Pablo
Heller (dirigente do Partido Obrero da argentina)
Quando completa-se o nono
ano desde a crise de 2008, a política de resgate estatal faz água e
está criando as condições de uma bancarrota ainda maior.
Uma medida disso é o colapso do
Deutsche
Bank.
As ações do maior banco alemão despencaram 6% na Bolsa de
Frankfurt
arrochando sua cotização a seus mínimos históricos. O italiano
Unicredit
enfrenta uma queda similar e, de um modo geral, os bancos italianos
estão entre as cordas. Mas estes casos são somente a ponta de um
iceberg:
são todos os bancos europeus que afrontam sua segunda crise em menos
de uma década.
Um dos fatores que
potencia a crise bancária é o fenômeno dos “rendimentos
negativos” dos ativos públicos, que cresceram à sombra do
salvamento implementado nas principais metrópoles capitalistas.
Um dos pilares desta
política está sendo a “flexibilização quantitativa” (QE:
Quantitative
Easing),
que consiste em injetar bilhões de dólares no sistema financeiro.
Esta política monetária expansiva se dá em função da queda da
taxa de juros.
A aposta era que taxas
mais baixas estimulariam ao capital a investir na “economia real”
(capital produtivo). Isto, no entanto, não foi bem assim. Os
investimentos globais estão muito abaixo donde se encontravam antes
de 2008, e não existem indícios de recuperação. A redução dos
investimentos provoca uma queda na taxa de crescimento da
produtividade, enquanto os fundos acumulados pelas grandes
corporações são canalizados para as atividades especulativas –
como a recompra de ações e as fusões. As fusões são, inclusive,
um mecanismo de “racionalização” (liquidação) de ativos
produtivos, frente à superprodução e sobre investimento. O efeito
principal da flexibilização quantitativa é a inflação dos ativos
financeiros. O valor das ações estadunidenses está próximo dos
máximos históricos, enquanto a atividade econômica registra o
ritmo mais lento que em qualquer período anterior desde a Segunda
Guerra Mundial.
Mas o impacto mais
significativo do QE ocorre no mercado de bônus: cerca de 13 trilhões
de dólares em bônus públicos se compram e se vendem com
rendimentos negativos. Ocorre que o preço do bônus é tão alto, e
seu rendimento tão baixo (os dois se movem em relação inversa),
que se um investidor compra um bônus, receberia, caso ficasse com
ele até o seu vencimento, um retorno negativo. Os bônus, no
entanto, seguem sendo comprados com a esperança de que seu preço se
elevará ainda mais, o qual levaria a obter lucros de capital em uma
posterior revenda.
Esta bomba relógio
poderia explodir frente a qualquer virada da política monetária. Um
eventual aumento da taxa de juros desataria uma queda da cotização
dos bônus e traria conectadas perdas importantes de seus tomadores,
que compraram a preços muito elevados, esperando uma suba ainda
maior.
As taxas de juros ultra
baixas e inclusive negativas impactaram diretamente em um dos pilares
do sistema financeiro global – os fundos de pensões e companhias
de seguros. É que os rendimentos dos “ativos seguros”,
principalmente os bônus do Estado, são tão baixos que colocam em
perigo a totalidade de seu modelo de financiamento.
Um dos principais
prejudicados são os bancos. Em um cenário de tipos de juros
negativos, poupadores e investidores evitam realizar depósitos
(deveriam pagar por isto). Estamos no mundo do avesso: são
retribuídos os que pedem dinheiro e os poupadores são penalizados.
Assistimos a um fenômeno inédito na história do capitalismo.
Inconcebível antes da crise financeira de 2008. Quase 500 milhões
de pessoas em uma quarta parte da economia global vivem em países
com tipos de juros abaixo de zero. Seu significado de fundo é que
existe um excesso de capital monetário (sobreacumulação) sem
condições de ser convertido rentavelmente em capital produtivo. A
saída a esta crise implica uma destruição em massa desse capital
que flutua nos círculos especulativos. As diferentes frações
capitalistas não admitiriam “concertar” essa liquidação de
capitais restantes, a qual deverá, portanto, cobrar a forma de
choques e antagonismos crescentes.
Os benefícios dos
banqueiros estão sendo estrangulados, os mercados monetários
poderiam congelar-se e os poupadores poderiam concluir enchendo seus
colchões para evitar que sua entidade financeira lhe cobre por ter
dinheiro. Um curto-circuito desta natureza poderia levar ao colapso
do crédito, acentuando as tendências recessivas e levando a
economia mundial a uma depressão.
Este desconcerto explica
as reações diferentes dos distintos bancos centrais. O Banco do
Japão anunciou que tentará controlar o mercado de dívida a longo
prazo, que normalmente está regido pelos investidores. O objetivo é
manter as taxas de juros de longo prazo em território positivo e,
com isso, aliviar aos fundos de pensões, bancos e companhias de
seguros, ainda que isto conspire em forma imediata com a política de
estímulo à atividade econômica que vem promovendo o governo e que,
de todo modo, tem resultado num fracasso. Nos últimos 22 anos, o
impacto sobre o PIB real dos estímulos implementados no Japão tem
sido zero – ou negativo, se adicionarmos o custo da dívida
contraída. Mas o que mais estremeceu ao mercado foi a negativa de
Ângela Merkel em socorrer ao Deutsche
Bank
caso fosse necessário.
O Banco Central dos EUA,
em um sentido inverso, resolveu não aumentar a taxa de juros. Em um
balanço do que ocorreu com o mercado das hipotecas em 2008, o
mercado de bônus transformou-se em uma questão explosiva, com o
agravante de que a crise imobiliária segue sem resolver-se e está
em marcha uma nova bolha na bolsa. Os bancos centrais reconhecem que
estas crescentes contradições e desequilíbrios na economia os
estão deixando sem respostas nem munições.