o edital de licitação para a concessão dos serviços de transportes de passageiros na capital, em um parecer duríssimo contra a mesma e contra os patrões: “A inércia da Administração Pública Municipal somente vem em benefício das empresas, que, sem qualquer legitimidade, vêm explorando o serviço de transporte público coletivo no município de Porto Alegre. E prestam um serviço a cada dia mais deficitário.” A greve colocou em xeque todo o sistema de transporte coletivo abrindo caminho inclusive para que fosse cogitada a hipótese da entrada das vans e ônibus clandestinos na licitação prevista.
As manifestações contra o reajuste tarifário do ano passado obrigaram o TCE a instaurar uma Inspeção Especial sobre o Transporte Público sobre os critérios para o cálculo das tarifas, incluindo itens como o custo dos insumos e frota operante, despesas de pessoal e o lucro das empresas. No dia 12/02, o pleno do TCE deu seu parecer, contemporizando com a população usuária dos transportes coletivos e com a greve dos rodoviários. O relatório do TCE trouxe à tona o que já era previsto: em duas décadas, os salários dos rodoviários teve uma defasagem de quase 50% em relação ao aumento das tarifas. Em duas décadas, os rodoviários acumularam um reajuste salarial de 326,42%, um ponto acima do calculado pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor – INPC, enquanto que no mesmo período, a tarifa acumulou 656,42%, ou seja, mais do que o dobro. Enquanto os empresários anunciavam uma margem de lucro de 6,7%, o TCE apresentou em 2011, 9,74%, quase 70% a mais, desmascarando uma mentira descarada. Na segunda semana da greve, o presidente do sindicato, Júlio “Bala” já não se atrevia mais a falar nas assembleias, que passaram a ser dominadas pela oposição, a qual incluiu na pauta a questão da redução da jornada de trabalho para 6 horas semanais e o fim do banco de horas.
Enquanto isso, a saída dos de cima para fechar uma enorme crise política criada pela greve, como a tentativa do prefeito José Fortunati aprovar junto ao Ministério da Fazenda o Regime Especial de Incentivo ao Transporte Urbano de Passageiros (REITUP), projeto de lei que previa isenções fiscais a empresas dos transportes coletivos, era rechaçada. No ano passado, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre já havia votado em regime de urgência, com um acordo entre todos os partidos, inclusive o PSOL, uma isenção de R$ 11 milhões para as empresas no ISSQN – Imposto de Serviços Sobre Qualquer Natureza, uma mala de bondade, e isto no curso das manifestações. Marcado por denúncias do próprio TCE de ganhos injustificáveis dos empresários por durante pelo menos 20 anos, de cortes de salários e ameaças de demissões, o Ministério Público decidiu ajuizar o dissídio coletivo da categoria. Após 15 dias de greve, a maior dos últimos 25 anos, a categoria votou o acordo coletivo ajuizado no TRT, que previa o fim do banco de horas após a Copa do Mundo, com extinção gradual até o dia 31 de julho, reajuste salarial de 7,5%, vale-alimentação de R$ 19,00, manutenção do plano de saúde com desconto de R$ 10,00 no contracheque e alternativas ao corte dos dias parados, com compensação no próprio banco de horas ou desconto no salário (dois dias por mês). Embora as reivindicações dos trabalhadores rodoviários não tenham sido plenamente atendidas, proporcionalmente às suas necessidades vitais e à altura de todo o movimento e da repercussão nacional que teve a greve, o que marcou foi a enorme disposição de luta da categoria, que quebrou o poder de arbítrio de todas as instâncias estatais, em especial do poder executivo municipal e do poder judiciário que não foi capaz de barrar uma paralisação de 100% por mais de duas semanas. Esta experiência deve servir de exemplo e animar as demais categorias de trabalhadores, que assistiu uma categoria atropelar literalmente a própria direção mafiosa do seu sindicato. O MIR deve ser desenvolvido a partir dessas bases de luta e em primeiro lugar varrer de vez com a burocracia da Força Sindical da categoria dos rodoviários.



ATOS MARCAM LANÇAMENTO DA CAMPANHA SALARIAL 2014 DOS SPF’s NOS ESTADOS


Os servidores públicos federais de várias partes do país integraram os atos e atividades promovidos nos estados no dia 22/01, que marcaram o lançamento da Campanha Salarial 2014, a partir da realização de um Dia Nacional de Lutas. Rio de Janeiro, São Paulo, Pará, Alagoas, Maranhão, Rio Grande do Norte, Paraná e Rio Grande do Sul estão entre os estados que promoveram atividades a fim de divulgar a Campanha, realizadas também em Brasília.
Com o mote “Jogando juntos a gente conquista”, a campanha reforça a importância da unidade das entidades que integram o Fórum dos SPF. Oito eixos integram a pauta de reivindicação dos servidores públicos federais, que exigem a definição de data-base (1º de maio) e política salarial permanente com reposição inflacionária, valorização do salário base e incorporação das gratificações; cumprimento por parte do governo dos acordos e protocolos de intenções firmados; contra qualquer reforma que retire direitos dos trabalhadores; retirada de PLP’s, MP’s, decretos contrários aos interesses dos servidores públicos; paridade e integralidade entre ativos, aposentados e pensionistas; reajuste dos benefícios; e a antecipação para 2014 da pa rcela de reajuste de 2015.
Os desafios para a categoria se intensificam ainda mais com o calendário previsto para 2014, com a realização da copa do mundo – que expressa a política do governo de priorização dos megaeventos -, e das eleições. A partir de um levantamento do Portal da Transparência da Controladoria-Geral da União (CGU), é possível verificar que em nove das 12 cidades-sede da copa do mundo o financiamento federal para a construção e reforma dos estádios é maior que os repasses da União para a educação nos últimos quatro anos.  Além disso, a proposta orçamentária da União para 2014 não prevê reposições salariais pelo governo. Dados da Auditoria Cidadã da Dívida apontam que, enquanto o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2014 prevê um total de despesas de R$ 2,4 trilhões, dos quais R$ 1,002 trilhão (42%) é destinado para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública, a soma de investimentos em setores fundamentais como saúde, educação e transporte não chega a 10%. 
Em relação aos gastos com os servidores públicos, o PLOA prevê somente a segunda parcela imposta pelo governo, que sequer cobre a inflação do período. Dos eixos unificados da Campanha, o ANDES-SN destaca, a partir da última reunião do Setor das Ifes realizada em dezembro de 2013, em Brasília, a exigência de que o governo cumpra o preceito constitucional, estabelecido no artigo nº 37, que prevê a revisão geral anual dos salários, o que pressupõe data base – para 1º de maio -, a definição de uma política salarial permanente que reponha as perdas com a inflação, valorize o salário base e incorpore as gratificações. 






PRISÕES E REPRESSÃO POLICIAL NA MANIFESTAÇÃO CONTRA A COPA EM SÃO PAULO
Wesley Paulow
Em finais de janeiro, em São Paulo, ocorreu o primeiro protesto contra a Copa do Mundo, após a morte do cinegrafista Santiago Andrade, e das intensas tentativas por parte da mídia de criminalizar os movimentos sociais. O ato foi convocado para a Praça da República no final da tarde de sábado. O horário, o dia da semana e o lugar chamado não foram exatamente um estimulo a quem queria protestar. O ato foi esvaziado, não reunindo mais que 1500 pessoas, a maioria dos quais militantes de esquerda, trabalhadores e principalmente uma parcela significativa da juventude, que participaram do protesto, como o autor dessas linhas. Houve grande diferença de perspectiva entre as palavras de ordem que os manifestantes gritavam: uma parte deles gritava “não vai ter Copa”, e outros, de forma mais consciente, lançavam gritos de “Copa pra quem?”. O aparato policial era praticamente o dobro daquele de manifestantes: cerca três mil policiais ocupavam o centro de São Paulo, seguindo pela rua Augusta e a Consolação até a avenida Paulista. Além disso, estava presente para auxiliar na repressão a “Tropa do Braço”, policiais lutadores de jiu­jitsu que não fizeram nada de inovador, repetiram mais do mesmo: bater, bater e bater. De qualquer forma, não poderia ter faltado o que já é de praxe: bombas, balas de borracha e  cassetetes. Arbitrariamente, sem início de tumulto algum, a polícia foi isolando grupos no protesto, alegando que eles começariam a correr e a quebrar tudo. Foram iniciadas as prisões e as detenções, a PM alcançou seu maior número em uma única manifestação neste ano: 260 presos. Entre os que compõem a lista estão alguns repórteres e até um professor da USP. Esses números tendem a ser iguais ou maiores no futuro, caso a tentativa de criminalizar as manifestações de rua por parte do governo e do Congresso, com o Projeto de Lei Antiterrorismo for aprovado, já que o conceito de terrorismo empregado no Projeto de lei é muito amplo e daria vazão para a  detenção de qualquer pessoa que simplesmente estiver participando de um protesto, o que na prática, a partir dessa manifestação, já está ocorrendo. O próximo ato contra a Copa já está marcado para o dia 13 de março, a concentração está marcada para as 18h no Largo da Batata, em Pinheiros, zona oeste da capital. Não se pode recuar e deixar as coisas como estão, é preciso lutar para mostrar que não se pode entregar o país de bandeja para a FIFA e os interesses da burguesia nacional e estrangeira. É preciso lutar, independente do fato de se iremos ganhar, ou não, as próximas batalhas, devemos lutar, e é isso que faremos!


O “GOLPE SAÚDE” NOS CORREIOS DO BRASIL
Sergio Miguel


No dia 29 de janeiro de 2014, os trabalhadores dos correios, após assembleia em diversos locais como RS, MT, PR e ES decidiram entrar em greve por tempo indeterminado pela questão do seu plano de saúde e de mais um golpe da ECT querendo impor o Postal Saúde, um plano privado que tira direitos, precariza o atendimento aos trabalhadores e a seus dependentes, implementando cobrança de valores para ser atendido, e encarece, dando prejuízos a estes, tentando enganar dizendo que nada irá mudar na alteração proposta pelo governo. Mas a chamada “iniciativa privada” só visa o lucro, inclusive correndo o risco de “quebrar” a qualquer momento nos marcos da atual bancarrota mundial do capitalismo. Quem corre todos os riscos são apenas os trabalhadores. O já precário Correio Saúde é bem mais em conta para os trabalhadores e devemos defendê-lo com a ampliação de direitos. Ainda assim, setores da FENTECT, na qual pertence a maioria dos sindicatos, vacilam e abrem caminho para a política capituladora dos governistas que atuam na categoria. O movimento paredista começou no dia 30/01/14, os piquetes foram feitos em agências consideradas principais inicialmente, na madrugada e pela manhã deste mesmo dia. Sexta feira, dia 31/02/14, novas assembleias votaram pela continuação da greve, o crescimento da paralisação em nível nacional foi observado demonstrando a importância do apoio a esta luta pelos trabalhadores da ECT, contra a privatização da saúde nos Correios. Já no dia 01/02/14 estavam em greve: RS, Mato Grosso, Campinas, São José do Rio Preto, Piauí, Paraná, Ceará, Amazonas, Minas Gerais, Pernambuco, Roraima, Paraíba, Vale do Paraíba. Todo o apoio à luta dos trabalhadores da ECT! Por um Correio Saúde 100% sob o controle dos trabalhadores!


Lincoln Secco


No dia 10 de fevereiro ocorreu a lamentável morte do cinegrafista Santiago Ilídio Andrade atingido numa manifestação no Rio de Janeiro. Imediatamente vozes da imprensa se ergueram contra os manifestantes que agridem (sic) a polícia e agora até jornalistas! Na tribuna do senado homens “probos” como Renan Calheiros pediram a prisão de manifestantes e o impagável Jorge Vianna (PT-AC) ressuscitou o projeto de lei contra o “terrorismo”. 
Este é um momento delicado porque a Direita acredita que tem um mártir.  Não é verdade que manifestantes saem às ruas para atacar pessoas. Os ataques são sempre ao patrimônio simbólico de grandes instituições financeiras.
Simbólicos sim porque uma vidraça quebrada tem praticamente custo zero para tais empresas. Obviamente que ao serem acuados, agredidos, atropelados (como uma jovem de 18 anos em São Paulo), baleados (como outro jovem na mesma cidade), perseguidos aleatoriamente por pura vingança, os manifestantes reagem. Quebram catracas, ônibus e atiram pedras nos policiais em legítima defesa.
Quando Douglas Martins Rodrigues, 17 anos, foi morto pela PM no Jaçanã, zona norte de São Paulo, grande parte da imprensa tratou da revolta espontânea da população local como “vandalismo”. E quem se choca com milhares de mortes de pobres nas periferias todos os anos?
Nada disso justifica matar um cinegrafista. Mas esta morte também não justifica uma lei criminosa. Em junho de 1927 o Presidente Washington Luiz apoiou a chamada “lei celerada” que criminalizava protestos públicos e greves. Houve intervenções nos sindicatos e os anarquistas e comunistas foram presos. Aos “tenentes” no exílio ou na clandestinidade lhes foi negada a anistia. E assim tudo correu bem até que a chamada “Revolução de 1930” varreu aquele presidente do poder. Em São Paulo a população invadiu e depredou a chamada “Bastilha do Cambuci” onde os presos políticos eram torturados.
É evidente que depois ingressamos em nova forma de dominação.  A lei contra o terrorismo é tão estapafúrdia, causa tanto horror nos meios jurídicos progressistas que precisa buscar exemplos tão frágeis quanto o de inventar uma “organização criminosa bloco negro”. Que ela não existe a polícia já sabe, é óbvio. Qualquer um pode empregar esta tática. Mas como o Estado, a grande imprensa e alguns estudiosos do Direito Penal, a Polícia também vive do crime. 
No nosso caso, em que o próprio regime político é criminoso e a democracia é racionada, é necessário periodicamente reinventar os crimes políticos. A fachada democrática atual ainda não permite que sejam tratados enquanto tal. É que na verdade tais crimes sequer existem. Por isso, é preciso inventá-los. Afinal, como se justificariam os batalhões de choque sem os temíveis blocos negros?


PROGRAMA MÍNIMO DO II ENCONTRO DOS DE BAIXO (RS)
Nos dias 24, 25 e 26/01 ocorreu o II Encontro dos de Baixo em Porto Alegre. Publicamos a resolução aprovada como programa mínimo:


Pela necessidade que temos em nos organizar pelas pautas que atuamos e lutamos, concluímos a partir dos debates e análises feitas neste segundo encontro que precisamos deliberar um programa de trabalho e ação, buscando unificar de forma horizontal as nossas urgências.
 Lutar contra a criminalização do protesto e da pobreza (estado de exceção da copa e megaeventos)
 Pela defesa dos territórios indígenas e quilombolas, lutar contra a PEC 215/2000.
 Avançar em uma proposta de modelo de transporte público que contemple uma iniciativa de gestão dos trabalhadores,       com fiscalização e consulta da população, gratuito a toda população, assim como a expropriação das empresas.
 Lutar pelo passe livre para estudantes, desempregados, trabalhadores, indígenas e quilombolas
 Construir a partir do Encontro dos de Baixo ferramentas de trabalho de base nas comunidades com assembleias              populares.
 Organizar os setores de baixo por fora das urnas.
 Apoio à campanha 10% do PIB para a educação pública e apoio à implementação da lei do piso salarial dos                         professores.           
  Legalização do aborto, descriminalização. Por um aborto seguro e gratuito!!
  Contra o estatuto do nascituro.
  Combater a violência de gênero e o racismo.
  Combater todas as formas de segregação social e racismo
  Fortalecer um campo sindical classista desde a base dos trabalhadores, com independência de classe e governos.
  Denunciar o projeto de ordem social que destina poderes aos militares
  Fortalecer a luta indígena e quilombola pela demarcação de terra
  Lutar por uma reforma agrária popular
 Tomar parte da luta em defesa da CORSAN pública e sob o controle dos trabalhadores e da comunidade, denunciando     a articulação entre a mídia hegemônica e prefeituras


GENERAL MOTORS: CONTRA AS DEMISSÕES EM MASSA!
David Lucius


Após o governo ter realizado uma redução de impostos que beneficiou as montadoras de automóveis com quase R$ 7 bilhões em abatimentos, a GM decidiu, no final do ano passado, demitir aproximadamente mil funcionários da fábrica de São José dos Campos. As demissões foram realizadas por telegrama, uma forma baixa, vil e sorrateira (em plena época de festas de fim de ano) de demitir os trabalhadores e tentar impedir sua organização e sua luta. Segundo um dos executivos da empresa, Luis Moan, essas demissões já tinham sido acordadas entre o sindicato, a GM, e o Ministério do Trabalho. O acordo havia sido feito em janeiro do ano passado e previa a demissão dos trabalhadores da fábrica de São José. Segundo Moan: “Ao todo foram tentados quatro acordos, que não vingaram por causa do sindicato”. A colocação do executivo da GM vai no sentido de colocar os trabalhadores em choque com o sindicato em um momento em que a organização para a luta é essencial no movimento operário, não só regionalmente, mas principalmente de forma ampla e nacional, como método para se contrapor à tentativa das grandes empresas de jogar a crise capitalista nas costas dos trabalhadores. O dirigente nacional do PSTU, José Maria de Almeida, no inicio do ano passado comentava assim o acordo fechado naquele ano pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São José: “Após uma dura batalha com a empresa, conseguiu-se suspender temporariamente as demissões” e em seguida “Foi o acordo possível, nas condições de relações de forças existentes. Não é o acordo que queríamos fazer. A extensão do lay off por mais dois meses garante que não haja demissões agora, mas não impede que a montadora demita estes companheiros dentro de 60 dias” e mais adiante “Longe de ser um bom acordo, foi o possível diante dessa dura situação e não teria sido possível caso não houvesse mobilização”. As contradições firmadas nesse acordo explodiram agora, diante dos efeitos da crise no setor automobilístico nacional e da decisão do governo de voltar a elevar o IPI para todo o setor.
As tentativas da GM de fechar a linha de montagem de automóveis (MVA) em São José dos Campos vem desde 2008. No ano passado, logo após o acordo, a GM já havia demitido cerca de 600 trabalhadores. Em julho passado, a presidente Dilma havia afirmado que a redução do IPI estava condicionada à manutenção dos empregos. Segundo o CAGED (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), a GM fechou 1217 postos de trabalho entre janeiro de 2012 e dezembro de 2013, mostrando que o acordo de manutenção dos empregos para a redução do IPI foi praticamente ignorado pela GM. Com o fim da redução do IPI anunciado para o inicio de 2014, a indústria automobilística aprofundou essa política e iniciou uma prática de demissões em massa como meio de reduzir custos, pressionar diretamente os trabalhadores e os sindicatos em seus futuros acordos, aumentar a sua lucratividade, e por tabela pressionar o governo a reduzir novamente os impostos e a aumentar os seus subsídios (gerando, obviamente, mais lucros para as empresas).
Diante das demissões em marcha, o sindicato luta por reverter as demissões: com a alternativa de um caminho jurídico de entrar com uma audiência de conciliação no TRT não se obteve êxito, pois no TRT de Campinas fechou-se um acordo que beneficia os trabalhadores demitidos com os mesmos direitos dos trabalhadores que aderiram ao Programa de Demissão Voluntária (PDV) e mais o recebimento de 1 a 5 salários, conforme o tempo de salário de cada trabalhador. Mas as demissões continuam vigentes, demonstrando que o único caminho para barrá-las é a mobilização e a luta nacional dos trabalhadores. As demissões na GM são o início de um processo de demissões em massa que se inicia com o objetivo de descarregar a crise sobre os assalariados e a classe operária. Os trabalhadores, diante dessa situação, devem discutir a fundo uma política para enfrentar a tentativa do governo de Dilma Rousseff e seus acólitos de jogar os efeitos da crise sobre suas costas, a organização de um congresso de base, com ampla participação dos trabalhadores, para discutir uma política classista frente às demissões em massa e para organizar um plano de lutas para enfrentá-las, seria um passo importante na organização dos setores mais combativos do movimento operário.




GREVE DOS BANCÁRIOS NO RS

No ano passado, a burocracia sindical da Contraf/CUT (Confederação Nacional dos Bancários), os banqueiros, o Governo Federal(Dilma/PMDB) e o governo estadual (Tarso Genro/PT), unidos, derrotaram mais uma Greve dos bancários. E esta Greve de 2013 foi a maior dos últimos 20 anos (mais de 12.200 agências fechadas). Depois de uma série de negociações entre a Contraf, os banqueiros e os Governos, mais conhecidas entre os bancários como rodadas de enrolações, a única proposta concreta apresentada pelos banqueiros foi um índice de reajuste de 6,1%, metade do já rebaixado índice reivindicado pelos bancários de 11,93%, ou seja,  uma verdadeira provocação para a categoria bancária. Diante dos fatos, a burocracia sindical foi obrigada a marcar assembléias em todo o País para rejeitar a proposta da patronal e decretar Greve por tempo indeterminado.
Novamente estávamos diante de um velho golpe aplicado contra a categoria bancária, pela burocracia, pelos banqueiros e governos, principalmente ocorrido nos últimos 10 anos, coincidentes com mesmo tempo de administração petista no país. De um lado, os bancários entusiasmados e mobilizados para lutarem pelos seus direitos, do outro, seus tradicionais inimigos unidos, cabendo ressaltar que só os cinco maiores bancos no 1º semestre de 2013 lucraram 29,1 bilhões de reais. Mal a greve dos bancários começou e a oposição bancária - Novo Rumo (Bancários Podem Mais, MNOB/PSTU, Crítica Bancária, Unidos para Lutar/PSOL, Intersindical e Independentes) já desde o início tentava quebrar o velho script dos últimos anos, defendendo que todas as assembléias fossem conjuntas(unificadas), todos os bancários juntos, ao contrário de outros anos, assembléias separadas (assembléias de bancários só de Privados, só do Banco do Brasil, só da Caixa Federal e só do Banrisul). Reivindicava que o Banco do Brasil, a Caixa Federal e o Banrisul saíssem da sombra da FENABAN (Federação Nacional dos Bancos) – banqueiros - e viessem negociar de verdade. Defendiam que só fossem aceitas pela Contraf/CUT as reivindicações dos bancários no seu conjunto, pois estas já eram rebaixadas.
A greve iniciou com a paralisação de aproximadamente 6.100 agências e atingiu mais de 12.200 agências (com um crescimento dia a dia). Passados 26 dias, a Greve dos bancários se tornou a maior dos últimos 20 anos. Durante a greve tivemos alguns problemas, como os famosos “piquetes terceirizados” (já ocorreram em outros anos), que consiste em contratar trabalhadores terceirizados para fazer os piquetes no lugar dos bancários. A categoria precisa se posicionar diante desta prática nas futuras greves. O Sindicato dos Bancários só editava boletins para a categoria apresentando como únicos inimigos dos bancários, os banqueiros privados, não falava nenhuma palavra contra o governo federal (Dilma) e governo estadual (Tarso Genro). Isto levava aos bancários menos avisados a acreditarem que só os banqueiros são inimigos dos bancários.
Os banqueiros apresentaram uma nova proposta ao Comando Nacional dos Bancários (Contraf/CUT), 7;1% de reajuste salarial, mais uma nova provocação dos banqueiros. Dado a reação contrária da categoria bancária a esta proposta, o Comando Nacional dos Bancários foi imediatamente obrigado a orientar para as assembleias do 19º de Greve que os bancários recusassem a proposta dos banqueiros, os bancários recusaram massivamente esta proposta. Mais uma vez os bancários mostraram a sua força e união na luta. Os bancários, uma categoria reconhecidamente adoecida, principalmente por ter que atingir metas abusivas, por sofrer assédio moral, por ter que cumprir elevada carga de horas trabalhadas e declínio do padrão de vida ano após ano, ainda têm que suportar, principalmente, nos últimos dez dissídios o sadismo dos banqueiros, do governo federal e governo estadual que ficam num silêncio total durante as greves e quando se pronunciam é para apresentarem propostas rebaixadas.     
Quando chegamos ao final da greve dos bancários dos bancos privados, Banco do Brasil e Caixa Federal, pois os bancários do Banrisul permaneceram em greve, a mobilização era enorme. Mas porque terminou a greve com reivindicações abaixo da expectativa da categoria? Os bancários tinham uma mobilização capaz de tirarem da patronal a imensa maioria de suas reivindicações, mais de 20 dias de paralisação; e aí entrou o velho script dos inimigos dos bancários para impor mais uma derrota à categoria bancária. Então no 22º dia de greve, o Comando Nacional dos Bancários com uma enorme influência da burocracia sindical de São Paulo fizeram um péssimo acordo com a patronal. De uma reivindicação dos bancários de 11,93% de reajuste salarial, a burocracia aceitou 8,00%  e  na questão da compensação dos dias paralisados, que a categoria defendia nenhuma hora compensada; o Comando com os banqueiros e o governo federal negociaram que os bancários deveriam compensar 1 hora por dia até o dia 15/12/2013. Para a burocracia sindical que está liberada nos sindicatos de cumprir jornada de trabalho e registrar ponto, isto não faz a menor diferença; ou seja, o que sempre derrota a luta dos bancários é a dupla traição da burocracia em conjunto com a patronal.
As assembleias finais para aceitar ou não a indicação do Comando (aceitar a proposta dos banqueiros) foram bem debatidas e acaloradas com os representantes da Oposição (Novo Rumo) de um lado e os representantes locais do Comando Nacional (Contraf/CUT) do outro. Foram vaiados dirigentes históricos da burocracia sindical. Nas assembleias do 23º dia de Greve terminaram a Greve, principalmente em São Paulo.
Nas assembleias do dia 26º dia de greve, os demais bancários no restante do país terminaram a greve. A grande lição para os bancários é a de que é necessário mudar a maioria dos seus dirigentes sindicais nos sindicatos, nas federações e na Confederação. Esses novos dirigentes deverão ser de luta e defenderem os interesses da categoria.
Os companheiros bancários do Banrisul fizeram mais de 30 dias de greve contra o governo Tarso Genro (PT); heroicamente continuaram sozinhos na luta; porém com a torcida e o apoio de todos os demais bancários. Os bancários do Banrisul mais um ano mostraram que o caminho é lutar. É necessário que a oposição bancária comece desde já a preparar e discutir um Plano de Lutas com toda a categoria bancária, nacionalmente, para colocar em marcha a mobilização da categoria, através de Encontros de base com delegados eleitos nos locais dos trabalhos, na defesa das suas reivindicações mais sentidas.


A LEI “ANTITERRORISTA”


Repudiamos o PLS 499 de 2013, também chamado de “lei antiterrorismo”, criado com a única finalidade  de criminalizar o movimento social e reeditando o Ato Institucional nº 5, uma verdadeira afronta às liberdades democráticas.  As punições são mais rígidas que a Lei de Segurança Nacional (LSN), editada durante a ditadura militar (1983), e ainda em vigor. A imprecisão do texto abre um horizonte imenso de interpretações sobre o entendimento em torno do crime de terrorismo, podendo enquadrar supostos “arrastões” e “rolezinhos”, ou todo tipo de manifestações populares, que poderão ser  reprimidas, tendo em vista essa nova norma, com punições muito mais severas que as vigentes, ameaçando com penas que variam de oito a 30 anos de prisão em regime fechado. Lutamos pela plena liberdade de opinião e manifestação para os trabalhadores e a juventude que luta contra a opressão e a exploração.


OS “ROLEZINHOS” E AS MANIFESTAÇÕES CONTRA A COPA
David Lucius


Desde o final do ano passado que uma parcela da esquerda e da população em geral fazem um prognóstico que se pode ouvir pelas ruas: o de que o ano de 2014 será um ano de grandes mobilizações e protestos por todo o país. As jornadas de junho, que ainda encontram-se frescas na memória da juventude, irá completar seu primeiro aniversário exatamente no mês de realização da Copa, uma revolta latente de amplos setores da população contra o fato de que nosso país sediará uma Copa do Mundo já se faz ouvir, enquanto que de uma forma geral faltam recursos para áreas sociais (saúde, educação, reforma agrária, etc), ao mesmo tempo em que a Copa intensifica o aumento da especulação imobiliária e da carestia nas grandes cidades, justificando assim a existência do prognóstico acima citado.
Já no inicio deste ano, as grandes cidades foram marcadas por uma onda de protestos, inusitados, e que tomaram os shoppings de várias capitais do Brasil. Os “rolezinhos”, como foram chamados, se iniciaram de forma despretensiosa para marcar os encontros da juventude da periferia e logo se transformaram em um tipo de protesto social, que colocou a nu o verdadeiro apartheid social que vive nosso país em pleno início do século XXI.
Os iniciadores desse “roles” foram uma grande parcela da juventude mais humilde (em geral eram garotos pobres, jovens, desempregados e com pouco tempo de escolaridade) das periferias que marcam seus encontros nos shoppings para se conhecerem e se relacionarem (como é próprio da juventude), diante da carência de centros de lazer nas periferias das grandes cidades.
Os “rolezinhos” foram marcados no inicio com um caráter apenas recreativo, e só começaram a se “politizar” e a ganhar um caráter de protesto a partir da atitude de grande parte da administração dos shoppings e dos grandes lojistas que mobilizaram a polícia para reprimir de forma contundente esses setores. A atitude de nossas burguesias de ter medo de qualquer aglomeração social oriunda dos lugares mais pobres é sintomática da conjuntura que vive nosso país, afinal, as jornadas de junho foram marcadas predominantemente por setores “médios” da juventude e da população, e o instinto de classe da burguesia, apavora-a, literalmente, com pesadelos, diante da possibilidade de que uma grande massa da população proletarizada se revolte e se junte a esses setores médios em protestos de maior amplitude e com reivindicações econômicas e sociais mais radicalizadas.
Cabe lembrar que as periferias das grandes cidades e suas favelas possuem cada vez mais uma grande parcela da população, expulsa dos grandes centros principalmente pelo aumento desenfreado no custo de vida e pela especulação imobiliária.
Como diz a letra de uma música: “..o Haiti é aqui”, e o medo de uma grande revolta social (a la Haiti) não é mera coincidência; a repressão se generaliza e se manifesta de forma concentrada nas periferias. Sem contar que houve claramente um caráter racista de tentar impedir setores da juventude de entrar nos shoppings, tendo por critério de seleção a cor da pele do indivíduo. Uma grande quantidade de jovens foram presos “para averiguação” como se diz no jargão policial, mas inversamente nesse caso a repressão só fez aumentar a quantidade de “roles” e de protestos.
Retrospectivamente, o primeiro “role” foi no shopping Itaquera no dia 08 de dezembro passado, onde 6 mil pessoas se reuniram para um encontro marcado por uma rede social, depois foram dezenas de shoppings centers: Interlagos, Guarulhos, Tucuruvi, novamente Itaquera; o Iguatemi obteve uma liminar na justiça contra o “role” (o que aumentou ainda mais a revolta da juventude); e daí por diante foi difícil uma grande capital de nosso país que não tivesse o seu “role”, e em pouco tempo a burguesia estava no mínimo dividida, quanto à questão de se os enfrentamentos não iriam aumentar e disseminar os “roles”.
Realmente, os “roles” se espalharam e se “politizaram” por todo o país, com o apoio de vários setores da esquerda, do movimento negro, dos movimentos de moradia, pela reforma agrária e é lógico de setores mais amplos da juventude. Os protestos ganharam a parte externa dos shoppings (diante da imensa adesão de um lado, com o fechamento de alguns shoppings nos dias de protesto, e o aumento da repressão do outro), setores patronais chegaram a esboçar acordos com o governo para tentar levar os “rolezinhos” para outros lugares das cidades (parques, escolas, etc), mas já era tarde, o caráter de revolta já tinha ganhado à simpatia de muita gente para mudarem o palco do protesto.
Como um ensaio geral, os “rolezinhos” esquentaram o clima para o dia 25 de janeiro, quando foi realizada a primeira manifestação do ano contra a Copa em cerca de 13 capitais, incluindo São Paulo e Rio de Janeiro. “Não vai haver Copa” gritavam em tom desafiador grande parte da juventude ali presente. A repressão desenfreada por parte dos policiais em São Paulo e a infiltração de certos “provocadores” que estavam mais interessados em que o movimento fosse reprimido, do que levar esse movimento a conquistar vitórias, não tirou a importância simbólica do inicio das mobilizações de massas deste ano. A polícia em São Paulo utilizou balas de verdade na repressão, alimentando mais ainda o ódio popular contra o aparelho repressivo do Estado (não nos esqueçamos que o estopim das Jornadas de Junho foi a repressão policial contra os protestos juvenis que se opunham ao aumento das passagens de ônibus).
Todos estes primeiros movimentos do ano funcionaram de certa forma como um “ensaio geral” para o que virá mais adiante. A esquerda revolucionária terá como desafio organizar os setores cada vez mais amplos que se deslocam por fora dos partidos da esquerda governista, e que hoje está cada vez mais na contramão do movimento de massas, que se desenvolve e se choca contundentemente contra seu governo, de qualquer forma, 2014 começou com um mês de janeiro que nos aponta grandes perspectivas para a luta da juventude e dos trabalhadores.


VIVA A GREVE DOS GARIS DE RIO DE JANEIRO!


Em início de março, a Companhia Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro (Conlurb) anunciava a demissão por justa causa de mais de 300 garis que aderiram à greve dos trabalhadores, iniciada em 1º de março, sábado. Os garis conquistaram o apoio dos demais trabalhadores e da população, mesmo com a forte repressão da Polícia Militar do governador Sérgio Cabral e da guarda pretoriana do prefeito Eduardo Paes.
Apesar de todas as ameaças, do assédio moral, do clima de terror criado pelos grandes meios de comunicação e das traições da maioria da direção do sindicato, na quarta-feira de cinzas (5) a greve colocou a direção da Conlurb e a Prefeitura do Rio de joelhos. Não só o governo, a mídia e a empresa tiveram que reconhecer a força da greve, mas também anunciaram a revogação da decisão de demissões.. A categoria pede reajuste salarial de R$ 803 para R$ 1.200, aumento no valor do tíquete alimentação diário de R$ 12 para R$ 20 e o pagamento de horas-extras para quem trabalhar nos domingos e feriados, como previsto em lei. A prefeitura propõe R$ 877, segundo o gari Fábio Coutinho, que também faz parte da liderança do movimento grevista. Além disso, os trabalhadores pedem o retorno do pagamento do triênio, do quinquênio e melhoria das condições de trabalho.
 A polícia deteve três garis que conversavam com outros colegas, em Copacabana. Os trabalhadores foram levados à 12ª DP e indiciados por impedir a liberdade de trabalho. Também o desembargador José da Fonseca Martins Júnior, do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, dobrou a multa diária ao Sindicato. Agora, o valor sobe de R$ 25 mil para R$ 50 mil. O desembargador ainda ameaçou com demissão os dirigentes da greve. Porém, quem impediu a liberdade de trabalho dos garis neste carnaval foi o Prefeito e a Conlurb. Desde o início de sua gestão, Eduardo Paes fez questão de cooptar a maioria da direção do Sindicato de Empregados de Empresas de Asseio e Conservação do Município do Rio de Janeiro, com o único objetivo de aprofundar o arrocho salarial e a precarização das condições de trabalho. Esta burocracia cooptada perdeu seu vínculo com os trabalhadores de sua base e, consequentemente, sua representatividade. Por isso, coerentemente, os trabalhadores se organizaram para realizar sua maior manifestação no carnaval de 2014.




O Brasil, que é conhecido mundialmente por ser um dos países com maior quantidade de recursos hídricos, vive nesses últimos dias um grande dilema, diante da ameaça de ter anunciado um racionamento em várias regiões do país e em vários estados da federação. Se somente a ameaça de um racionamento de água já não bastasse para demonstrar o esgotamento e a falência política do governo federal e dos governos estaduais diante de um fato que para ser evitado necessitaria apenas de um pouco de planejamento (já que recursos e investimentos para a Copa, as Olimpíadas e outras áreas sem nenhuma prioridade social não faltaram somas abundantes). Soma-se a isso o racionamento de energia elétrica ou “apagão” como é chamado popularmente, devido ao fato de um país continental como o nosso ter 80% de sua eletricidade gerada pela matriz hidroelétrica, podendo levar o país a um duplo racionamento no decorrer do ano: o de água e o de energia de uma só vez.
Em um ano de Copa do Mundo, eleições presidenciais e com a deterioração de nossa economia ocorrendo com cada vez mais intensidade, somos informados que diante da estiagem que nosso  país vem sofrendo no último mês, o Brasil está novamente a beira de um apagão generalizado, como no último ano do governo FHC e (a semelhança não é mera coincidência...) com uma situação piorada de contradições internas e externas que nos fazem antever uma verdadeira catástrofe se as expectativas de uma parte dos especialistas se confirmarem diante da pior seca já registrada desde a década de 30. 
Diante de um quadro em que os reservatórios das principais metrópoles estão com menos de 30% de sua capacidade, e diante do fato que estamos na época das chuvas (a época da estiagem começará em abril e se estenderá até outubro, onde o problema tende a se agravar). Segundo um especialista, para que a situação mudasse precisaria que chovesse nas regiões dos reservatórios durante cerca de 60 dias ininterruptos, para que se atingisse uma vazão de 1000 milímetros cúbicos até a estiagem, o que dificilmente deverá ocorrer.Para tentar resolver o problema de uma forma emergencial, a Sabesp contratou um avião para bombardear as nuvens na região das represas do Sistema Cantareira (ao preço de quase 5 milhões de reais), mas até agora sem nenhum grande êxito registrado.
A região abastecida pelo sistema da Cantareira é uma das regiões econômicas mais desenvolvidas de São Paulo, com grande concentração de empresas, fábricas e de produção de bebidas (Coca Cola, Ambev, etc, etc), não precisamos especular muito para chegarmos a conclusão de como os efeitos de uma seca somente nesse sistema poderia afetar a economia nacional. No interior do estado a agropecuária já está afetada pela seca, se têm notícias de que há hortas paralisadas e cerca de 50 mil frangos mortos, sufocados numa estufa devido a paralisação dos ventiladores causados pela queda de energia, ou seja, um apagão que atingiu uma parte de nosso país recentemente.
Outra consequência lógica e nefasta disso tudo é que o governo deve promover um tarifaço depois das eleições para descarregar o ônus da crise nas costas da população. Somente até o momento o calculo de gasto com as distribuidoras de energia deve passar dos 20 bilhões de reais, valor acrescido dos gastos com termoelétricas que serão utilizados no limite para compensar a subutilização das hidroelétricas na geração de energia. Sem contar que devido ao extremo calor o consumo de energia está tendo recordes diários de consumo. Segundo as palavras de Felipe Barroso, da empresa Bioenergias a catástrofe pode ser eminente: “Já estamos no limite e os apagões podem acontecer a qualquer momento”. Tudo indica que a situação tende a se agravar, o possível racionamento de água e de energia elétrica deve ter seu clímax no auge da estiagem entre junho e outubro, ou seja, entre a Copa e as eleições.
Carlos Farias, que é presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia, prevê um tarifaço após as eleições: “Imagino que o reajuste das tarifas terá de ser, no mínimo, de 15% após as eleições”.
Diante dos racionamentos e dos tarifaços, a população e a classe trabalhadora devem se organizar e se mobilizar. A luta pelo direito a água e a energia elétrica para todos e sem tarifaços é um princípio básico para toda a população. A tentativa do governo de empurrar pela goela abaixo dos consumidores, o racionamento e o tarifaço, só podem ser contidas pela luta massiva da população e da classe trabalhadora.
  




Entre 16 e 20 de dezembro, teve lugar em Atenas uma nova reunião das principais organizações da CRQI (Comitê pela Refundação Imediata da IV Internacional). Estiveram presentes o EEK (Grécia), Partido Obrero (Argentina), PCL (Itália) e DIP (Turquia). Na análise da situação mundial ocupou um lugar fundamental a vitória política obtida na Argentina pela Frente de Esquerda e dos Trabalhadores, impulsionado pelo Partido Obrero. Foi caracterizada como a culminação de uma etapa de dez anos de delimitação política do nacionalismo burguês tardio – o chavismo, o indigenismo e o kirchnerismo, e em geral do desenvolvimento político de uma vanguarda da classe operária e da juventude nas últimas décadas. Numerosos setores operários e da juventude votaram na Frente de Esquerda ao cabo de uma experiência de confrontações políticas, por um lado, e de lutas, por outro. Não se pode abstrair o resultado eleitoral deste desenvolvimento metódico. A Frente de Esquerda poderia converter-se em um canal revolucionário e massivo, o qual ampliaria o campo de desenvolvimento político do partido revolucionário.
Sobre a America Latina, os representantes do Partido Obrero expuseram as consequências da crise capitalista, por um lado, e as alternativas do desenvolvimento da Esquerda. Destacamos o fracasso do intento de querer construir um partido da burocracia sindical, na Bolívia, o chamado Instrumento Político, sobre a base de um programa centrista (“partido de Trabalhadores”). Este fracasso havia sido adiantado no documento de nossa conferencia latinoamericana realizada em 2011. O esgotamento das experiências como o chavismo, lulismo e frenteamplismo, abre uma possibilidade política nos termos da experiência argentina, a condição que se apoie em um programa, ou seja em uma delimitação política do nacionalismo e do centrismo. Temos chamado a atenção até as eleições, em 2014, em Brasil e Uruguai. Em relação à Europa, foram analisadas as consequências sociais catastróficas da crise em quase todos os países, em especial a situação na Itália e Grécia. A partir de uma verificação dos resultados da Conferencia europeia convocada pela CRQI em junho de 2013, decidiu-se convocar uma nova conferencia europeia, em abril próximo, planejou-se definir uma política para as eleições ao parlamento europeu. Os prognósticos catastrofistas dos documentos fundacionais da CRQI foram confirmados por completo. O “Partido da Esquerda Europeia” (Syriza da Grécia, Frente de Esquerda da França, União de Esquerda da Espanha, entre outros) tem como base programática a defesa completa da União Europeia imperialista. A presença e o auge de formações fascistas como o Amanhecer Dourado na Grécia, ou de extrema direita é manipulada pelo Estado e os meios de comunicação, como reserva última do capital frente à catástrofe em desenvolvimento. A reunião da CRQI apreciou em toda sua extensão a importância da vitória obtida pelo EEK da Grécia em seu combate contra a acusação criminosa por parte do Amanhecer Dourado (com a cumplicidade do Estado burguês em seu conjunto) a seu dirigente Savas Matsas. Essa vitória foi produto de uma intensa campanha política nacional e internacional. A formação de milícias operárias, para combater o fascismo em queda, assinalou-se como una consigna fundamental de frente única dos Trabalhadores.
Sobre a base do informe prestado pelo representante do DIP da Turquia, a reunião analisou as contradições dos movimentos populares a partir de 2011 em toda a região, e as manobras e iniciativas imperialistas. O acordo Obama-Putin na Síria e as negociações dos EUA-Irã-países europeus em torno do programa nuclear iraniano, converteram-se em uma nova tentativa de canalização da crise revolucionária. Um capítulo especial foi a abordagem da situação da Turquia e a rebelião de junho passado na praça Taksim. A reunião decidiu estudar a convocatória de uma conferencia operária e revolucionária do Oriente Médio, com a participação das organizações da CRQI de outros continentes. As iniciativas adotadas se inscrevem dentro dos esforços por revitalizar o trabalho da CRQI. É necessário que demonstre uma capacidade para desenvolver programas de ação. A CRQI é uma organização de combate. É necessário que desenvolva o método fixado em seus estatutos. As deliberações concluíram em um ato público. O ano que se inicia promete uma intervenção gigantesca das massas em ambas as margens do Mediterrâneo.


A VITÓRIA DA FRENTE DE ESQUERDA E DOS TRABALHADORES DA ARGENTINA
David Lucius


Nas eleições legislativas argentinas do ano passado, a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores obteve um milhão e meio de votos, uma votação histórica e significativa atraindo uma grande parcela da juventude, da esquerda e da classe trabalhadora. A FIT também chamou a atenção dos setores classistas da esquerda latino-americana por ser (ao contrario da esmagadora maioria das frentes de esquerda latino-americanas) uma aliança de partidos militantes, classistas e revolucionários (compostos majoritariamente por forças que reivindicam sua origem trotskista), sem nenhuma participação de partidos da esquerda pequeno burguesa tradicional, que tem em seu histórico alianças estratégicas com setores da burguesia nacional e estrangeira.
A Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT) foi formada em 14 de abril de 2011 pelo Partido Obrero - PO, o Partido dos Trabalhadores - PTS e a Esquerda Socialista - IS, como uma frente para disputar as eleições que se realizavam nesse ano, mas que se propunha ser uma frente que atuasse em toda a cena política e na luta de classes argentina como um todo, e não meramente apenas como uma frente eleitoral, tendo desdobramentos de sua política na militância do movimento popular, sindical e estudantil, assim como em grandes mobilizações populares como as que ocorreram posteriormente nos atos de 1º de maio, e nas greves gerais organizadas contra o governo Kirchner.
A esquerda revolucionária da Argentina consolidou política e programaticamente o ascenso obtido após o argentinazo de 2001, ganhando amplas camadas na juventude e na classe trabalhadora. Posteriormente em 2010, o assassinato pelas chamadas “patotas sindicais” (grupos armados ligados a burocracia sindical) do militante do Partido Obrero, Mariano Ferreyra, causou uma comoção nacional com multitudinárias marchas protagonizadas por amplos setores da população, contra o governo kirchner, que acobertou desde o princípio a burocracia sindical assassina, e que sofreu um duro golpe com o processo judicial e a mobilização da esquerda contra seus aliados da burocracia sindical.
É importante ressaltar que a FIT foi formada não como um mero acordo eleitoral, mas sim uma frente programática classista que impulsiona uma política alternativa à situação vigente no país, que propõe um conjunto de propostas para a população e que intervêm nos mais distintos setores da sociedade (movimento estudantil, sindicatos, movimento operário e de desempregados, mobilizações populares, etc). O Partido Obrero deu um duro combate de delimitação e discussão política para que ali fossem sintetizados os princípios básicos e classistas que norteiam a FIT.  A FIT foi ganhando rapidamente uma representatividade junto aos trabalhadores e a esquerda, o que garantiu, no ano de 2011 a superação de seu candidato presidencial, Jorge Altamira (Partido Obrero), nas primarias (espécie de primeiro turno em que os partidos precisam obter 1,5% nacionalmente para ir para as eleições gerais). Nesse ano uma campanha na internet virou febre entre a juventude, chamava-se: “Um Milagro por Altamira”, o objetivo dessa campanha era chamar votos para a esquerda revolucionária e classista agrupadas na FIT. Conseguindo passar pelo primeiro desafio, que era as primárias, logo após seguiu-se as eleições gerais presidenciais onde obteve mais de 500 mil votos (2,31% dos votos).
Nas eleições legislativas de 2013 o Partido Obrero e a Frente de Esquerda obtiveram cerca de um milhão e meio de votos, triplicando o número de votos obtidos anteriormente na primeira eleição, elegendo uma pequena bancada de deputados federais, vários deputados provinciais (estaduais) e vereadores, atraindo uma enorme massa de simpatizantes entre a juventude, a esquerda e os trabalhadores.
Poucos dias após as eleições nacionais houve eleições em Salta (província localizada no norte do país), onde houve um resultado estrondoso em favor do Partido Obrero, os números eleitorais foram todos superiores aos 20 %, sendo que para vereadores o resultado chegou a 30 % (14% a frente do peronismo governista do PJ), o PO elegeu vários deputados provinciais e chegou pelo primeira vez ao senado provincial. A vitória em Salta também se reveste de importância pelo fato da igreja católica ter realizado uma campanha feroz contra o Partido Obrero e a defesa dos direitos da mulher (anticoncepcionais, direito ao aborto, etc.). O resultado demonstra que a FIT está em ascensão e que enquanto o kirchnerismo afunda cada vez mais, a esquerda combativa vai ganhando milhares de militantes em todo o país.
O resultado eleitoral refutou de forma definitiva a tese do governo, segundo a qual a esquerda é funcional à direita, pelo contrário a vitória da FIT causou uma derrota esplendorosa dos partidos de direita, como em Salta em que os partidos mais a direita não conseguiram eleger nem um candidato. A FIT desenvolveu uma alternativa política no mesmo momento em que o governo Kirchner retorna ao Banco Mundial, ao FMI, ao Club de París, etc. A FIT abre uma perspectiva política classista e revolucionária ao conjunto da esquerda da América Latina.
A expressiva votação da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores é uma manifestação clara da bancarrota capitalista e do esgotamento do nacionalismo burguês tardio. Também expressa a compreensão da situação histórica por parte da FIT e de um imenso trabalho de delimitação política com o kirchnerismo, no plano das ideias e da luta de classes. A Frente não progride devido às forças que aglomera, mas sim devido a claridade política que preside seu desenvolvimento, e ao método que é utilizado diante de seus novos desafios. É uma frente única em situações concretas. A FIT desenvolve-se diante de outro colapso político que ameaça toda a sociedade, ou seja, uma transição política que volta a colocar na agenda o destino da sociedade capitalista, porém desta vez com uma ascensão das forças revolucionárias. Diante das crises que se avizinham de nosso continente, a fisionomia que a FIT deu à esquerda da Argentina tem uma importância estratégica.
Temos uma frente que procura organizar os trabalhadores para serem os protagonistas na conquista do poder político e não para ficarem a reboque de setores oligárquicos ou de outras frações da burguesia.
A FIT coloca uma nova perspectiva para a esquerda latino-americana em sua luta pela conquista do poder político. Com isso temos uma divisão clara entres as diferentes perspectivas da esquerda em nosso continente: de um lado temos a esquerda pequeno-burguesa tradicional que preferiu administrar a crise do capitalismo (em aliança com o próprio) e em vez de lutar contra ele procurou adaptar-se às suas necessidades com uma série de variações na forma política, mas que manteve no conteúdo a defesa do capitalismo e uma aliança estratégica com a burguesia; do outro lado temos, com a formação da FIT, um setor da esquerda classista e revolucionária que procura conscientemente lutar contra o capitalismo (diante de seu declínio e de uma crise histórica do mesmo), impulsionar e organizar os trabalhadores para essa luta estratégica e com uma importância estratégica devido à crise histórica do capitalismo e do impacto que essa crise está tendo ao penetrar em nosso continente.
A velocidade do desenvolvimento da crise econômica e financeira, coloca diante da Argentina a possibilidade de um cenário de bancarrota eminente, que o governo Kirchner procura conjurar com “tarifaços”, com a desvalorização do peso frente ao dólar e desencadeando um processo inflacionário. Receita que não está descartada de ser aplicada em nosso país após as eleições deste ano, muito pelo contrário.
A constituição de uma Frente de Esquerda que tenha um caráter classista (de sua constituição até o seu programa) e que se incorpore nas lutas populares e dos trabalhadores como um fator organizativo e que se torne um protagonista impulsionando a mobilização da esquerda e dos trabalhadores (e não dispersando, atomizando e traindo essas lutas, como amiúde ocorre em nosso continente), é um fator altamente progressista e até mesmo revolucionário para toda a esquerda. O acompanhamento da situação política na Argentina, e particularmente o desenvolvimento da FIT e da esquerda, são hoje de uma importância capital para a esquerda latino-americana e para a esquerda brasileira.


VENEZUELA: GOLPISMO DE DIREITA E AUTOGOLPE CHAVISTA
Jorge Altamira


Em menos de dez semanas o chavismo passou da vitória eleitoral nas eleições municipais a uma crise política, cujo desenvolvimento leva inevitavelmente a uma mudança de regime político; nem o atual governo pode seguir governando nos termos que vinha fazendo, nem a oposição encontra uma metodologia que a mantenha unificada. Ocorre que a desorganização econômica alcançou proporções gigantescas, que apagam na prática o alcance das eleições, quando a oposição fracassou no propósito de convertê-las em um plebiscito que produziria a derrubada do governo. Criou-se um impasse gigantesco em seu conjunto. O governo triunfante é incapaz de deter a marcha implacável da queda da atividade econômica e a irrupção conseqüente de uma explosão social, enquanto a oposição, estimulada por essa crise social, vem de uma derrota político-eleitoral que acentuou a divisão em suas fileiras. O desabastecimento alcança 30% da oferta de produtos e a indústria e as importações estão paralisadas como consequência de uma situação cambiária terminal, porque o governo não pode oferecer divisas para os câmbios legais, pois isso provocaria uma hemorragia financeira pela via dos mercados paralelos.
O imobilismo do governo tem sido explorado pela ala direita da oposição, que entende que não há margem para esperar a convocatória de um referendo revocatório do presidente Maduro, em 2016, quando o habilita a constituição. Esta velha fração de direita da oposição gorila, tem rejeitado a tese do chefe da oposição, Henrique Capriles, para quem não há possibilidade de inclinar a balança nas ruas, com tanto que não se produza uma deserção em massa da população que segue respaldando o chavismo. As mobilizações que começaram em fevereiro, a partir do agravamento da insegurança nos ‘campus’ universitários, onde prevalece o movimento estudantil opositor, deu motivos de protestos a todo o mundo: o imobilismo do governo criou uma situação explosiva; o ritmo da crise não habilita uma posição de espera; a oposição não tem ganhado para seu campo a massa chavista; o governo responde com um aparato de repressão legal e para-legal, que mostra o esvaziamento de sua base popular.
Como ocorre em um impasse no xadrez, não pode mover-se nenhuma peça. Daí que se ofereçam saídas bizarras, como a do teórico do ‘socialismo do século XXI’ Hans Drietrich, que tem chamado a se formar um governo de coalizão com Capriles, ou a propiciar uma mediação internacional. A possibilidade de um golpe gorila está fora do radar, por mais que o invoquem, porque as armas quem as detêm são as forças armadas controladas pelo chavismo e porque Obama tão pouco está impulsionando esta alternativa. Ao governo norte-americano lhe interessa, em primeiro lugar, que o presidente Manuel Santos seja reeleito e que prossiga com as negociações com as FARC. O triângulo do golpismo gorila está formado pelo agora detido Leopoldo López, pelo paramilitar colombiano Uribe e pelos fascistas norte-americanos do Tea Party.  Trata-se de um menu indigesto inclusive para a burguesia mundial e os principais governos imperialistas. Aqueles que estão obrigados a impedir que a situação venezuelana se degenere são, especialmente, Cuba, Brasil, Argentina e, em última instância, a Colômbia. Raúl Castro e Dilma Roussef não somente tem um ponto de encontro nos crescentes investimentos brasileiros (construtoras, petroleiras) em Cuba, assim como nos governos de El Salvador e da Nicarágua, que devem bastante ao maquinário eleitoral que o Brasil vem usando com êxito em diversos países.
As alternativas que poderiam negociar a dupla lulo-castrista são, no entanto, limitadas. A Venezuela enfrenta uma crise econômica e social fora do comum. O ‘ajuste’ que delineia seu desequilíbrio financeiro é enorme; A Venezuela necessitaria de um grande financiamento internacional, que estaria condicionado a que seu governo coloque um freio brutal no sistema de planos sociais. O ‘ajuste’ transformar-se-ia em um suicídio para o chavismo; seria incompatível  com o governo e o regime político vigentes. Uma possibilidade de golpismo oficial retomaria uma alternativa já mencionada na imprensa internacional no passado recente, a de um governo transitório de militares chavistas, encarregado de uma normalização política. Seria uma espécie de golpe a Jaruzelski, o militar polaco ‘comunista’ e ‘pró soviético’ que presidiu, precisamente por isso, a transição da Polônia ao capitalismo a la Otan. A oposição gorila o receberia com grande repúdio, é lógico, porém e sobretudo, com uma expectativa ainda maior, porque um golpe dessas características teria minado de forma irreversível a autoridade histórica do movimento bolivariano. Uma parcela da esquerda saudaria, em sua ignorância, com regozijo o golpe, que seria o sepulcro do chavismo.
A pérola de Cristina Kirchner de que “os extremos se juntam”, poderia encontrar na Venezuela uma confirmação inédita, pois as marchas opositoras, com um definido propósito golpista, somente poderiam materializar-se no caso de que o próprio chavismo oficialize um estado de exceção, ou seja, arbitrariedade estatal. As reivindicações estudantis opositoras são justas; é lamentável que não as tenham levantado, na Venezuela, as juventudes ‘socialistas’, assim como na Argentina são levantadas pela FUBA (Federação Universitária de Buenos Aires), privando, de passagem, a direita de uma arma de demagogia popular. Nos referimos às mobilizações contra os estupros, tentativas de sequestro e sequestro efetivo de universitárias, atos criminais que contam, na Argentina, com a cumplicidade policial. O mesmo vale para a luta contra o desabastecimento e contra a carestia ou contra o enriquecimento descomunal dos capitalistas amigos e os sobrefaturamento das obras públicas. Porem, ao inverso do que ocorre na Argentina, na Venezuela, este movimento tem uma direção política de direita e definidamente golpista. Isto é o que importa na hora de sua caracterização. Ao mesmo tempo, a repressão criminosa por parte de grupos chavistas paralelos, que são designados como “coletivos”, com a cumplicidade do poder político, colocam a nu uma tendência reacionária e fascistizante do governo, cuja implicação política é apontar a tendência à instauração de uma ditadura. As conspirações que impulsionam a direita, valendo-se de uma demagogia democrática e popular, devem ser combatidas em primeiro lugar com a mobilização das massas e, sobretudo, com a passagem do poder político e da estrutura social aos trabalhadores e a classe operária. A Venezuela está governada por uma camarilha política e econômica e pela chamada ‘boliburguesia’ (burguesia bolivariana).
Fruto da crise estão se desenvolvendo mobilizações operárias, por exemplo na indústria automobilística , neste caso encabeçada pela UNT, dirigida pelo chavismo. Os trabalhadores exigem a nacionalização da indústria para assegurar os postos de trabalho. Trata-se, no entanto, de uma reivindicação insuficiente, isto a partir do fracasso impressionante das nacionalizações chavistas, que colaboraram com a crise econômica industrial. O que importa é o controle e a gestão operária coletiva da economia nacionalizada, a qual implica um governo dos trabalhadores. Ainda com essas limitações, ante os protestos patronais, tanto o poder judicial como a guarda nacional intervieram contra os trabalhadores. A burocracia sindical mobilizou no domingo passado aos trabalhadores petroleiros e automotrizes para apoiar o governo. Um setor minoritário encabeçado por dirigentes petroleiros classistas rechaçou esta cooptação e convocou a um Encontro Nacional Sindical e Popular de Setores em Luta para discutir um Plano Econômico e Social de Emergência e um plano de mobilização nacional em defesa dos direitos dos trabalhadores e do povo. O problema da independência política do movimento operário continua sendo o problema crucial da situação política venezuelana.


VITÓRIA DA GREVE DOS ESTIVADORES EM PORTUGAL
Raquel Varela


Os estivadores são uma espécie de história ao contrário dos trabalhadores organizados no Portugal contemporâneo. Em fevereiro passado foi anunciado um acordo em que, no fim da greve, os estivadores ganharam mais do que quando ela começou. Um sindicato serve para isto, não serve para gerir a miséria, como temos visto tantos exemplos. Exemplos lamentáveis como «conseguimos que só 1400 fossem despedidos» (na banca); «lutamos pelo subsídio de desemprego para funcionários públicos em vez de lutar contra as demissões » (na função pública); «conseguimos que só os com menos de 5 anos de trabalho façam prova» (nos professores). Há algum tempo que anunciam: «obtivemos a certeza de que só nos cortam um braço, caros senhores, porque a proposta era cortarem os dois!». O Sindicato dos Estivadores saiu com os dois braços e uma camisola nova: 47 trabalhadores despedidos foram reintegrados, alguns em melhores condições do que estavam antes (eram precários há 6 anos e passam a contrato sem termo) e abre-se espaço à formação qualificada de 20 novos trabalhadores.
Os estivadores estiveram 2 anos em greve, não por si diretamente, mas pelos outros. Exigiam para si nada. Mas para os outros o mínimo do aceitável — quem quer que trabalhasse no Porto de Lisboa tinha que trabalhar com os mesmos direitos dos que já lá estavam. Perceberam a tempo que precariedade dos mais novos seria uma pressão a curto prazo sobre eles próprios. Os patrões e a tutela disseram-lhes para não se preocuparem que os direitos deles não seriam postos em causa e eles responderam «os direitos ou são de todos ou não trabalhamos». Conheço, sem qualquer exagero, centenas de greves no século XX, em Portugal e no mundo, cujo caderno reivindicativo exigia os mesmos direitos para todos os que trabalham, reintegração de trabalhadores despedidos, recusa de diferenciação salarial sem estar ancorada na formação e mesmo, em situações revolucionárias, imposição de tetos salariais, salário igual para trabalho igual (trabalho feminino, em particular). Os estivadores não são excepcionais. Excepcional e suicida foi o padrão de sindicalismo que se viveu em Portugal nas últimas décadas e que sistematicamente negociou a conservação de direitos para os que estavam e aceitou a precarização dos que vinham.

Queremos mais pessoas a trabalhar conosco, mas queremos que tenham os mesmos direitos”. Este lema da greve é o código genético de qualquer movimento sindical decente – não é preciso ser revolucionário ou radical, basta perceber que um sindicato ou é para ganhar direitos para quem trabalha ou não serve para nada. Os estivadores não colocaram diretamente em causa o poder político, nem estão associados a uma estratégia revolucionária contra o Estado. Não questionaram o modo de acumulação capitalista, nem pediram a nacionalização dos portos. Fizeram o mínimo para si e os seus, e esse mínimo, hoje, paradoxalmente, surge como revolucionário, tal é o padrão baixo de onde partimos ao fim de 4 décadas de pacto social, moldados pela incapacidade de lutas sociais que ganhem direitos laborais mínimos de civilização, num país onde 3 milhões de pessoas não vive sem ajudas sociais e mais de meio milhão de pessoas ganha o salário mínimo e não consegue sequer alimentar-se e chegar ao fim do mês. A pressão que sofreram estes dois anos foi duríssima: mentiras despudoradas de pessoas com responsabilidades públicas; e Bruno Bobone, representante da ACL (Associação Comercial de Lisboa), chegou mesmo a dizer que os estivadores “tinham que desaparecer”. Os estivadores responderam com uma greve que se resumiu a isto: trabalhamos, mas assim que entrar nesta porta um trabalhador precário paramos. De tal forma que, numa greve de vários meses, só pararam um dia! O sindicato dos estivadores tem algumas particularidades: tem 100% de sindicalização; mas isso não chega. De que serve ter 100% de sindicalização se tudo for negociado entre elites burocratizadas? Reúne-se, por vezes semanalmente, em plenário. Não houve qualquer negociação ou ideia que não passasse por um plenário geral de trabalhadores. Isso significa que os dirigentes e a base estão no mesmo barco e são responsabilizados coletivamente pelos erros e acertos. Significa que os desvios burocráticos são travados. Os estivadores de Barcelona se reúnem todas as semanas, estejam ou não em greve. Isso cria democracia, é a base da confiança. Os dirigentes são homens de ferro que resistiram a pressões objetivas e morais sérias. Esta luta foi, como se sabe, apoiada por uma greve europeia de duas horas, a única greve de solidariedade na Europa desde a crise de 2008. E não é porque eles têm um sindicato internacional, porque existem outros e maiores, é porque este sindicato internacional luta e os outros não! Finalmente, esta greve não foi feita para marcar calendários eleitorais, nem como válvula de escape do descontentamento dos trabalhadores. O Sindicato dos Estivadores é independente da UGT e da CGTP e isso o manteve longe da estratégia de rebaixar as lutas ao fortalecimento dos partidos da oposição, à ideia de uma saída eleitoral para as questões laborais. Ao fim de 40 anos de democracia-representativa, é por demais óbvio que os direitos laborais nunca foram aí conquistados mas aí, sim, perdidos. O tema é tabu, mas não podemos deixar de abordá-lo — o sindicalismo em Portugal não é sequer um sindicalismo reformista clássico, muito virado para lutas corporativas e de sector, ele é uma correio da transmissão da estratégia eleitoral dos partidos políticos e essa estratégia eleitoral, que oferece a quimera de que é nas eleições de 4 em 4 anos e não nos locais de trabalho que se muda a vida, tem sido uma estratégia suicida. A outra foi vencedora. Esta vitória tem de ser celebrada.