sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

LIBERDADE A AHED TAMIMI E A TODOS OS PRESOS POLÍTICOS PALESTINOS


 

 

 

Do Brasil, o TRIBUNA CLASSISTA adere e apoia a campanha realizada pela Coordenação pela Refundação da Quarta Internacional - CRQI em defesa da jovem palestina, Ahed Tamimi, de apenas 16 anos, que se encontra presa neste momento, junto com seus familiares, por enfrentar com seus próprios punhos a sanha assassina do exército sionista de Israel, que promove um verdadeiro genocídio do povo palestino, junto com o imperialismo ianque e seu atual presidente, o piromaníaco Donald Trump.

Segue abaixo a Declaração Política da CRQI. Chamamos o conjunto do ativismo político no Brasil a se incorporar a essa campanha mundial, bem como os partidos e organizações democráticas e de esquerda: 

 

  DECLARAÇÃO INTERNACIONAL

Junto a dezenas de milhares de ativistas e organizações nos somamos à campanha internacional exigindo a liberdade da jovem palestina de 16 anos, Ahed Tamimi, e todos os presos políticos palestinos. 

 

Na terça-feira, 19 de dezembro, as Forças de Defesa Israelense (IDF) detiveram em Nabi Saleh, localidade de Cisjordânia, à jovem Ahed, a sua mãe Nariman e a sua prima, Nour.

 

Estas detenções inscrevem-se entre outras centenas que se intensificaram nos territórios ocupados como consequência da decisão de Donald Trump de mudar a embaixada norte-americana para Jerusalém, e reconhecer a esta cidade símbolo multireligioso, como patrimônio exclusivo do Estado de Israel.

 

A decisão do imperialismo tem aberto uma nova crise internacional. Os colonos que ocupam a zona localizada a 20 km de Ramallah desde 1977, os Halamish, vêm estendendo seu território com o apoio do exército e agora alavancados pelo respaldo imperialista têm avançado sobre novas fontes de fornecimento de água em território cisjordânio.

 

A viralização do vídeo, onde se vê a menina Ahed Tamimi esbofeteando aos soldados posicionados no pátio de sua casa, que no dia anterior tinham ferido gravemente a um de seus primos disparando no seu rosto, tem propiciado um golpe à imagem do poderoso exército de Israel. Os Tamimi são uma família de ativistas palestinos e referências da nova geração de lutadores que resistem à política de ocupação de Israel.

 

Ahed é o símbolo da resistência e do envolvimento dos jovens palestinos na luta pelo reconhecimento nacional e contra as ocupações do território. Como a cada sexta-feira, os habitantes de sua aldeia, com os meninos como protagonistas, marcham para protestar contra a ocupação protegida pelos soldados israelenses. Dessas mobilizações registra-se a imagem de Ahed aos 11 anos desafiando a um soldado armado até os dentes depois que estes mataram seu irmão. 

 

As declarações do Ministro de Educação de Israel, Naftalí Benet, reclamando que as meninas terminem seus dias na prisão, ou as do Ministro de Defesa Avigdor Lieberman – um homem que propugna uma Israel sem palestinos– ameaçou: “Todos ao seu redor, não só a menina, como também seus familiares, não escaparão do que merecem”, são o depoimento da virulência do imperialismo e do Estado de Israel para com o povo palestino desarmado e faminto.

 

Frente a esta nova arremetida sionista contra o povo palestino é fundamental unir forças a nível internacional para exigir a liberdade de Ahed e de todos os presos políticos.


- Repudiamos a perseguição do governo israelense e as detenções arbitrárias.
- Fora o imperialismo do Oriente Médio
- Fora o estado sionista de Jerusalém e da Palestina
- Liberdade a Ahed Tamimi! Liberdade a todos os presos políticos palestinos!

 

Assinam esta declaração internacional:

Partido dos Trabalhadores (PT) e Plenário de Mulheres Trabalhadoras - Uruguai
Partido Obrero e Plenário de Trabalhadoras – Argentina
Partido Obrero Revolucionário (POR) - Chile
Partido Revolucionário dos Trabalhadores (EEK) - Grécia
Partido Revolucionário dos Trabalhadores (DIP) - Turquia
Socialismo Revolucionário  - Bolívia
Tribuna Classista - Brasil
MWL (MTL) –Finlândia

VI CONGRESSO DO PSOL



Por Pablo Heller

A ESTRATÉGIA DA ESQUERDA EM DEBATE
                                                          Uma crítica marxista

Nos dois dias de deliberações do Congresso do PSOL, que se realizou em 2 e 3 de dezembro, muitos delegados assinalaram a necessidade de criar uma alternativa superadora da experiência do PT. O lulismo foi qualificado, em muitas das intervenções, de “ciclo esgotado” e se enfatizou a necessidade de uma reordenação profunda da esquerda. A ala esquerda do PSOL advertiu, inclusive, contra uma tendência contemporizadora com o PT existente em setores do PSOL.

Dique de contenção
Mas, para além de invocações e advertências, a verdade é que o congresso ratificou o rumo oficial de seu partido que se aplica até o momento. O PSOL, por meio de vários de seus dirigentes, participa da Plataforma Vamos, uma coalizão de várias organizações políticas, na qual se destaca o PT e que integra também os movimentos sociais como o MST e MTST (Movimento Sem Terra e Sem Teto, respectivamente). O Vamos surgiu por iniciativa do “Povo sem medo”, uma criação do PT que inclui a CUT, a qual tem sabotado as lutas e mobilizações contra o governo de Temer. A participação do PSOL no Vamos foi ratificada pelo Congresso e, até que saibamos, segundo artigos e comentários publicados, ninguém, incluídas as correntes mais radicais, propôs se retirar dessa coalizão.
A proposta central do Vamos, como do Povo sem Medo, é preparar uma alternativa “progressista” para as eleições presidenciais do fim do ano que vem. Em nome de esperar até 2018, desarticula-se qualquer luta atual. Estamos na presença de uma grande operação de contenção que tem o PT e a CUT, como seus principais articuladores. Sem ir mais longe, a CUT, junto com as demais centrais, suspendeu a greve nacional marcada para o dia 5 de dezembro com o argumento de que o governo tinha resolvido postergar a votação da reforma previdenciária. Precisamente, essas vacilações oficialistas abriam uma oportunidade para infligir um golpe importante ao ajuste. O Congresso do PSOL aplaudiu com entusiasmo a postergação da votação da reforma, mas não mencionou uma crítica à burocracia sindical.
A Plataforma Vamos aponta a disciplinar o resto da esquerda nesse processo de bloqueio da luta popular. Não podemos deixar escapar que dita iniciativa foi concebida como uma base de apoio à candidatura de Lula, e aspira a comprometer aos partidos localizados mais à esquerda do espectro político nessa direção. Lula dá sinais contínuos à burguesia de que não vai fugir das regras impostas e de que é a melhor garantia para que a transição política em curso não perca o controle. O líder petista já adiantou que, em caso de triunfar, seu gabinete incluirá a Mereilles, ex presidente do Banco Central e figura chave do establishment, para dirigir os destinos da economia brasileira.
A candidatura de Lula teria, nestas condições, um caráter bem mais de direita que os dois mandatos precedentes, pois se oferece como opção para administrar o ajuste e a entrega ou como caução para uma fórmula presidencial, no caso de que seja privado dos direitos políticos. O PSOL especula com a possibilidade de que uma eventual condenação à prisão de Lula deixaria o panorama mais “livre” para a disputa presidencial, em que o PSOL poderia conseguir, segundo seus cálculos, um verdadeiro protagonismo. Com esta expectativa, a direção do PSOL teria sondado o líder nacional do Movimento dos Sem Teto, Guilherme Boulus, que esteve presente no congresso, para encabeçar uma possível fórmula presidencial. Isto acendeu as luzes de alerta no PT, e Lula em pessoa se reuniu com o dirigente do MTST para desestimular essa alternativa. Mas qualquer que seja o desfecho final, o concreto é que o PSOL se propõe a outorgar a liderança política a um homem alheio às suas fileiras e é parte da estrutura dirigente do PT. Isto já tem despertado o receio da sua ala esquerda, que quer a candidatura de uma de suas referências, Plínio Sampaio. De todo modo, acima das diferenças, todas as frações internas compartilham um eleitoralismo desenfreado e uma estratégia de conciliação de classes e de submissão a fundo à ordem social vigente. A Plataforma Vamos apresenta como eixo estratégico e excludente a “democratização do Brasil” (o que é um retrocesso, inclusive, em relação a qualquer dos programas que historicamente tenha levantado o PT).

Caracterização
A estratégia do PSOL é uma réplica degradada da “frente antimacrista” que se propugna na Argentina. A frente “anti-Temer” é a desculpa para estabelecer uma convergência com o nacionalismo burguês quando a batalha contra a direita coloca às claras e intensifica a necessidade de uma delimitação implacável com o mesmo.
O PSOL não é um foco organizador das lutas e também não se propõe. Isso ficou claro nas deliberações do congresso, onde, para além de invocações genéricas, as palavras de ordem, propostas e iniciativas para articular a ação direta e enfrentar ao governo Temer e sua ofensiva, brilharam por sua ausência. Precisamente, em momentos em que a questão crucial é derrotar as reformas previdenciárias, trabalhistas e fiscais - e dar continuidade às duas greves gerais últimas -, que ameaçam socialmente ao conjunto do movimento operário. Isto põe sobre o tapete a necessidade de um congresso de bases da CUT, Conlutas e os movimentos sociais. Esta perspectiva está fora do radar do PSOL.
O PSOL tem a aparência de uma frente de esquerda, mas é um aparelho que se encontra sob o arbítrio de uma camarilha parlamentar de velhos dirigentes do aparelho petista. Não pode se falar de um “partido de tendências”, pois as tendências não decidem nem determinam a orientação do partido. Na maioria dos casos, os candidatos centrais têm sido homens e mulheres que têm participado de governos capitalistas (como Erundina, ex-prefeita de São Paulo), que, presente no congresso, segundo o informe publicado no site oficial do PSOL, recebeu um forte aplauso dos assistentes.
Não esqueçamos que nas eleições estaduais do ano passado, no segundo turno, o PSOL fechou um acordo com o PMDB (o partido de Temer) em Belém (capital de Pará) e o candidato do PSOL em Cuiabá (Mato Grosso), foi o procurador Mauro, um evangelista contrário ao direito ao aborto e ao casamento igualitário, entre outros. Vem tendo sistematicamente uma forte influência clerical, consentida pelo arco esquerdista. O candidato do PSOL no Rio de Janeiro, Marcelo Freixo, fez campanha com a proposta de que “seria absurdo demonizar ao capital privado”.

Esquerda
Esta política geral não tem sido um obstáculo para a colaboração das diversas correntes da esquerda “radical”. Tal é o caso do MES (vinculado ao MST argentino), que apoiou entusiasticamente as candidaturas mais reacionárias do PSOL e recebeu inclusive apoio financeiro da siderúrgica Gerdau. A CST, corrente afim à Esquerda Socialista na Argentina, denuncia estas candidaturas, enquanto acompanha-as nas listas. A este arco somou-se o Movimento para uma Alternativa Independente (MAIS), fração que rompeu com o PSTU, favorável a uma campanha pelas ‘diretas’ com o PT. O Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT-PTS), por sua vez, tem renovado seu pedido de entrada no PSOL. A suposta “autonomia” no interior desta formação política, que se esgrime para justificar a permanência ou a entrada em suas fileiras, serve como pano de fundo para desenvolver uma cumplicidade política com uma proposta e uma direção amarrada por toda sorte de vínculos com os patrões e o estado.
O “entrismo” no PSOL não tem nada que ver com o que, em seu momento, justificou a entrada no PT na década de 80. No caso do Partido Obrero e dos militantes e correntes afins que militavam no Brasil, não só promovemos a entrada no PT, como além disso impulsionamos e jogamos um papel ativo em sua fundação. A constituição do PT encarnou um giro político dos trabalhadores, e como tal representou um passo adiante “real” na estruturação política independente da classe operária. Essa experiência, como já sabemos, terminou abortada, mas isso não desmente seu valor e seu significado. Não é o caso do PSOL, que não passa de um arranjo superestrutural de dirigentes e arrivistas políticos, alheio a um reagrupamento político genuíno da classe operária.
O PSOL é uma das versões mais de direita dos “partidos amplos” e “plurais’ que fracassaram em outras partes do mundo. É bom assinalar que o Congresso do PSOL, fazendo caso omisso à experiência já percorrida, não se privou em fazer uma reivindicação do Podemos, da França Insubmissa (de Melenchon), do Bloco de Esquerda (Portugal) e até do próprio Syriza, ignorando qualquer referência ao ajuste que se leva adiante na Grécia.
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terça-feira, 26 de dezembro de 2017

“CRIANDO UMA ESQUERDA MAIOR”


Jorge Altamira


Até onde se pode observar, é a primeira vez que desde o ‘establishment’ do país (neste caso jornalístico) se prognostica o crescimento da esquerda revolucionária na Argentina. É o que faz Jorge Fontevecchia, precisamente, no diário Perfil do dia 17/12 (“Criando uma esquerda maior”). Sua conclusão aparta-se da cruzada macartista dos ‘6,7,8’ da confraria midiática do macrismo. Ele destaca “A significativa capacidade de mobilização da esquerda na contramão da reforma previdenciária”.

Para Fontevecchia, o fim dos blocos antagônicos, a globalização e a onipresença da economia de mercado delineia o roteiro do peronismo que pactua com Macri, deixando um vazio opositor. Aqui há um lapso, porque deixa de lado a experiência do menemismo, que conduziu à bancarrota econômica, à rebelião de 2001 e à etapa K. Na realidade, sobre a base dessa globalização, desenvolvem-se crises enormes, guerras comerciais, monetárias e fiscais, ou seja uma tendência à fragmentação do mercado mundial. O “ajuste” macrista já está dando com a cabeça contra esta parede, e até o peronismo já sabe disso. Também há uma fragmentação política crescente: Brexit, a ascensão da direita pró-fascista na Europa; o piromaníaco Trump. Existe um desequilíbrio sistêmico na política mundial; da dissolução da URSS passamos à da UE. Desde “a queda do comunismo”, como adjetiva Fontevecchia, há uma onda de guerras internacionais e de crises humanitárias sem paralelo desde a segunda guerra mundial. O ‘estado de bem-estar’ está relegado ao baú das lembranças e cresce a desigualdade social. As contradições do capitalismo são mais agudas que quando existia a URSS.
A ascensão da esquerda explica-se neste contexto; não é uma derivação da virada “ao centro” do peronismo ou de sua cooptação por parte do macrismo. Durante doze anos, na maior parte da América Latina, prosperou uma tendência diferente, a chavista, distante do ‘longo caminho do meio’. Seu fracasso é uma consequência da própria crise mundial, e da insuficiência histórica das respostas burguesas nacionalistas. A esquerda está crescendo na Argentina delimitando-se do kirchnerismo, o qual agora contribui com a maior parte de seu “pessoal superior” à coalizão com o macrismo. Trata-se da esquerda que combateu politicamente ao stalinismo, em condições dificílimas, em defesa do futuro histórico do socialismo.

Neste contexto de ideias, Fontevecchia diz: “Ou (a esquerda) cresce porque o kirchnerismo incorpora-se, ou cresce porque o kirchnerismo dissolve-se…”. Ambas variantes, no entanto, supõem um casamento ou uma clonagem; ou um kirchnerismo de esquerda ou uma esquerda kirchnerista. Não tem lugar uma mudança de perspectiva histórica. Semelhante união levaria a esquerda a um impasse mortal. A tarefa da esquerda é de outra natureza: fundir-se com sua base social, a classe operária, único modo de projetar um governo de trabalhadores e o socialismo internacional. Uma alternativa híbrida inseriria a esquerda no quadro político que deve superar.

A perspectiva da esquerda depende, em última instância, de uma mudança radical na percepção da realidade histórica por parte do movimento operário. ‘That’s the question’. A esquerda socialista é o instrumento político consciente de um sujeito histórico: os trabalhadores – não uma especulação ideológica. A juventude trabalhadora e estudantil deve ser ganha para uma perspectiva antagônica à que tem se vinculado. Nisto consiste o desenvolvimento de uma consciência de classe socialista. Nesta perspectiva é necessária uma nova direção do movimento operário – a atual é uma agência da patronal e do Estado.

Promover a derrota da guerra de classe do capital, desatada pelo macrismo contra o mundo do trabalho, é a tarefa que deve converter a esquerda em direção política.

O Imposto Sindical já vai tarde

Após a aprovação da Reforma Trabalhista, agora Lei 13467/17, que retirou uma grande parte dos direitos trabalhistas, o movimento sindical brasileiro se viu em meio a uma grande encruzilhada. Afinal, o governo Temer não só atacou direitos como a jornada de trabalho, o descanso semanal remunerado, etc, como também pôs fim à contribuição sindical obrigatória, conhecida popularmente como Imposto Sindical.

O Imposto Sindical foi criado por Getúlio Vargas, inspirado pelo ditador italiano Benito Mussolini. O desconto de um dia de trabalho por ano, no mês de março, do salário do trabalhador diretamente ao sindicato da respectiva categoria, desde então, virou uma das principais fontes de financiamento do movimento sindical brasileiro. Junto com a unicidade (a regra de que só pode haver um sindicato para cada categoria de trabalhadores em determinado local) e com a investidura (a regra que diz que é o governo, no caso o Ministério do Trabalho, que determina qual é o sindicato de cada categoria), o Imposto Sindical forma o tripé da organização sindical brasileira nas últimas décadas.

Os socialistas sempre combateram esse tripé getulista. O imposto sindical “amansa” as direções dos sindicatos, que sabem que há financiamento garantido todos os anos, independente das lutas que a categoria trava, ou de qualquer esforço para sindicalizar mais trabalhadores. Gera, também, uma burocracia sindical de direita (como a Força Sindical) mais poderosa do que em qualquer país do mundo onde não há o Imposto.

Na década de 80, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) demarcou posição contrária ao Imposto Sindical, mas, na prática, nunca avançou. Sempre havia a desculpa de que o dinheiro poderia ser usado para a luta, de que devolver o imposto sindical aos trabalhadores poderia prejudicar os sindicatos, e assim por diante. Até hoje o combate ao Imposto Sindical é um “princípio” da CUT, mas que segue sendo ignorado pelos burocratas sindicais. A CUT, inclusive, foi parte protagonista do maior atrelamento das burocracias sindicais ao Estado, durante os governos petistas de Lula e Dilma.

A CSP-Conlutas também tem posição contrária ao Imposto Sindical, mas poucas de suas entidades tomam medidas concretas em relação ao caso, valendo-se das mesmas desculpas da CUT. Uma das exceções é o ANDES-SN (Sindicato dos Docentes Universitários) que, desde 1998, devolve à categoria o dinheiro descontado pelo governo, e se mantém financeiramente apenas pela contribuição sindical voluntária de seus sindicalizados.

Aproveitar o fim do Imposto para fazer crescer o sindicalismo classista


Enquanto centrais como Força Sindical e UGT, e até mesmo, de maneira envergonhada, a CUT, fazem lobby e pressão em Brasília para que o governo e o Congresso garantam alguma forma de financiamento como o Imposto Sindical, abre-se um grande espaço de disputa para os militantes do sindicalismo classista no país.

Porque, se a resposta dos burocratas sindicais ao fim do Imposto é pedir mais dinheiro ao governo, a resposta dos sindicalistas classistas é distinta: os sindicatos devem atuar de acordo com a sua real capacidade financeira e, se essa for pequena, é só mobilizando a categoria na luta e sindicalizando mais trabalhadores que é possível crescer coerentemente, de maneira independente a governos burgueses e a patrões.

É hora dos socialistas que atuam no movimento sindical, em todas as categorias, de norte a sul do país, reafirmarem sua posição contrária ao Imposto Sindical. É hora de aproveitar essa brecha e debater, também, o fim da unicidade e da investidura sindical. Seremos criticados. Mesmo em sindicatos “progressistas” nos dirão: “mas veja bem, não teremos dinheiro para manter uma sede do tamanho da que temos”, ou “teremos dificuldades de fazer luta sem esse dinheiro”, ou “o ANDES só consegue isso porque representa uma categoria com maiores salários”.

Essas respostas nunca levam em conta, de fato, a luta dos trabalhadores. Aproveitemos esse momento para renovar o sindicalismo brasileiro, expulsando dos sindicatos os burocratas que só querem se manter no poder sem fazer lutas, e construindo lutas de caráter classista que avancem rumo à organização dos trabalhadores para destruir o capitalismo.

Mathias Rodrigues, jornalista e militante da Tribuna Classista no Distrito Federal

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

A LUTA PELA IV INTERNACIONAL ESTÁ EM MARCHA

                                                                                Por Jorge Altamira

Convocação para uma conferência internacional em Buenos Aires


A comemoração do centenário da Revolução de Outubro, que aconteceu nos mais diversos palcos através do mundo, tem servido, além disso, como uma oportunidade para delimitar posições a respeito do período histórico que atravessa a humanidade na atualidade, e portanto sobre a luta de classes e as lutas políticas.

A Revolução de Outubro constituiu o ponto de partida de uma nova estratégia política do socialismo, focada até então em uma perspectiva de reformas sociais, porque testou em uma escala geográfica sem precedentes que a luta de classes moderna conduz ao governo dos trabalhadores – o qual significa a possibilidade de que o proletariado desenvolva, por meio de sua dominação de classe, o salto ou a transição para uma sociedade socialista internacional. Esta estratégia política, definidamente revolucionária, no entanto foi preponderante em um período histórico muito efêmero  em suas definições fundamentais. O retrocesso da Revolução e da classe operária, como consequência de um bloqueio econômico, invasões militares e isolamento relativo, abriu caminho à tese do “socialismo” restringido a “um só país”. Recorreu à política de colaboração de classes, conhecida, por um lado, como “frente popular” e, por outro lado, como “coexistência pacífica” com o capital e seus estados – precisamente as duas questões que o bolchevismo derrotou politicamente para impor a vitória de Outubro.

Antes que o assessor dos Estados Unidos, Francis Fukuyama, cunhasse a tese de que o domínio do capital e do mercado capitalista constituía “o fim da história” e até sua própria finalidade ou objetivo, nas filas do stalinismo e da esquerda, essa perspectiva já tinha atingido um desenvolvimento "teórico", sem podermos chamá-lo assim, significativo. A bancarrota capitalista em escala desconhecida, as guerras imperialistas e as crises políticas, bem como as rebeliões que sacodem ao mundo, se não têm posto “fim” a estas manipulações ideológicas, por certo que as têm refutado por completo. O “estado de bem-estar” jaz já no panteão das relíquias e até os estudiosos da mudança climática advertem que o capitalismo prepara uma crise existencial ao ser humano. A caracterização de que “a crise da humanidade se reduz à crise de direção do proletariado”, definida assim pela IV Internacional, é mais que nunca a questão estratégica fundamental.

Leningrado

Em Istambul, a convulsionada capital da convulsionada Turquia, foi palco, a princípios de dezembro, de uma de suas comemorações, por iniciativa do DIP – o Partido Operário Revolucionário. O encontro foi aproveitado também para reunir às principais organizações da CRQI, que luta para refundar a IV Internacional, com o objetivo de lançar uma série de iniciativas.

No início da Jornada em Istambul, várias das organizações presentes que tinham participado de seminários realizados em Leningrado (rebatizada São Petersburgo pela burocracia restauracionista), o centro político da Revolução de Outubro, transmitiram manifestações de mudanças, em especial entre a juventude russa, como a revalorização da experiência revolucionária de Outubro. Este princípio de giro político é um resultado, claro, do retrocesso histórico que sofreu o ex-espaço soviético como consequência da restauração das máfias capitalistas. À pobreza enorme, à perda de conquistas, soma-se a evidência de que o regime existente caminha por uma margem tênue de uma nova catástrofe econômica e política. A camarilha de Putin tenta estrangular esta perspectiva mediante o reforço do bonapartismo dos ‘serviços’ do Estado. No entanto, enquanto o velho partido comunista stalinista converteu-se em um capacho de Putin, ao mesmo tempo estão se produzindo rupturas de esquerda de certa amplitude, incluindo uma defesa da fundação e vigência da III Internacional fundada por Lenin e Trótsky, em 1919. Com estes informes iniciou-se a Jornada.

Taksin

O seminário organizado pelo DIP durou toda a jornada e esteve bem organizado. Teve lugar em um teatro estilo século XIX, que dá à rua que conduz à histórica praça Taksin. A Revolução de Outubro não foi relegada ao passado histórico, mas situada em sua atualidade. Ficou de manifesto que o impasse da sociedade capitalista se distingue, no presente, por sua escala, por sua profundidade, e por sua tendência, inclusive, a converter aos principais países imperialistas, em especial na Europa, no famoso “elo débil” da crise econômica e política mundial. No que diz respeito à minha intervenção no painel inicial, dei ênfase em assinalar que a vitória da Revolução de Outubro foi o resultado da vitória da luta política por superar a crise de direção que afetou ao proletariado revolucionário russo naquela luta histórica – tanto contra os partidos de colaboração de classes, como no interior do partido bolchevique. A crise de direção segue sendo o problema estratégico por excelência e está relacionado com o entendimento da decadência histórica irreversível e a tendência à desintegração do capitalismo.

A jornada destacou-se pela originalidade das intervenções de militantes muito jovens de diversos países, ou seja que expuseram suas realidades históricas, suas particularidades no contexto da crise mundial. Foi uma aula instrutiva escutar as experiências de jovens azerbaidjanos, e de militantes ucranianos e de vários países dos Balcãs. O “choque de civilizações” com que o imperialismo procura justificar sua cruzada de colonização criminosa, foi refutado pelo relato das grandes revoluções na Ásia Central muçulmana e nas gigantescas rebeliões que seguiram à primeira guerra mundial. O véu do islamismo não foi obstáculo para que milhões de muçulmanos se incorporassem à torrente revolucionária impulsionada por Outubro. A própria Turquia deve seu movimento republicano à influência da Revolução de Outubro. O imperialismo contrapôs ao Chamado aos Povos Muçulmanos (1), por parte do bolchevismo, a Declaração Balfour (2), ditada pelo imperialismo britânico, para combater essa convocação a mando do sionismo. A crise do imperialismo tem convertido, na atualidade, a toda a área coberta há cem anos pelo império Otomano, em um barril de pólvora social e político. A Jornada foi uma descrição da crise mundial na Ásia Central e no Oriente Médio, e da resistência, o combate e a revolução que mora em suas massas exploradas.

IV Internacional

Depois desta introdução a respeito da atualidade da revolução mundial, aconteceu, nos dias seguintes, a reunião das organizações presentes da CRQI, no Seminário. O ponto fundamental foi a necessidade de um balanço do programa, do método e da atividade da CRQI, para atualizar as conclusões, as táticas, os métodos de organização e as iniciativas internacionais. A CRQI é a única tendência política que reivindica a IV Internacional, que tem um programa, em contraste com as declarações conjunturais e impressionistas que caracteriza o resto. É o que nos propomos reexaminar ao cabo de duas décadas de desenvolvimento da crise mundial que esse programa soube antecipar. Para isso foi decidido convocar uma conferência preparatória internacional,  no próximo abril , com vistas a um Congresso no setembro seguinte. Para desenvolver esta tarefa e as ações políticas que impõe a luta de classes internacional, foi combinado em estabelecer uma rede digital comum, editar uma revista bilingue trimestral, grupos de trabalhos comuns em torno de cada continente e um comitê político permanente. A pré-conferência internacional terá um caráter aberto, à que assistirão numerosas organizações convidadas  da região do Euro-Mediterrâneo e da América Latina.

Anteriormente a esta reunião, organizou-se uma sessão de discussão com militantes turcos e de outros países participantes do Seminário, em relação ao Partido Obrero e à Frente de Esquerda, na Argentina, cuja experiência é seguida com interesse e criticamente. O debate girou, em definitivo, sobre o que essa experiência ensina a respeito do método para superar a crise de direção e construir partidos revolucionários com forte penetração nas massas. Em oposição a um esquematismo fortemente arraigado, sublinhamos a importância que tem a transformação da consciência do próprio proletariado, porque a vanguarda revolucionária não pode se desenvolver à margem dela, nem pode fazê-la sem jogar um papel central nessa transformação. Criticamos a ideia de que a esquerda revolucionária possa ser a beneficiária automática da crise do estado e dos partidos patronais, pois, no melhor dos casos, isso concluiria em uma construção democratizante, não revolucionária. Sublinhamos a necessidade de caracterizar muito bem a oportunidade política dos frentismos de esquerda e sua relação com o ativismo operário e a vanguarda; a necessidade, nestas experiências, de lutar para estender a unidade de ação no campo dos sindicatos, da mulher e da juventude; e por sobretudo, a obrigação, não já a necessidade, de um reforço da elaboração teórica e da delimitação política, precisamente para construir o partido que fez possível a vitória de Outubro.




(1) Na circular dos Comissários do Povo "A Todos os Muçulmanos Trabalhadores de Rússia e do Leste", emitida poucos dias após a tomada do poder, o governo soviético declarou a rejeição das políticas imperialistas seguidas pelos governos czaristas e provisórios e expressou o desejo de construir relações com os povos coloniais sobre a base da igualdade e o respeito mútuo. Este documento teve grande impacto na população muçulmana do território do antigo Império russo e nos países islâmicos.
(2) Carta enviada pelo Secretário de Estado de Relações exteriores britânico, Arthur James Balfour, a Lord Rothschild, destinada a conseguir o apoio da comunidade judia ao esforço bélico na Primeira Guerra Mundial. Conhecida como a “Declaração de Balfour”, se converteu em uma das bases legais para criar um estado judeu na Palestina. A carta foi publicada no “Times” de Londres uma semana mais tarde. O texto é o seguinte:
Foreign Office
2 de novembro de 1917
Estimado Lord Rothschild:
Tenho sumo prazer em comunicar-lhe em nome do Governo de Sua Majestade, a seguinte declaração de simpatia com as aspirações judaicos sionistas, declaração que tem sido submetida à consideração do gabinete e aprovada pelo mesmo:
«O Governo de Sua Majestade contempla com simpatia o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu, e empregará seus melhores esforços para facilitar o cumprimento deste objetivo, ficando claramente entendido que não se fará nada que possa prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades não-judaicas existentes na Palestina, ou os direitos e status político de que gozam os judeus em qualquer outro país.»
Lhe agradecerei que leve esta declaração a conhecimento da Federação Sionista.
Seu
Arthur James Balfour

O DESENVOLVIMENTO DA CRISE DO REGIME POLÍTICO, O GOVERNO TEMER E O DEBATE DA FRENTE DE ESQUERDA

                                                                    FZ - São Paulo
A análise de todo o último período de nossa História, e consequentemente da profunda crise que estamos mergulhados, passa pela constatação de que todo o processo histórico atual está ancorado no desenvolvimento de uma crise econômica mundial do capitalismo, crise essa histórica e que afeta profundamente, não só nosso país, mas todo o continente americano de forma contundente.
Essa crise, situada numa fase de declínio do sistema capitalista, e que pode ser observada, entre outras características, tanto pela extensão cronológica de uma década de continuidade da última crise mundial, como por ser a culminação de uma série de crises que abalaram o capitalismo de forma intermitente desde a crise do petróleo de 1973 até a atualidade, deixando claro que os ciclos das crises capitalistas estão aumentando sua periodicidade e diminuindo seus intervalos, expressando com isso o declínio do sistema capitalista como etapa histórica determinada. As crises cíclicas podem ser comparadas, num processo de abstração, ao pulso vital do sistema capitalista. Sua duração e seus intervalos são um instrumento valioso para se medir a vitalidade de todo o sistema. Sem buscar a raiz de toda crise mundial que vivemos, em uma crise maior, sistêmica e histórica do capitalismo, iremos perder o norte da análise política e nos perder em conjecturas ou teorias sem fundamento. O marco para a compreensão da crise que vivenciamos em nosso país só pode ser entendida cabalmente se o considerarmos como um dos elos, com sua específica peculiaridade nacional e continental, da crise mundial do capitalismo em sua etapa de decadência senil.
As peculiaridades históricas que deixaram nosso país mais fragilizado diante da crise mundial, desde as profundas desigualdades e contradições sociais que herdamos de nosso passado colonial (parte inerente da formação do sistema mundial capitalista e de seu mercado) até a dominação imperialista, etapa mais recente, do último século e meio, apenas concentraram um processo histórico desigual e combinado, ainda não superado, uma crise profunda em que toda a sociedade está diante do dilema de uma intensa luta por seus interesses sociais, isto é, de classe, diante de uma vertiginosa crise de todo o mercado mundial, que tem sua raiz na crise histórica do modo de produção capitalista, crise essa inexorável, que afeta toda a sociedade e processo civilizatório como um todo.
É importante observar que a crise também afeta a quase totalidade de nosso continente, desde os EUA até a América do Sul, afetando Argentina, Venezuela, Brasil e demais países. Mesmo a queda de regimes políticos inteiros não consegue estabilizar a crise, pelo contrário, apenas tem potencializado seus elementos, exemplo claro disso é a Argentina de Macri e os EUA de Trump. Nosso país não está isolado nesse sentido, apenas a nossa crise tomou contornos peculiares, resultado de contradições contidas por décadas e que acabaram por vir à tona de forma repentina.
Não devemos esquecer que a América Latina, num primeiro momento conseguiu ficar à margem da crise mundial. Nos primeiros anos da crise alguns países do continente (entre eles o Brasil) conseguiram um crescimento significativo do PIB, tentando a todo custo desviar-se da rota de colisão da crise mundial, mas a economia é formada de múltiplos vasos comunicantes, junta-se a isso o acúmulo das contradições históricas e sociais represadas, colocando o nosso continente no olho do furação da crise mundial.
O Brasil sofreu um forte processo de polarização que expressou a intensidade com que a luta de classes desenvolveu-se no último período. Os interesses em pugna pelas classes sociais e pelos partidos políticos podem levar ao observador inexperiente a sensação de assistir um filme de ficção científica, mas na verdade assistimos o trágico desenvolvimento de uma enorme crise que afetou e levou ao total esgotamento um regime de colaboração de classes, liderado pelo PT durante mais de uma década e ao desenvolvimento de um golpe, golpe que foi parido das vísceras ou das entranhas do mesmo governo, no qual um setor da burguesia que compunha uma frente com o PT se utilizou do Congresso para derrubar o antigo governo, mantendo no poder os setores da burguesia que sustentaram e apoiaram toda essa manobra.
Há em nosso país, e em todo continente, uma polarização social e política, que deformadamente coloca em setores opostos, alas e partidos políticos que tem o mesmo propósito: sustentar o regime político ou manter o sistema capitalista intacto. Apesar de terem diferenças políticas e econômicas notórias, as chamadas "direita" e "esquerda" de nosso continente cumprem um papel de serem dois polos da política burguesa. A luta de classes coloca em campos opostos os interesses da burguesia e dos trabalhadores assalariados. Mas essa luta é representada de uma forma confusa e deformada, em que partidos como o PT procuram a todo custo impedir a tomada de consciência, a organização e a luta dos trabalhadores. A tomada de consciência política é para os trabalhadores um trabalho árduo, pois um setor da esquerda cumpre o papel de confundir e desorientar as massas, enquanto, ao mesmo tempo, costura acordos tácitos com a burguesia, que em última análise, sempre prejudiciais aos trabalhadores enquanto classe. A chamada esquerda classista, que representa os interesses dos trabalhadores, de um modo geral, e que não capitula aos interesses da burguesia, representa um setor que luta ainda por ganhar visibilidade, organização e ganhar a consciência política das massas. Vivemos atualmente no Brasil, e em todo continente, uma intensa disputa política e social, refletindo a crise econômica e a luta pela sobrevivência. Para entendermos os reais interesses em pugna, temos que separar a essência de sua mera aparência.
Temos claro que a política de colaboração de classes, dentro da esquerda, não é um fato novo, muito menos latino-americano, mas também podemos dizer que nos últimos 30 anos, a intensidade dessa política ganhou contornos que não existiam anteriormente. Um sinal claro e inequívoco da fragilidade e dificuldade com que a burguesia nativa tem para manter as relações sociais e o sistema capitalista intacto no continente sul-americano.
A recente crise aberta pelas denúncias da JBS mostraram os dois pesos e duas medidas que a imprensa burguesa, o regime político e, principalmente, do Congresso e do Judiciário tiveram anteriormente com o PT e agora com Temer, uma lição de teoria política comparada sobre como se posicionaram com um governo que colaborava com a burguesia (o do PT) para um governo genuinamente burguês (o governo Temer). O esgotamento da via de colaboração de um setor da esquerda com a burguesia também é um fenômeno continental, que no Brasil se expressa de forma contundente, mas que em menor ou maior grau ocorre em outros países do continente. Não pairam mais dúvidas sobre a natureza de classe do golpe. O impeachment de Dilma e o arquivamento da denúncia de Temer ficarão como fatos históricos contundentes. E aqui pudemos ver a História se repetir duas vezes, como tragédia e como farsa, para os que ainda insistem em negar o legado teórico do marxismo.
É importante frisar que parte significativa da burguesia apoiou anteriormente os governos do PT, e, com o desenvolvimento da crise foi abandonando paulatinamente o governo de colaboração para buscar a formação de um governo próprio; como não conseguiram esse feito de forma eleitoral, cerraram fileiras em torno do golpe parlamentar que culminou com o impeachment. Por isso, grande parte dos ministros e personagens que apoiavam o governo anterior, aparecem agora no governo do golpista Temer. Lógico que aliados agora dos setores que ficaram na oposição burguesa, o PSDB, o DEM e seus satélites partidários.
Coube à fração dominante da burguesia nacional, apoiada por setores significativos do imperialismo, concluir um golpe parlamentar para dar uma guinada na condução do governo e do Estado (Temer era o vice de um governo de colaboração de classes, figura central no acordo que o PT e o PMDB tinham para a condução do governo mediante um condomínio com outros partidos burgueses menores), o imediatismo do golpe e sua política de rapina contra toda a população, mais especialmente contra a classe trabalhadora ( a classe operária, os assalariados) é fruto, e ponto culminante, de toda uma política de derrotas e desmoralizações que a frente popular (conduzida pelo PT) impôs aos trabalhadores como um todo, de todas as formas a política estratégica do PT (seguida pela CUT, pela burocracia sindical e pelos movimentos sociais) sempre levou à fuga do enfrentamento (como nos casos recentes do golpe parlamentar, da luta pelo Fora Temer, e na greve geral, que mesmo tendo um amplo apoio massivo foi deixada de lado, foi abortada como método de mobilização, foi esvaziada, até se transformar num mero dia de luta, com menos significado político), os trabalhadores foram assim colocados em uma camisa de força, enquanto os dirigentes do PT ficavam livres para costurar uma vasta gama de acordos políticos com o grande capital. Grande parte das investigações do MPF (Lava-Jato) vem descortinando esses acordos, só que enquanto os políticos ligados à burguesia são frequentemente poupados, os ligados ao PT são os "bodes expiatórios", como se a prática de parasitar no Estado em prol de grandes empresas não fosse uma prática ou "modus operandi" de todo regime político, dos partidos burgueses e do grande capital há muitas décadas. O PT não inventou a roda, adaptou-se ao regime burguês, e com isso caiu na vala da política corrupta que os demais partidos burgueses já praticavam anteriormente.
Se enfrentamos um ataque sem igual por parte da burguesia, isso só foi possível com a complacência do PT, que deu moral, combatividade e unidade aos partidos burgueses e à própria burguesia enquanto classe social. Sem a aliança com a burguesia, o recente "empoderamento" da direita reacionária não teria sido possível. A atitude do PT diante das recentes Reformas de Temer (uma simples oposição parlamentar formal) mostra que continuará fechando os olhos para a dura realidade das massas. Todo o peso do aparato partidário do PT (e uma parte significativa do restante da esquerda) foi contida no último período. Nem "Fora Temer", nem Greve Geral contra as Reformas e nem mesmo uma protesto massivo no dia em que a Câmara votou a denúncia da PGR contra Michel Temer. O "acordo" tácito que a esquerda (particularmente o PT, que controla grande parte dos sindicatos e organizações sociais) costurou com o governo e com a direita, impedindo a mobilização independente das massas já anuncia as futuras derrotas que irão impor nas costas dos trabalhadores em todo próximo período.
O governo Temer foi engendrado de dentro de um governo de colaboração de classes, parte considerável de seus ministros foram ministros dos governos Lula e Dilma, apoiado e protagonizado pelos setores fundamentais do grande capital, visando superar a queda dos lucros dos grandes empresários com as chamadas Reformas. Esse é seu verdadeiro programa de classe, sua plataforma burguesa, essencialmente, são a Reforma Trabalhista e Previdenciária, apoiadas por um Congresso formado por empresários, latifundiários e com grande influência dos setores reacionários e religiosos. As chamadas reformas são uma agenda (ou programa) de sustentação do governo Temer junto aos partidos patronais e dos grandes empresários nacionais e internacionais, assim como do chamado "mercado" (ou o capital especulativo da Bolsa de Valores).
A burguesia sentiu-se fragilizada diante da intensidade da crise. O imediatismo, a virulência e a ousadia do golpe só demonstra o caráter falimentar e de alto endividamento do capital nacional, por isso o programa do governo Temer é "sanear" os negócios da burguesia e jogar todo o ônus para os trabalhadores e assalariados do país. O programa das reformas é o programa com que o grande capital tenta se reestruturar no país, obter grandes lucros, deixando o ônus da crise aos trabalhadores.
As Reformas visam alterar profundamente o mercado de trabalho, aprofundando o submetimento do trabalhador assalariado ao capital, e ao mesmo tempo deixar o orçamento do Estado com um maior "superávit" para pagar os juros da dívida interna ao atacar diretamente a previdência pública. Ainda afetará diretamente no funcionamento dos sindicatos (que perderão a prerrogativa dos acordos coletivos, substituídos por acordos individuais), aumentará a precarização, diminuirá salários e aumentará diretamente os lucros dos bancos com a venda da previdência privada aos que antes pretendiam se aposentar pelo sistema público. Isso terá um impacto profundo nos trabalhadores e até mesmo nas classes médias. São inúmeras medidas aprovadas de uma só vez, com certeza é o maior ataque aos direitos dos trabalhadores desferido por um só governo desde o advento da República. A esquerda e os sindicatos burocratizados ladraram, rosnaram, mas ficaram de cabeça baixa ao final. Só esse fato já deixa claro a capitulação à política golpista da burguesia e do governo, o PT é o principal responsável por esse fato, primeiro por ser o principal partido da esquerda, o que tem maior poder de mobilização, aparato, apoio popular e por dirigir grande parte dos sindicatos através da CUT.
Temos que deixar claro, tanto para a esquerda e quanto aos trabalhadores, que os ataques realizados pelas Reformas de Temer são, sem sombra de dúvida, o maior ataque que um governo burguês já realizou contra a classe trabalhadora no Brasil. A Reforma Trabalhista deixa os trabalhadores a mercê de todo tipo de exploração, chegando aos limites do trabalho escravo. A esquerda e os sindicatos pouco lutaram contra essa situação, dado o peso e o aparelho que as centrais sindicais tem. No dia seguinte à Reforma Trabalhista, a condenação de Lula pelo juiz Moro foi utilizada por todos os setores da burguesia como um meio de distrair a opinião pública, de um lado, e para desmoralizar ainda mais os trabalhadores, de outro lado, já que grande parte do eleitorado de Lula são assalariados e todos sabem que ele foi um dirigente sindical no passado. O valor simbólico desse fato não foi simples coincidência. A utilização consciente desse expediente foi um conluio orquestrado pelos setores mais reacionários com o aval de parte da esquerda que preferiu lutar contra a prisão de Lula a se manifestar, clara e contundentemente, contra a Reforma Trabalhista.
O Ministro da Fazenda Henrique Meirelles (ex BankBoston, ex Presidente do BC durante o governo Lula, e ex Presidente da JBS/J&S) cumpre o papel de ser o fiador do governo atual e por incrível que pareça do próximo, pois é patente que caindo ou não o governo Temer, a equipe econômica continuará a mesma. Meirelles foi o homem "forte" da JBS/J&S, mas não há uma investigação sobre como podia ser presidente do grupo e não saber da vasta corrupção da empresa. Sua empresa de consultoria lucrou quase 200 milhões de reais antes de assumir o ministério, e não há investigações sobre "quais" interesses sua consultoria agenciava. Com certeza, o grande capital está bem representado e totalmente blindado.
O que coloca a queda de Temer muito mais no mérito das disputas internas burguesas do que de uma mudança de "rumo" desse ou do futuro governo. O certo é que caindo Temer ou não, a base de sustentação do governo seguirá essencialmente a mesma. As eleições indiretas são a garantia da continuidade do regime político.
A análise das denúncias da JBS, através do Procurador Geral, Rodrigo Janot, deve ser compreendida como uma discussão sobre a fisionomia ou a "cara" do governo, mas não sobre seu programa, seu caráter de classe ou sobre os setores que lhe dão apoio. Não estamos diante da possibilidade de queda de um governo, já que a equipe econômica, que é o coração e o cérebro do governo continuará intacta, como já foi anunciado pelo próprio Meirelles. Estamos diante da discussão sobre a deposição do presidente apenas, ou seja, seu rosto, sua fisionomia pública diante das massas. Lógico que isso afetará em alguma medida os partidos que compõem a base de apoio, mas a grosso modo não haverá grandes mudanças.
A saída ou não do PSDB (ou outros partidos) do governo Temer é apenas um recurso político de manutenção do capital político desses partidos (diante de um governo totalmente desgastado perante à população). Discutem a saída do governo, mas não sobre sair da base de apoio (ou seja da base de sustentação do governo). Discutem quais partidos farão parte do governo, mas a base de sustentação no Congresso continuará quase que inalterada. Tudo pode mudar repentinamente, mas dificilmente os setores que sustentam esse governo mudarão bruscamente a coalizão de partidos que torna possível o "controle" do Congresso e a partir dai do governo. Apesar das divergências em torno da sucessão do governo Temer, os setores principais da burguesia estão unificados, sustentando a política atual mesmo diante de possíveis reveses.
Nos bastidores da crise, que toma a forma de uma crise judicializada, ou até mesmo criminalizada (já que os crimes políticos transformaram-se no ponto de disputa), disseminou-se por todo o regime político. Há, entretanto, um claro acordo entre o PMDB de Temer, o PSDB de FHC e Aécio Neves e o PT de Lula. Esses setores consertam um acordo tácito, um Acordão, de não agressão (no último período), em que pode-se ver o STF amenizando, adiando, arquivando e até mesmo fechando os olhos para crimes notórios (já que a justiça é cega, fechar os olhos é apenas um pleonasmo), como os casos de Aécio e Rocha Loures. O acordo visa a manutenção clara do governo, uma tentativa de "estabilizar" a crise política e adiar as disputas políticas para o calendário eleitoral. Parte desse acordo será finalizado pela Reforma Política que virá em seguida às demais Reformas (para manter a estabilidade política do regime) e o comprometimento dos atores políticos principais para não anular as Reformas do governo Temer. Lula faz críticas às Reformas, mas não move um dedo no sentido de anula-las quando se coloca sobre esse tema.
O PSDB e o PT amenizam o confronto direto jogando a disputa para as eleições de 2018. Parte importante desse acordo é a manutenção (por parte do PT que ainda controla grande parte das organizações sindicais e populares) das massas em um grande imobilismo. Podemos ver que tanto a greve geral de junho, como outros tipos de mobilizações, assim como no dia da votação da denúncia por corrupção contra Temer no Congresso. As mobilizações são desviadas ou abortadas, especialidade da burocracia sindical em 20 anos de frente popular (uma frente de colaboração de classes, essencial para imobilizar os trabalhadores diante dos ataques da burguesia). A mobilização independente das massas é sempre sacrificada, o PT e a CUT preparam desse modo futuras derrotas, já que o golpe parlamentar é uma derrota que ficou no passado. As mobilizações de Fora Temer que num primeiro momento ganharam as massas e tiveram ressonância na sociedade, são agora desarticuladas, tudo para manter a disputa longe das ruas, mais exatamente em Brasília, entre o Congresso e o STF, onde os trabalhadores tenham apenas um papel decorativo, mas impedindo, de todas as formas, sua intervenção independente.
Nem mesmo a aprovação da Reforma Trabalhista, um ataque sem precedentes à classe trabalhadora (e até mesmo aos sindicatos) teve uma resposta à altura, o medo de uma mobilização contundente das massas é maior do que as derrotas que possam afetar a esquerda ou a burocracia sindical. Temos que colocar as atuais derrotas, que os trabalhadores e a maioria da população vem sofrendo, na conta das direções (especialmente o PT), que imobilizam as massas diante de um dos mais ferozes ataques da burguesia e do grande capital contra seus direitos essenciais.
O ponto nevrálgico do acordão entre PT, PSDB e PMDB é a manutenção do governo atual e a continuidade das Reformas antioperárias e antipopulares. O PT sustenta a estabilidade do regime em troca do "desgaste" político do governo diante das massas. As derrotas de hoje são trocadas pela incerteza do futuro. A futura Reforma Política dará ao regime a possibilidade de se perpetuar. Até mesmo a possibilidade de um regime semi-parlamentarista ou parlamentarista estará na pauta. E os pequenos partidos de esquerda enfrentarão uma férrea cláusula de barreira para continuar existindo. Fora o voto distrital e outras "criações" parlamentares que mudarão totalmente as chamadas "regras do jogo" da atual política burguesa.
Dentro desse quadro é que vem à tona o debate que uma parcela da esquerda começa a esboçar sobre uma Frente de Esquerda, como alternativa de poder.
Essa nova Frente, ainda sem uma fisionomia programática clara, ora começa a ser debatida como um polo de aglutinação dos setores da esquerda combativa que se opõe à política de colaboração de classes do PT (nem sempre de forma consequente) e que se colocam contrários ao golpe (nem todos!), ao governo golpista de Michel Temer (ou de seu possível sucessor), ora se coloca como uma mais uma camisa de força para conter as massas, em vez de organizar, unificar e dar um programa que responda aos interesses dos trabalhadores assalariados e setores explorados, acaba sendo um meio de perpetuar a política de colaboração de classes que o PT vem desenvolvendo nos últimos trinta anos, só que com uma nova roupagem. Sob o nome de Frente de Esquerda pode-se formar uma frente única classista, uma frente de colaboração de classes ou até mesmo uma frente centrista que cumpra um papel intermediário entre as duas primeiras.
Diante da esquerda se abrem, no momento, três vertentes básicas de frente: uma das vertentes que ganha força, e que não pode ser desprezada, pois já começa a se articular e até mesmo realizar reuniões para debater suas perspectivas, é a de um acordo oportunista do PT com a esquerda que ficou fora de seu governo (PSOL, esquerda do PT, FBSM, etc). Essa possibilidade de configuração toma como ponto de partida que a frente de colaboração de classes que o PT conduzia esgotou-se completamente, não foi o PT que superou a frente e a burguesia, mas a frente que lhe deu um golpe, com Temer à frente, e colocou o PT como o "bode expiatório" da burguesia e de setores de direita da classe média. O PT perdeu o "apoio" desses setores que ficaram com Temer e o governo. Alguns setores da "esquerda" tentam aproveitar-se dessa situação (a de que a burguesia deu as costas ao PT) configurando uma nova frente, uma frente que tenha uma fisionomia mais à "esquerda", o principal "modelo" desse tipo de frente seria a "Geringonça" portuguesa. Um governo de centro esquerda que se mantém dentro dos marcos da União Europeia. Seria uma nova frente de colaboração de classes, só que adaptada aos tempos atuais, no qual a burguesia ficou com a imagem de "golpista" diante dos trabalhadores e ao mesmo tempo rompeu com o PT e tomou outro caminho, o caminho de sustentação do governo golpista de Michel Temer.
Ou seja, programaticamente seria uma frente de colaboração de classes mas sem os principais partidos da burguesia. Com isso o PSOL e os setores da esquerda que estão no último período negociando sua entrada nesse partido, seriam fiadores da política do PT e de Lula. De outro lado dariam um roupagem de "esquerda" que o PT necessita para reconquistar a militância e as massas.
Em resumo: diante da impossibilidade de setores significativos da burguesia de compor uma frente com o PT, o PT buscaria, como plano B, pois Lula até agora critica essa via, uma frente com a "sombra de esquerda" da pequena burguesia e da própria burguesia. Algo próximo da Frente Brasil Popular de 1989. Não seria o PT que se deslocaria à esquerda, mas o PSOL e outros setores que se deslocariam à direita. Os limites desse tipo de frente estarão estampados em seu programa: o respeito à propriedade privada capitalista, ao mercado e ao grande capital. Essencialmente nada mudaria, já que se colocariam, desde o princípio, como reféns da Congresso reacionário. Algumas reuniões já foram realizadas por membros da "esquerda" do PT, setores do PSOL e movimentos sociais.
Lógico que ainda estamos diante da possibilidade de que Lula seja condenado em segunda instância e seja preso ou tenha a candidatura cassada. Isso deixaria Lula mais forte, mas inelegível, se tornaria assim um plano B para o regime político, para ser usado apenas num caso de extrema necessidade. A hipótese da prisão ou condenação de Lula transforma-lo num herói é um "perigo" para o regime político, diante disso a Reforma política deve aprovar o voto distrital e um regime parlamentar para impedir qualquer mudança brusca após as Reformas reacionárias em curso.
Um segundo caminho que temos exemplo direto no Podemos da Espanha e no Syriza da Grécia, e que longe de abrir uma perspectiva de luta para os trabalhadores, limita-se a uma esquerda parlamentar, onde longe de combater o capitalismo o que se faz é apenas dar algumas esmolas aos que estão mais desfavorecidos, uma esquerda que está distante das lutas diárias, dos sindicatos, dos movimentos sociais, que busca muito mais fazer reformas que não afetem a estrutura do prédio (ou seja o capitalismo), que não tem como papel varrer a burocracia dos sindicatos ou de romper claramente com o grande capital (nacional e internacional) e seus representantes. Querem apenas ser uma alternativa de esquerda (pequeno burguesa) para se chegar ao governo e assim conseguir algumas reformas. Seria uma proposta centrista, com o PSOL na cabeça e com o apoio de outros partidos e organizações, sem a participação do PT, um programa que respeite a propriedade privada, o capitalismo, e que faça algumas pequenas "reformas" no regime atual.
A discussão que se coloca no atual momento é: qual frente de esquerda queremos, qual frente necessitamos? Qual o caráter dessa frente? É uma frente eleitoral? Ou é uma frente que também intervirá na luta de classes (greves, movimento operário, sindicatos, movimentos populares, etc). Seria uma frente para fazer uma mera "oposição" ao regime ou para organizar as massas para lutar e colocar abaixo o atual regime político?
Não podemos deixar de colocar o exemplo da esquerda na Argentina, como um outro caminho, um caminho classista e revolucionário para a classe trabalhadora, um caminho oposto à colaboração de classes. A FIT (Frente de Esquerda e dos Trabalhadores), é um exemplo a ser seguido e estudado, formado em nosso continente, em um país vizinho, que se apresenta como uma frente única (com suas naturais diferenças internas entre cada partido), abarca todos os setores da esquerda classista e os setores militantes dos trabalhadores e da juventude. A FIT (formada pelo PO, pelo PTS e pela IS) é uma frente como expressão de uma luta consciente dos trabalhadores e de um programa que expresse essa luta. É uma frente que intervem nas eleições, mas também na luta diária dos trabalhadores, desde um 1º de Maio, até as mobilizações cotidianas dos operários, professores, movimento de mulheres, estudantes, GLBT, etc, etc. Nas greves, nas mobilizações e no cotidiano das massas está presente com um programa que defende os interesses dos trabalhadores. Utiliza as eleições para politizar e organizar as massas. É uma frente com caráter classista e que procura organizar os trabalhadores e a maioria dos setores explorados para a conquista do poder como seus verdadeiros protagonistas e não como meros coadjuvantes.
Há três caminhos que a nossa esquerda confunde como sendo sinônimos e não são, muito pelo contrário: primeiro, a frente do PT com a esquerda (PSOL, etc) no qual o PSOL se deslocaria à direita para se coligar com o PT junto a outros partidos e movimentos sociais; outro caminho é o do PSOL indo à esquerda (várias organizações devem entrar em seu seio no próximo período) e formando uma frente no estilo do Podemos espanhol ou do Syriza da Grécia (pois o PSOL está à direita desses partidos), uma frente de caráter centrista, e por fim o da esquerda formar uma frente única com um programa classista, debatido em meio às suas organizações, com forte presença na luta de classes, como faz a FIT na Argentina. Que se procure dar um programa à esquerda e aos trabalhadores para se lutar contra o capitalismo, de forma consciente, através de uma frente única. Uma frente que organize e arme os trabalhadores. São três caminhos bem distintos e que os militantes tendem a colocar e confundir com o mesmo nome. Por isso quando se debater uma frente de esquerda, em primeiro lugar deveríamos perguntar: Qual frente? Quais partidos? Qual programa? Quais objetivos queremos atingir?
Para uma frente de esquerda não ser uma palavra de ordem oportunista, uma bravata parlamentar, que tem somente o objetivo de prender as massas e os trabalhadores em uma camisa de força, aprisionando diariamente seus anseios de luta, que apenas quer polarizar para obter lucros eleitorais, deve se colocar, em primeiro lugar, como uma frente combativa, que tenha um foro democrático para debater as diferentes concepções e que tenha um programa que seja expressão desse debate. Não pode ser uma frente que almeje apenas reformas, mas tem que organizar as massas e atacar diretamente o regime capitalista e sua crise histórica. Tem que expressar em seu programa uma concepção socialista de mundo.
Uma frente de esquerda dessa natureza seria classista ao se colocar como um polo de atração dos setores organizados e chamar um Congresso dos Trabalhadores, organizada por toda essa esquerda combativa que se coloca em oposição ao regime político, ao grande capital, e às tendências de colaboração de classe, que tentam aprisionar a todo custo os trabalhadores para impedir que formem uma consciência política própria e se organizem como classe social.
Um Congresso dos Trabalhadores seria necessário no atual período para dar uma fisionomia classista à essa esquerda, um programa diante da crise aberta na atualidade, e para demonstrar que essa frente intervém no dia-a-dia das massas, não só na luta parlamentar, desse modo combateria pela evolução da consciência das massas. A delimitação política sempre é necessária na esquerda, e nesse momento é urgente. Uma crise dessa envergadura só pode ser superada pela delimitação programática com a burguesia e com os setores que defendem a conciliação e a colaboração de classes. Mas somente um Congresso dos Trabalhadores pode dar unidade a esse debate programático e colocar a organização da classe trabalhadora como ferramenta de luta para o próximo período.
Diante da gigantesca crise que passamos na atualidade, nós necessitamos que haja uma intervenção da classe social mais numerosa, a única que produz a riqueza: os trabalhadores. A fusão de uma esquerda classista com um movimento organizado dos trabalhadores pode ser logrado a partir da organização de um grande Congresso que catalise os setores organizados dos trabalhadores, da juventude, das mulheres, e dos setores explorados, sem esquecer os desempregados, que necessitam de uma perspectiva política. Tal fusão seria expressa na discussão e aprovação de um programa comum, um programa de luta, combativo e socialista que abra uma perspectiva política para os trabalhadores e para essa frente de esquerda que ainda procura uma fisionomia.
Os trabalhadores sofreram, no último período, inúmeras derrotas, em grande parte essas derrotas foram engendradas pela condução e pela direção que o PT mantém nos movimentos sociais, para romper com essa política temos que ter uma nova organização dos trabalhadores, das mulheres e da juventude, é necessário uma frente de esquerda que seja combativa, classista e socialista. Só poderemos reverter essas derrotas com organização e luta e para isso é necessário construir uma nova direção para os trabalhadores e para a esquerda. A tarefa é árdua, mas há momentos em que os caminhos fáceis só nos conduzem ao fracasso e que é necessário um grande esforço coletivo para superarmos um grande obstáculo. Ao clarificar o debate e coloca-lo sobre novas bases damos nossa contribuição política a luta que se desenvolve em nosso país.
Uma frente de esquerda que seja expressão dessa luta deve encarar essa proposta como um desafio. Somente o protagonismo dos trabalhadores pode mudar o enredo da crise histórica que estamos vivenciando. Mais do que nunca é hora de unirmos força por um Congresso Nacional da Classe Trabalhadora, é esse o caminho para a esquerda combativa no atual momento e é esse o caminho para se construir uma verdadeira frente de esquerda, que mereça esse nome, não uma frente meramente eleitoral, mas uma frente de luta, formada pelos militantes de todos os setores e categorias, essa é a luta, e esse é o desafio.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

A LUTA PELA IV INTERNACIONAL EM MARCHA

                                                                                                       Por Jorge Altamira

Convocação para uma conferência internacional em Buenos Aires


A comemoração do centenário da Revolução de Outubro, que aconteceu nos mais diversos palcos através do mundo, tem servido, além disso, como uma oportunidade para delimitar posições a respeito do período histórico que atravessa a humanidade na atualidade, e portanto sobre a luta de classes e as lutas políticas.

A Revolução de Outubro constituiu o ponto de partida de uma nova estratégia política do socialismo, focada até então em uma perspectiva de reformas sociais, porque testou em uma escala geográfica sem precedentes que a luta de classes moderna conduz ao governo dos trabalhadores – o qual significa a possibilidade de que o proletariado desenvolva, por meio de sua dominação de classe, o salto ou a transição para uma sociedade socialista internacional. Esta estratégia política, definidamente revolucionária, no entanto foi preponderante em um período histórico muito efêmero  em suas definições fundamentais. O retrocesso da Revolução e da classe operária, como consequência de um bloqueio econômico, invasões militares e isolamento relativo, abriu caminho à tese do “socialismo” restringido a “um só país”. Recorreu à política de colaboração de classes, conhecida, por um lado, como “frente popular” e, por outro lado, como “coexistência pacífica” com o capital e seus estados – precisamente as duas questões que o bolchevismo derrotou politicamente para impor a vitória de Outubro.

Antes que o assessor dos Estados Unidos, Francis Fukuyama, cunhasse a tese de que o domínio do capital e do mercado capitalista constituía “o fim da história” e até sua própria finalidade ou objetivo, nas filas do stalinismo e da esquerda, essa perspectiva já tinha atingido um desenvolvimento "teórico", sem podermos chamá-lo assim, significativo. A bancarrota capitalista em escala desconhecida, as guerras imperialistas e as crises políticas, bem como as rebeliões que sacodem ao mundo, se não têm posto “fim” a estas manipulações ideológicas, por certo que as têm refutado por completo. O “estado de bem-estar” jaz já no panteão das relíquias e até os estudiosos da mudança climática advertem que o capitalismo prepara uma crise existencial ao ser humano. A caracterização de que “a crise da humanidade se reduz à crise de direção do proletariado”, definida assim pela IV Internacional, é mais que nunca a questão estratégica fundamental.

Leningrado

Em Istambul, a convulsionada capital da convulsionada Turquia, foi palco, a princípios de dezembro, de uma de suas comemorações, por iniciativa do DIP – o Partido Operário Revolucionário. O encontro foi aproveitado também para reunir às principais organizações da CRQI, que luta para refundar a IV Internacional, com o objetivo de lançar uma série de iniciativas.

No início da Jornada em Istambul, várias das organizações presentes que tinham participado de seminários realizados em Leningrado (rebatizada São Petersburgo pela burocracia restauracionista), o centro político da Revolução de Outubro, transmitiram manifestações de mudanças, em especial entre a juventude russa, como a revalorização da experiência revolucionária de Outubro. Este princípio de giro político é um resultado, claro, do retrocesso histórico que sofreu o ex-espaço soviético como consequência da restauração das máfias capitalistas. À pobreza enorme, à perda de conquistas, soma-se a evidência de que o regime existente caminha por uma margem tênue de uma nova catástrofe econômica e política. A camarilha de Putin tenta estrangular esta perspectiva mediante o reforço do bonapartismo dos ‘serviços’ do Estado. No entanto, enquanto o velho partido comunista stalinista converteu-se em um capacho de Putin, ao mesmo tempo estão se produzindo rupturas de esquerda de certa amplitude, incluindo uma defesa da fundação e vigência da III Internacional fundada por Lenin e Trótsky, em 1919. Com estes informes iniciou-se a Jornada.

Taksin

O seminário organizado pelo DIP durou toda a jornada e esteve bem organizado. Teve lugar em um teatro estilo século XIX, que dá à rua que conduz à histórica praça Taksin. A Revolução de Outubro não foi relegada ao passado histórico, mas situada em sua atualidade. Ficou de manifesto que o impasse da sociedade capitalista se distingue, no presente, por sua escala, por sua profundidade, e por sua tendência, inclusive, a converter aos principais países imperialistas, em especial na Europa, no famoso “elo débil” da crise econômica e política mundial. No que diz respeito à minha intervenção no painel inicial, dei ênfase em assinalar que a vitória da Revolução de Outubro foi o resultado da vitória da luta política por superar a crise de direção que afetou ao proletariado revolucionário russo naquela luta histórica – tanto contra os partidos de colaboração de classes, como no interior do partido bolchevique. A crise de direção segue sendo o problema estratégico por excelência e está relacionado com o entendimento da decadência histórica irreversível e a tendência à desintegração do capitalismo.

A jornada destacou-se pela originalidade das intervenções de militantes muito jovens de diversos países, ou seja que expuseram suas realidades históricas, suas particularidades no contexto da crise mundial. Foi uma aula instrutiva escutar as experiências de jovens azerbaidjanos, e de militantes ucranianos e de vários países dos Balcãs. O “choque de civilizações” com que o imperialismo procura justificar sua cruzada de colonização criminosa, foi refutado pelo relato das grandes revoluções na Ásia Central muçulmana e nas gigantescas rebeliões que seguiram à primeira guerra mundial. O véu do islamismo não foi obstáculo para que milhões de muçulmanos se incorporassem à torrente revolucionária impulsionada por Outubro. A própria Turquia deve seu movimento republicano à influência da Revolução de Outubro. O imperialismo contrapôs ao Chamado aos Povos Muçulmanos (1), por parte do bolchevismo, a Declaração Balfour (2), ditada pelo imperialismo britânico, para combater essa convocação a mando do sionismo. A crise do imperialismo tem convertido, na atualidade, a toda a área coberta há cem anos pelo império Otomano, em um barril de pólvora social e político. A Jornada foi uma descrição da crise mundial na Ásia Central e no Oriente Médio, e da resistência, o combate e a revolução que mora em suas massas exploradas.

IV Internacional

Depois desta introdução a respeito da atualidade da revolução mundial, aconteceu, nos dias seguintes, a reunião das organizações presentes da CRQI, no Seminário. O ponto fundamental foi a necessidade de um balanço do programa, do método e da atividade da CRQI, para atualizar as conclusões, as táticas, os métodos de organização e as iniciativas internacionais. A CRQI é a única tendência política que reivindica a IV Internacional, que tem um programa, em contraste com as declarações conjunturais e impressionistas que caracteriza o resto. É o que nos propomos reexaminar ao cabo de duas décadas de desenvolvimento da crise mundial que esse programa soube antecipar. Para isso foi decidido convocar uma conferência preparatória internacional,  no próximo abril , com vistas a um Congresso no setembro seguinte. Para desenvolver esta tarefa e as ações políticas que impõe a luta de classes internacional, foi combinado em estabelecer uma rede digital comum, editar uma revista bilingue trimestral, grupos de trabalhos comuns em torno de cada continente e um comitê político permanente. A pré-conferência internacional terá um caráter aberto, à que assistirão numerosas organizações convidadas  da região do Euro-Mediterrâneo e da América Latina.

Anteriormente a esta reunião, organizou-se uma sessão de discussão com militantes turcos e de outros países participantes do Seminário, em relação ao Partido Obrero e à Frente de Esquerda, na Argentina, cuja experiência é seguida com interesse e criticamente. O debate girou, em definitivo, sobre o que essa experiência ensina a respeito do método para superar a crise de direção e construir partidos revolucionários com forte penetração nas massas. Em oposição a um esquematismo fortemente arraigado, sublinhamos a importância que tem a transformação da consciência do próprio proletariado, porque a vanguarda revolucionária não pode se desenvolver à margem dela, nem pode fazê-la sem jogar um papel central nessa transformação. Criticamos a ideia de que a esquerda revolucionária possa ser a beneficiária automática da crise do estado e dos partidos patronais, pois, no melhor dos casos, isso concluiria em uma construção democratizante, não revolucionária. Sublinhamos a necessidade de caracterizar muito bem a oportunidade política dos frentismos de esquerda e sua relação com o ativismo operário e a vanguarda; a necessidade, nestas experiências, de lutar para estender a unidade de ação no campo dos sindicatos, da mulher e da juventude; e por sobretudo, a obrigação, não já a necessidade, de um reforço da elaboração teórica e da delimitação política, precisamente para construir o partido que fez possível a vitória de Outubro.




(1) Na circular dos Comissários do Povo "A Todos os Muçulmanos Trabalhadores de Rússia e do Leste", emitida poucos dias após a tomada do poder, o governo soviético declarou a rejeição das políticas imperialistas seguidas pelos governos czaristas e provisórios e expressou o desejo de construir relações com os povos coloniais sobre a base da igualdade e o respeito mútuo. Este documento teve grande impacto na população muçulmana do território do antigo Império russo e nos países islâmicos.
(2) Carta enviada pelo Secretário de Estado de Relações exteriores britânico, Arthur James Balfour, a Lord Rothschild, destinada a conseguir o apoio da comunidade judia ao esforço bélico na Primeira Guerra Mundial. Conhecida como a “Declaração de Balfour”, se converteu em uma das bases legais para criar um estado judeu na Palestina. A carta foi publicada no “Times” de Londres uma semana mais tarde. O texto é o seguinte:
Foreign Office
2 de novembro de 1917
Estimado Lord Rothschild:
Tenho sumo prazer em comunicar-lhe em nome do Governo de Sua Majestade, a seguinte declaração de simpatia com as aspirações judaicos sionistas, declaração que tem sido submetida à consideração do gabinete e aprovada pelo mesmo:
«O Governo de Sua Majestade contempla com simpatia o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu, e empregará seus melhores esforços para facilitar o cumprimento deste objetivo, ficando claramente entendido que não se fará nada que possa prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades não-judaicas existentes na Palestina, ou os direitos e status político de que gozam os judeus em qualquer outro país.»
Lhe agradecerei que leve esta declaração a conhecimento da Federação Sionista.
Seu
Arthur James Balfour